Exclusivo Donos do Majestic compram prédio para evitar “ameaças” ao café histórico do Porto
Para escapar a investidor que colocaria centenário café do Porto em “situação frágil”, família Barrias adquire imóvel completo em Santa Catarina. Grupo que detém o Guarany abre novo hotel nos Aliados.
Os proprietários do histórico café Majestic, no Porto, acabam de comprar todo o prédio onde este estabelecimento comercial está instalado há mais de um século e que estava até agora nas mãos de “famílias tradicionais da cidade”, adiantou ao ECO o gerente do grupo Barrias, sem revelar o valor do investimento.
Além da “oportunidade única de juntar a propriedade do café e do edifício, que era um sonho do pai”, que morreu em abril, Filipe Barrias justifica a aquisição com a “instabilidade das leis do arrendamento” e a necessidade de “proteger o café” de potenciais compradores [do prédio] que “pudessem ameaçar a existência e a manutenção” do negócio, colocando-o “numa situação frágil”.
“Desde sempre houve bastantes interessados naquele prédio. E acabámos por perceber que um novo senhorio poderia pôr em causa o normal funcionamento e a estabilidade que nós, enquanto homens de negócios, queremos nos estabelecimentos – e eventualmente descaracterizar o conjunto do imóvel, o que não seria, de todo, desejável”, acrescenta o empresário.
Com dois andares acima do piso térreo onde o Majestic abriu portas a 2 de dezembro de 1922, apresentando-se então como “o mais luxuoso café da Península Ibérica”, o imóvel está atualmente devoluto – chegou a ter habitação e a albergar uma associação de combate à toxicodependência – e estende-se desde a Rua de Santa Catarina até à esquina com a Passos Manuel, onde até há pouco tempo estava o banco BPI.
Filipe Barrias descreve que a negociação foi “fácil, no sentido em que as partes, em consentaneidade com a sua boa-fé, conseguiram fazer um negócio desta natureza com respeito mútuo”. Questionado sobre os planos para aquele local, responde que “passa por exercer uma atividade compatível e em convivência harmoniosa com a marca que ali está”. Alojamento? “Provavelmente, sim. Mas algo que não colida com a essência do prédio, com o Majestic ali integrado”, salvaguarda.
A sociedade Grupo Barrias Lda., que já tem registado em seu nome a marca “Hotel Majestic”, tem 1,95 milhões de euros de capital social e é detida por oito sócios, tudo empresas ligadas à família. De acordo com os dados da Informa D&B, consultados pelo ECO, a empresa que explora o Majestic faturou 3,2 milhões de euros em 2022, três vezes mais do que no ano anterior, e tinha 28 funcionários.
Um novo senhorio poderia pôr em causa o normal funcionamento e a estabilidade que nós, enquanto homens de negócios, queremos nos estabelecimentos — e eventualmente descaracterizar o conjunto do imóvel, o que não seria, de todo, desejável.
Foi em 1983, um ano após comprar também o icónico Guarany, na Avenida do Aliados, que Agostinho Barrias salvou da falência o café localizado no número 112 da mais famosa artéria comercial da Invicta, que teve clientes como José Régio, Beatriz Costa, Manoel de Oliveira ou a criadora de Harry Potter. Ex-emigrante no Brasil, era dono de vários cafés na cidade e impediu que o Majestic fosse transformado num banco. Tirando sete meses por causa da pandemia, só fechou portas entre 1992 e 1994 para uma operação de restauro que manteve a arquitetura e a traça original da Belle Époque.
Novo hotel de 16 milhões com preços (e turistas) a baixar
Foi já com estes dois cafés históricos em carteira que o grupo portuense iniciou em 1986 a aposta no setor hoteleiro na Baixa da Invicta. Primeiro com o Pão de Açúcar, na Rua do Almada, que está prestes a completar sete décadas, e no ano seguinte com o Hotel Aliados (antiga Pensão dos Aliados). Em 2007 viria a adquirir o Vera Cruz Porto Hotel e em 2014 comprou o Hotel internacional, o terceiro mais antigo da cidade.
A quinta unidade hoteleira do grupo, atualmente com 150 trabalhadores, tem abertura prevista para outubro, num investimento de 16 milhões de euros que vai criar mais 50 empregos. Em fase final de construção e licenciamento no número 200 da mais famosa artéria da cidade, tomada nos últimos anos por grandes cadeias internacionais do setor, este novo hotel com 97 quartos – vai passar a somar 275 no outono – resulta da reabilitação do edifício da antiga Casa da Saúde dos Aliados, que estava abandonado quando a família Barrias o comprou há quase uma década.
Tal como acontece nos cafés, são os visitantes estrangeiros que mais ocupam as camas disponíveis nos hotéis do grupo – “quem não vive do turismo na cidade do Porto está condenado ao fracasso”, desabafa Filipe Barrias. Atrai sobretudo espanhóis, franceses e ingleses, tendo nos últimos meses os americanos e israelitas em “franca ascensão”. Ainda assim, adverte, tal como está a acontecer em Lisboa e no Algarve, os dados turísticos mais recentes são encarados com preocupação.
Depois do sofrimento na pandemia, o ano passado foi de “grande explosão” nas viagens, mas “isso já passou e há agora uma procura turística mais estável, embora com bons números e bons fluxos”. “Mas já tem dado alguns sinais de abrandamento e isso sentiu-se no mês de julho e na primeira semana de agosto também na cidade do Porto”, frisa. Aliás, foi na perspetiva dessa retração, impulsionada pela perda do poder de compra e por novos destinos concorrentes mais baratos, que diz ter baixado os preços “na hora certa”, sem quantificar.
O turismo já tem dado alguns sinais de abrandamento e isso sentiu-se no mês de julho e na primeira semana de agosto também na cidade do Porto. (…) Quem mantiver arrogantemente os preços altos pode ter uma situação menos positiva nas contas finais do ano.
“A redução de preços por parte do mercado hoteleiro na cidade é algo que tem de ser feito. Temos de estar vigilantes e tentar ir ao encontro do consumidor. Quem não o fizer e mantiver arrogantemente os preços altos, pode ter uma situação menos positiva nas contas finais do ano”, resume Filipe Barrias. No caso do grupo nortenho, que é ainda dono da Majestur, uma pequena agência de viagens na Rua Sá da Bandeira, reconhece que “manter os resultados de 2022 já seria positivo”.
(Notícia atualizada às 10h30 com dados da Informa D&B)
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