Tutela da TAP “começou bem mas perdeu o norte ao longo do caminho”, diz Manuel Beja
O presidente do conselho de administração da TAP afirmou na comissão parlamentar de inquérito que a tutela contribuiu para a deterioração da governança na companhia.
O presidente do conselho de administração da TAP afirmou na comissão parlamentar de inquérito que a tutela, em particular as Infraestruturas, contribuíram para a deterioração da governança na companhia. Manuel Beja considera que a sua demissão e da CEO da companhia aérea se deve apenas a razões políticas.
O chairman fez uma intervenção inicial crítica sobre a forma como evoluiu a gestão da TAP e a relação da companhia com o Governo. Manuel Beja afirmou que considera existirem três condições de eficácia para o bom funcionamento da administração: a existência de uma maioria de administradores não executivos; a prestação de informação completa e transparente pela comissão executiva para o conselho de administração; o apoio do acionista e uma boa comunicação com o conselho de administração.
“Estas condições foram iludidas durante o mandato por inação do acionista”, disse Manuel Beja, dando como exemplo a não substituição de dois administradores não executivos que renunciaram ao cargo, levando a que os administradores executivos ficassem em maioria no conselho de administração, ao contrário do que recomendam as boas práticas. Criticou também a forma de comunicação entre a TAP e o Governo.
A tutela da TAP “começou bem mas perdeu o norte ao longo do caminho”, afirmou o chairman. Segundo o presidente do conselho de administração, “o princípio da não interferência [da tutela] foi sendo substituído pelo controlo”, criticou, sobretudo quando se tratavam de temas com impacto mediático. Segundo o presidente do conselho de administração, a disponibilidade da comissão executiva para responder a questões dos administradores não executivos foi também diminuindo.
O presidente do conselho de administração afirmou que foi informado da sua demissão pelo ministro das Infraestruturas, João Galamba, às 10h do dia 6 de março, o mesmo em que foi anunciada publicamente a sua saída. Manuel Beja afirmou que a sua demissão e da CEO são “injustificadas” e acontecem por “conveniência política e partidária”.
O deputado do PS, Bruno Aragão, acusou Manuel Beja e a CEO da TAP de terem tido conhecimento, a 12 de janeiro, de que a companhia estava sujeita às obrigações do Estatuto do Gestor Público (EGP), através de um parecer pedido à Linklaters sobre a necessidade de ser feito um contrato de gestor público. Segundo Bruno Aragão, uma parte do parecer de cerca de 20 páginas menciona justamente a necessidade de cumprir o EGP no que toca às indemnizações. Janeiro é o mês em que decorrem as negociações para o acordo com Alexandra Reis, que seria concluído a 4 de fevereiro.
O chairman da TAP afirmou que quer ele quer o CEO seguiram a opinião dos advogados contratados pela TAP (SRS) e por Alexandra Reis (Morais Leitão). “Não parece razoável que eu e a CEO devêssemos ter opinião contra assessores jurídicos”, defendeu.
Manuel Beja foi questionado por Hugo Carneiro, do PSD, sobre se, conhecendo o parecer, também o ministro Pedro Nuno Santos devia saber que se aplicava o EGP neste caso. “Não consigo assumir que eu próprio ganhei um conhecimento só porque a dadas páginas ele é referido. Não considero que o ministro tivesse que conhecer”, diz.
“Ao fim de dois anos de TAP e de setor empresarial do Estado, percebo que a legislação aplicável é vastíssima. Conhecia o EGP, não sabia as consequências que tinha em caso de demissão com precisão. Se tivesse não tinha assinado acordo. A boa-fé que pus no processo julgo que foi a boa-fé que todos os intervenientes puseram”, acrescentou. Disse mesmo que se soubesse, “teria usado o EGP para garantir que saída de Alexandra Reis não aconteceria”. Antes já tinha deixado elogios à gestora.
O momento mais exaltado da audição aconteceu quando Filipe Melo, do Chega, afirmou que Manuel Beja teve um almoço com um técnico de manutenção que teria sido colocado durante dias numa sala sozinho durante sete horas e meia para o levar a demitir-se. O deputado acusou o chairman de ter conhecimento da situação e nada fazer. Manuel Beja acusou Filipe Melo de estar a mentir, com o deputado do Chega a exigir de seguida que Manuel Beja se retratasse. Isso não aconteceu, mas Filipe Melo quis que ficasse em ata que iria processar judicialmente o ainda presidente do conselho de administração da TAP. Manuel Beja afirmou que o almoço aconteceu, mas que não ouviu o relato descrito por Filipe Melo.
O chairman assinou em conjunto com a CEO da TAP o acordo de cessação de funções da antiga administradora Alexandra Reis, que a Inspeção-Geral de Finanças (IGF) considerou ilegal, por violar o Estatuto do Gestor Público. A 6 de março o ministro das Finanças anunciou a sua demissão, alegando “justa causa” devido ao incumprimento da lei, processo que aguarda ainda a conclusão formal.
O sucessor de Miguel Frasquilho na presidência do conselho de administração da TAP é o quinto a ser ouvido na CPI à gestão da companhia aérea, depois do inspetor-geral de Finanças, do gestor financeiro da transportadora, da CEO e da antiga administradora Alexandra Reis. Manuel Beja foi escolhido pelo antigo ministro das Infraestruturas, Pedro Nuno Santos, e iniciou funções no final de julho de 2021.
A comissão parlamentar de inquérito para “avaliar o exercício da tutela política da gestão da TAP” foi proposta pelo Bloco de Esquerda e aprovada pelo Parlamento no início de fevereiro com as abstenções de PS e PCP e o voto a favor dos restantes partidos. Nasceu da polémica sobre a indemnização de 500 mil euros paga a Alexandra Reis para deixar a administração executiva da TAP em fevereiro de 2022, mas vai recuar até à privatização da companhia em 2015. Tomou posse a 22 de fevereiro, estendendo-se por um período de 90 dias.
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