“Crime”, “cata-vento”, “azedume”: a reação dos partidos à privatização da TAP
Depois de o executivo ter anunciado esta quinta-feira a intenção de alienar pelo menos 51% do capital da TAP (reservando até 5% aos trabalhadores), as reações dos partidos dividem-se.
Depois de o Governo divulgar a intenção de alienar pelo menos 51% do capital da TAP, as reações dos partidos dividem-se. À direita, a IL diz que “o Governo reconheceu que errou” e defende uma privatização a 100%, enquanto o Chega diz que nunca concordou com privatização “a 100%” e pede esclarecimentos sobre o reembolso aos contribuintes do dinheiro público injetado na TAP.
Já à esquerda, o PCP considera que a privatização é “crime contra o país” e requereu uma audição urgente de João Galamba, enquanto o BE vai “procurar por todos os meios impedir esta privatização”. O PAN quer “total transparência” pelo que propôs que a privatização seja fiscalizada pela Entidade das Contas. Já o PS acusa oposição de “azedume” e diz que companhia continua a ser “ativo estratégico”.
Leia abaixo a primeira reação dos partidos à intenção do Governo de alienar pelo menos 51% do capital da TAP e que quer aprovar em Conselho de Ministros até ao final do ano, ou “o mais tardar” no início de 2024, o caderno de encargos da privatização da TAP.
PS acusa oposição de “azedume”
O PS acusa a oposição de “azedume” e de formular sempre as mesmas críticas “independentemente do tema”, salientando que a TAP continua a ser um “ativo estratégico fundamental” para o desenvolvimento do país.
“O conteúdo do que a oposição diz é, independentemente do assunto, a mesma crítica, o mesmo azedume, e a mesma incapacidade de construir e estamos aqui com vontade de construir e de estabelecer pontes com todos os partidos da oposição democrática, entenda-se”, afirmou Brilhante Dias, líder parlamentar do PS.
O socialista acrescentou que o atual Governo, “com a mesma noção de ativo estratégico, está a construir um processo de privatização que permita à TAP ter viabilidade económica, continuando a ser um ativo estratégico no quadro de uma grande aliança ou de uma grande rede que permita à TAP entrar, não só noutras rotas, mas como suportar de forma eficiente as rotas onde hoje já se distingue, que são as rotas do Atlântico sul e do Atlântico norte, também para os Estados Unidos da América”.
“Vamos esperar por este processo, processo que é aberto mas em que nós não nos mexemos um milímetro. Apesar das circunstâncias, a TAP continua a ser um ativo estratégico fundamental para o desenvolvimento do país”, concluiu.
PSD diz que processo TAP é “cheio de contorcionismos políticos”
O PSD disse que o processo TAP é “longo, cheio de contorcionismos políticos, mas acima de tudo cheio de populismos”, referindo o seu vice-presidente Miguel Pinto Luz, que os 3,2 mil milhões de euros que “são um custo demasiado alto e que são o reflexo fiel da falta de competência do primeiro-ministro e do Governo”.
O Governo herdou uma TAP “saudável” e que “funcionava”, disse Pinto Luz referindo que, “num estalar de dedos”, o executivo socialista resolveu reverter a privatização e tornar a TAP uma “coutada privada do Partido Socialista”, provando-se agora que “tudo não passou de puro populismo”.
“A prioridade é o Governo livrar-se da TAP porque a TAP hoje já é um ativo tóxico comunicacional”, defendeu o PSD, acrescentando que “António Costa e o Partido Socialista usaram e abusaram da TAP enquanto pensaram que esta lhes seria útil. Hoje, não lhes podendo ser útil, admitem a realidade e admitem a privatização, exatamente nos mesmos moldes que tanto criticaram, num processo de venda direta”.
“Oito anos depois, António Costa copiou a privatização que foi obrigado a desfazer e isto, do nosso ponto de vista, é simplesmente um crime político, económico e financeiro. A TAP é o espelho do Governo de António Costa e do Partido Socialista, de um governo sem rota, sem visão, sem coerência política (…) acima de tudo um Governo que não serve Portugal”, disse o vice-presidente do PSD, acusando-os de serem “autênticos cata-ventos eleitorais”.
Iniciativa Liberal diz que “Governo reconheceu que errou”
A IL afirmou que “o Governo reconheceu que errou” ao nacionalizar a TAP e defendeu que o dinheiro da privatização deve ser integralmente devolvido aos portugueses, através de um cheque ou descida de impostos.
“Ao contrário, o primeiro-ministro mudou de opinião cinco ou seis vezes. Hoje o Governo reconhece que errou ao nacionalizar a companhia, infelizmente só o faz depois de os portugueses lá colocarem 3,2 mil milhões de euros”, criticou.
O deputado da Iniciativa Liberal (IL) Bernardo Blanco considerou ainda “bastante estranho” que o processo de privatização possa só estar concluído no próximo verão, assinalando que se realizarão eleições europeias em junho, considerando que “não será coincidência”. O deputado frisou que a IL defendeu a privatização da companhia aérea nos últimos quatro anos, “muitas vezes sozinha”, tendo apresentado diplomas com esse objetivo “que mais nenhum partido votou a favor”.
Para a IL, a TAP deve ser privatizada a 100% e considerou que se o valor de venda for abaixo dos 3,2 mil milhões “o Governo tem de admitir que os portugueses estão a perder dinheiro”. Por outro lado, o partido considera que “não faz sentido que o valor da venda fique nos cofres do Estado”, mas tem de ser devolvido aos portugueses.
Chega quer saber se haverá reembolso a contribuintes
Para o Chega, o Governo falhou “no processo que levou à renacionalização da TAP e agora à sua privatização”. Questionado sobre se concorda ou não com a privatização da companhia, Ventura respondeu que o partido nunca concordou com a privatização “a 100% porque não estão garantidas rotas fundamentais”, nomeadamente “com a diáspora, com os emigrantes portugueses, mas também com os Estados Unidos da América, Brasil ou África”.
André Ventura pediu também esclarecimentos ao Governo sobre o reembolso aos contribuintes do dinheiro público injetado na TAP e questionou quem vai pagar eventuais indemnizações a ex-administradores da companhia aérea, após a sua privatização.
Na opinião do Chega, “os novos privados detentores da TAP têm que assegurar o valor das indemnizações que eventualmente terão que ser pagas a estas entidades”, sendo que o partido liderado por André Ventura quer também saber se os postos de trabalho na companhia aérea “estão em causa ou não nesta operação” de privatização.
PCP considera privatização “crime contra o país”
Em reação à privatização da TAP, o PCP requereu a audição urgente do ministro das Infraestruturas, João Galamba, considerando que se trata de “um crime contra a economia do país e contra a soberania nacional”.
O deputado do PCP, Bruno Dias, considerou que intenção de o Governo alienar pelo menos 51% do capital da TAP confirma “o enfeudamento do PS aos interesses do grande capital e a sua submissão às imposições da União Europeia, que há muito traçou o objetivo de liquidar” a companhia aérea.
O deputado do PCP considerou que o “Governo PS e os partidos à sua direita” querem entregar a TAP a uma multinacional, “não porque a TAP valha pouco ou seja um estorvo ao país, mas sim porque a TAP vale muito hoje e poderá valer ainda mais no futuro”. “Privatizar a TAP não é uma garantia de futuro, antes pelo contrário. Privatizar a TAP é o caminho para a destruição de um dos últimos instrumentos de soberania nacional”, sustentou.
Apesar disso, Bruno Dias disse que a prática demonstra que a privatização da companhia aérea “não é um assunto encerrado”, prevendo que a defesa de uma TAP pública irá mobilizar “muitos dos trabalhadores da companhia, muitos democratas e patriotas que não aceitam ver o seu país vendido a retalho”.
BE vai “procurar por todos os meios impedir esta privatização”
Na perspetiva do Bloco de Esquerda, “a TAP está salva” com dinheiro público, lembrando os mais de três mil milhões de euros injetados na companhia aérea, bem como os “cortes salariais brutais”, despedimentos e “saídas forçadas da empresa”.
“E, portanto, estando ela salva porque é que se vai entregar um ativo desta importância e que justificou este investimento, a um qualquer acionista privado? Não cabe na cabeça de ninguém. Portugal, se quer ser um país soberano, se quer ser um país moderno e desenvolvido, não pode vender todos os seus ativos estratégicos a investidores estrangeiros”, disse Mariana Mortágua.
Mortágua frisou que o BE vai “procurar por todos os meios impedir esta privatização”. “Vamos voltar a lutar contra esta privatização no parlamento, apresentando iniciativas e projetos para impedir que a privatização aconteça porque acreditamos que ela é um erro para o país”, afirmou.
PAN quer Entidade das Contas a fiscalizar privatização
Inês de Sousa Real propôs que a Entidade das Contas e Financiamentos Políticos fiscalize o processo de privatização da TAP, para garantir “total transparência”, e defendeu que o negócio não pode traduzir-se num “prejuízo para o interesse nacional”.
A líder do PAN referiu que a TAP é “absolutamente estratégica para o país”, tanto do ponto de vista da sua empregabilidade, como da “economia em torno da empresa”, recordando que “foi à conta dos dinheiros públicos que foi resgatada”.
“A sua privatização agora não pode significar um dano em relação ao dinheiro que foi investido e depois que esta privatização se venha a traduzir novamente num sorvedouro de dinheiros públicos que foram retirados a áreas estruturais como a habitação, a saúde ou o investimento, por exemplo, nos transportes públicos como a ferrovia”, disse. Neste contexto, Inês de Sousa Real considerou “importante que o Governo clarifique bem quais são as condições em que a privatização vai ocorrer” e que “haja uma total transparência”.
“Também não existem, até agora, do nosso conhecimento, contrapartidas ambientais para esta privatização”, acrescentou.
Livre alerta que Estado vai perder controlo estratégico
O Livre criticou a intenção do Governo, alertando que o Estado vai perder o controlo estratégico da companhia e que não se pode “dizer tudo e o seu contrário”. Para o Livre, este é “exatamente o modelo errado de privatização”, disse Rui Tavares, deputado único do partido, defendendo que, a haver privatização, “ela teria que ser no máximo até 49%, ou seja, deixar o Estado português com capacidade de controlo”.
O Livre diz não entender esta privatização, “a partir do momento em que [a companhia] foi saneada com custos elevados por parte dos portugueses”, defendendo que a TAP poderia contribuir para o Orçamento do Estado do país, e existir “investimento público em algumas áreas que são de ponta e que são muito importantes para o país e que podem fazer do país vanguarda em termos de descarbonização, de utilização do hidrogénio verde para as aeronaves”.
Para o Livre, “se este plano for por adiante, não tem em nada diferença nenhuma em relação às privatizações que Pedro Passos Coelho tentou fazer no fim do seu mandato”.
“Pode dizer-se: ‘mas vamos fazer um contrato em que a TAP vai assegurar serviços que são exigidos pelo Estado português’ mas a verdade é que com o contexto da aviação a mudar muito, esses contratos podem ser renegociados e não há maneira fácil de obrigar os detentores da companhia a cumpri-los”, avisou.
Assine o ECO Premium
No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.
De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.
Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.
Comentários ({{ total }})
“Crime”, “cata-vento”, “azedume”: a reação dos partidos à privatização da TAP
{{ noCommentsLabel }}