As perguntas a que o chairman da TAP vai ter de responder na comissão de inquérito
Manuel Beja é ouvido esta terça-feira na comissão de inquérito à TAP, numa altura em que as polémicas em redor da companhia incendeiam o país político.
As polémicas que marcaram as presenças da CEO da TAP, Christine Ourmières-Widener, e de Alexandra Reis na comissão parlamentar de inquérito à companhia aérea, corroendo a imagem do Governo, vão reemergir esta terça-feira na audição do presidente do conselho de administração. Manuel Beja deverá repetir que seguiu indicações da tutela e contestar a demissão por justa causa anunciada pelo Governo.
O chairman assinou em conjunto com a CEO da TAP o acordo de cessação de funções da antiga administradora Alexandra Reis, que a Inspeção-Geral de Finanças (IGF) considerou ilegal, por violar o Estatuto do Gestor Público. A 6 de março o ministro das Finanças anunciou a sua demissão, que aguarda ainda pela conclusão formal do processo.
Será a segunda presença do chairman da TAP no Parlamento, depois de em junho de 2022 ter sido ouvido sobre o andamento do plano de reestruturação da companhia aérea na Comissão de Economia e Obras Públicas, Planeamento e Habitação.
Manuel Beja, que foi gestor da Novabase antes de entrar para a companhia aérea, deverá contestar a demissão por “justa causa” invocada pelas Finanças, argumentando que seguiu a determinação do Ministério das Infraestruturas e a avaliação legal de uma sociedade de advogados de “primeira linha”.
Estes são alguns temos sobre os quais o chairman deverá ser questionado:
A resposta da TAP preparada pelas infraestruturas e os voos de Marcelo
Na audição a Christine Oumières-Widener, na semana passada, Bernardo Blanco, da Iniciativa Liberal, revelou que os esclarecimentos da TAP pedidos pelas Infraestruturas e as Finanças, após a notícia da indemnização de 500 mil euros, foram elaborados em conjunto com o secretário de Estado… das Infraestruturas. Segundo explicou o deputado ao ECO, Manuel Beja fez a ponte entre a TAP e Hugo Mendes, pelo que será questionado acerca deste tema.
A Iniciativa Liberal quer saber também mais pormenores sobre a alteração de voos da companhia aérea em que seguia o Presidente da República, outro dos tópicos que tem suscitado polémica. Na audição à CEO da TAP, Bernardo Blanco afirma que nos e-mails trocados com o secretário de Estado das Infraestruturas é dito que esse expediente já tinha usado, em janeiro, mas o voo terá sido cancelado devido à variante Ómicron. O chairman também estava em cópia nas missivas. Christine Ourmières-Widener respondeu na terça-feira passada que não se recordava de outra situação além da já noticiada, referente a um voo em fevereiro, que acabou por não ser alterado.
Quando soube da intenção de demitir Alexandra Reis e qual o envolvimento no processo?
Na reunião que teve com a Inspeção-Geral de Finanças no âmbito do relatório desta entidade sobre a saída da antiga administradora, Manuel Beja disse que não tinha visibilidade da total amplitude dos desalinhamentos existentes entre a CEO e Alexandra Reis no seio da comissão executiva, porque não participava nas reuniões.
Identificou alguns pontos de diferença de opinião, já explanados por ambas, como a conversão em capital do empréstimo de 1,2 mil milhões de euros, uma peça essencial do plano de reestruturação e que mereceu o voto contra de Alexandra Reis, a mudança de sede ou a contratação de novos diretores, em particular estrangeiros.
Segundo a ata da reunião entre o chairman e a IGF, Manuel Beja declarou que “foi a CEO que, no final de janeiro de 2022, lhe comunicou que estava a ser negociada a saída da engenheira Alexandra Reis da empresa, não tendo o presidente do conselho de administração tido qualquer intervenção no processo”.
Na audição realizada a semana passada, a CEO da companhia aérea afirmou que quer o chairman quer o administrador financeiro (CFO) estiveram a par da intenção de afastar a futura secretária de Estado do Tesouro desde o início do processo. Christine Ourmière-Widener diz que comunicou no início de janeiro a vontade de reorganizar a comissão executiva criando a posição de chief strategy officer, referindo que entendia que Alexandra Reis não tinha o perfil adequado para a ocupar. Isso mesmo foi comunicado ao Ministério das Infraestruturas no dia 4 daquele mês. No dia 18, enviou uma proposta à tutela setorial com a reorganização e dia 19 ao chairman e ao CFO.
O momento em que teve conhecimento da vontade em afastar a CEO e o envolvimento no processo serão, por certo, alvo do escrutínio dos deputados.
Há motivo para justa causa?
À IGF, Manuel Beja disse que quando percebeu que se podia estar a caminhar para uma rutura entre Christine Ourimère-Widener e Alexandra Reis, procurou partilhar a sua visão com os responsáveis pela tutela setorial, nomeadamente o ex-secretário de Estado das Infraestruturas e o ex-ministro das Infraestruturas e Habitação, mas não teve recetividade. Não são conhecidos detalhes sobre esta iniciativa do chairman.
Ainda que o presidente do conselho de administração deva fazer a ponte com as duas tutelas da TAP – o Ministério das Infraestruturas e das Finanças –, o processo foi conduzido pela CEO com o então secretário de Estado das Infraestruturas, Hugo Mendes. Manuel Beja intervém na fase final, assinando com Christine Ourmières-Widener o acordo com Alexandra Reis, que inclui a indemnização de 500 mil euros brutos.
O chairman diz que se limitou a seguir a indicação do Governo. No contraditório, enviado à entidade de auditoria do Ministério das Finanças, sublinha a “essencialidade que para mim sempre revestiu a concordância por parte do acionista (…) em relação aos passos contratuais que estavam a ser dados no sentido de fazer cessar as relações contratuais com a Eng.ª Alexandra Reis”.
Num comunicado divulgado após o anúncio da sua demissão, através da rede social LinkedIn, Manuel Beja já referira que “foi de boa-fé e segundo a instrução da tutela” que cumpriu o seu “dever de lealdade na implementação de uma decisão (a composição do CA) que é legitimamente tomada pelo acionista“.
O comunicado aos investidores com a renúncia de Alexandra Reis
O administrador financeiro, Gonçalo Pires, referiu na sua audição que o texto do comunicado ao mercado a dar conta da “renúncia” de Alexandra Reis, assinado por si, foi-lhe remetido por Manuel Beja. A informação aos investidores acabaria por ser corrigida por exigência da CMVM, para deixar claro que a saída da antiga administradora partiu de uma iniciativa da TAP e foi negociada. O presidente do regulador é ouvido na quinta-feira.
Como funcionava a articulação entre a TAP e o Governo
Manuel Beja também será questionado sobre a articulação entre a administração da TAP e os ministérios que tutelam a companhia. Este é um dos pontos em que o PSD irá procurar mais esclarecimentos, segundo indicou ao ECO o deputado Hugo Carneiro. Christine Ourmières-Widener afirmou, na resposta à Direção-Geral do Tesouro e Finanças sobre o projeto para a sua demissão, que recebeu indicações para o canal de comunicação ser unicamente o Ministério das Infraestruturas (MIH), como noticiou o Observador. “Segundo a prática, a comunicação entre a TAP e os representantes do acionista, na maior parte dos temas, acontecia entre a TAP e o MIH”, disse Manuel Beja à IGF.
Os problemas de governança na TAP e o Estatuto do Gestor Público
Na publicação no LinkedIn mencionada acima, o presidente do conselho de administração da companhia aérea sublinha também que a saída de Alexandra Reis “reflete problemas de governança na empresa”. Nem a intenção da CEO de reorganizar a equipa de gestão nem o processo de saída de Alexandra Reis passaram pelo conselho de administração ou a comissão executiva. Além disso, a autorização de Hugo Mendes ao valor da indemnização foi dada por Whatsapp.
Manuel Beja poderá ser questionado também sobre a inobservância do Estatuto do Gestor Público, seja no processo de saída de Alexandra Reis, seja na ausência de contratos de gestão celebrados com os administradores. Este tem sido um tema recorrente nas audições.
Plano de reestruturação e encerramento da ME Brasil
A presença do presidente do conselho de administração será aproveitada para colocar também questões sobre o plano de reestruturação da transportadora aérea. Um dos pontos que o PSD quer esclarecer é o encerramento da Manutenção e Engenharia Brasil, que obrigou a TAP a reconhecer perdas de mil milhões de euros nos resultados de 2021.
Qual o teor das reuniões com Alexandra Reis, já como Secretária de Estado?
Depois de sair da TAP, Alexandra Reis foi presidente da NAV Portugal e foi convidada por Fernando Medina para Secretária de Estado do Tesouro, tomando posse a 2 de dezembro de 2022. Durante o seu curto mandato teve duas reuniões com Manuel Beja, a 14 e 16 de dezembro, segundo noticiou esta segunda-feira o Jornal de Negócios. Os deputados poderão querer conhecer os temas que foram abordados nestes encontros, um deles com a presença também do CFO, Gonçalo Pires.
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