Empresas atraem imigrantes com habitação, formação e acesso à saúde
Empresas disponibilizam habitação (em alguns casos gratuita), garantem o acesso à educação e saúde, dão formação, ajudam nos trâmites legais e incentivam os imigrantes a trazerem as famílias.
A Casa Mendes Gonçalves, Quinta do Quetzal, Vitacress, Vialsil, Natixis e Euronext são algumas das empresas que recrutam mão-de-obra imigrante e criam condições para a integração destes colaboradores. Disponibilizam alojamento, dão formação profissional e suporte na legalização e até incentivam os colaboradores a trazerem as famílias para Portugal. Existem empresas que até garantem o acesso à saúde e educação dos imigrantes e das suas famílias.
A agroalimentar Casa Mendes Gonçalves, fabricante dos molhos Paladin na Golegã, no distrito de Santarém, emprega 370 trabalhadores, sendo que 90 são imigrantes oriundos de 12 nacionalidades. Desses 90 imigrantes, 60 são refugiados ou asilados do Afeganistão, Paquistão, Índia e Iraque.
A empresa fundada em 1982 e liderada por Carlos Gonçalves estabeleceu uma parceria com a Rede Aga Khan para o Desenvolvimento (AKDN) que tem como afiliada uma agência de ajuda humanitária a Focus, para acolher pessoas em “enormíssima vulnerabilidade” e “outros cidadãos que vieram para Portugal e estavam a trabalhar na região no setor agrícola em condições muito diferentes” daquelas que a empresa proporciona, conta ao ECO a responsável pelos programas de integração dos colaboradores imigrantes da Casa Mendes Gonçalves.
A Casa Mendes Gonçalves contrata mão-de-obra imigrante desde 2020 e tem vindo a desenvolver políticas de acolhimento neste sentido. A empresa comprou imóveis e reabilitou-os para proporcionar aos imigrantes “habitação digna”. “Até este momento todos estes 60 migrantes refugiados, juntamente com as famílias têm beneficiado de habitação e despesas sem qualquer custo“, afirma Alexandra Marques, responsável pelos programas de integração dos colaboradores imigrantes da Casa Mendes Gonçalves. Os imigrantes, como os restantes colaboradores, ganham acima do salário mínimo nacional.
Até este momento todos estes 60 migrantes refugiados, juntamente com as famílias têm beneficiado de habitação e despesas sem qualquer custo.
Com o principal objetivo de financiar habitação a preços acessíveis, a Casa Mendes Gonçalves foi a primeira empresa portuguesa a emitir obrigações sociais em Portugal, com um valor de 2,5 milhões de euros e uma maturidade de cinco anos, numa operação privada totalmente subscrita pela Caixa Banco de Investimento (BI).
Para além do apoio aos imigrantes, a dona dos molhos Paladin, que fatura 56 milhões de euros, garante ainda aos imigrantes e às suas famílias o acesso à saúde através de consultas de medicina geral e familiar, “tendo em conta que muitos colaboradores e as suas famílias não têm acesso a médico de família”, lamenta a responsável pelos programas de integração dos colaboradores imigrantes da Casa Mendes Gonçalves.
Para além do acesso à habitação e saúde, a Casa Mendes Gonçalves tem um programa próprio de aprendizagem da língua portuguesa, com duas formadoras residentes, direcionado aos imigrantes e às famílias. Alexandra Marques afirma que a “formação em língua portuguesa é absolutamente crítica para a integração e inclusão”. Paralelamente de forma a ajudar a estabelecer uma melhor comunicação com a escola dos filhos dos imigrantes têm tradutores para a língua Farsi.
A empresa tem ainda a Associação para a Educação e Inovação Social Vila Feliz Cidade, uma associação dentro da Fundação Mendes Gonçalves — criada em agosto do ano passado — que tem como objetivo “criar uma política de habitação acessível subsidiada pela empresa que é um benefício não só para os refugiados, mas para qualquer colaborador a partir de determinados critérios, priorizando sempre as pessoas com maior vulnerabilidade”, conta Alexandra Marques que é também presidente da direção da Associação. “Estamos a alargar esta política com imóveis que ainda estão a ser reabilitados e outras soluções para que a habitação seja um benefício para todos. A equidade é importante”.
A empresa vai investir sete milhões de euros para criar uma escola pública direcionada à comunidade, desde à creche ao primeiro ciclo. A escola deverá abrir portas no ano letivo de 2025/2026. Um benefício que poderá beneficiar os filhos dos imigrantes.
Vialsil oferece habitação gratuita aos imigrantes nos primeiros seis meses
A Vialsil, que opera na área das vias de comunicação de autoestradas de todo o país, emprega 134 colaboradores, sendo que 24 são imigrantes oriundos do Brasil (2) Índia (7), Senegal (8), Vietname (6) e Timor Leste (1). “A partir do momento que começamos a ser reconhecidos por recrutar imigrantes, abriu-se um leque de fontes de recrutamento que até à data não estavam a ser exploradas, passamos a ser contactados por associações representativas de emigrantes de várias nacionalidades em Portugal e pelo Centro Nacional de Apoio à Integração de Migrantes a referenciar potenciais candidatos”, explica Paula Carvalho, responsável do departamento de recursos humanos da Vialsil.
A empresa liderada por Paulo Portela começou a contratar mão-de-obra imigrante em agosto de 2019 e implementou várias políticas: disponibiliza alojamento gratuito em habitação cedida pela empresa nos primeiros seis meses de duração do contrato de trabalho. No entanto, a empresa esclarece que “depois do período de integração (meio ano), a responsabilidade financeira de alojamento passa para o colaborador”.
Nos primeiros seis meses de duração do contrato de trabalho é dado aos colaboradores alojamento gratuito em habitação cedida pela empresa.
A empresa de Baião dá suporte na legalização dos cidadãos em Portugal (Finanças, Segurança Social, AIMA), através de apoio legal. A responsável do departamento de recursos humanos da Vialsil acrescenta, ainda, que é “concedida ajuda para abertura de conta bancária, registo no serviço nacional de saúde, equivalência de habilitações, garantia de condições de subsistência (alimentação, roupa), incluindo adiantamento de valores para alimentação para os casos em que tal é necessário”.
À semelhança da Casa Mendes Gonçalves, a Vialsil “incentiva os colaboradores a trazerem as famílias” para Portugal.
Quinta do Quetzal tem um subchefe do Bangladesh
Localizada na Vila de Frades, Beja, a Quinta do Quetzal emprega 20 pessoas, sendo que quatro são imigrantes oriundos do Nepal e Bangladesh. Trabalham na cozinha e serviço de mesas, sendo que um deles, oriundo do Bangladesh, já é subchefe. “Começou sem saber cozinhar há dois anos e hoje já é subchefe. Está num alto nível e nunca foi para uma escola de hotelaria. Começou com 850 euros e hoje já ganha um vencimento base de 1.500 euros“, garante Reto Jörg, general manager da Quinta do Quetzal.
O general manager da Quinta do Quetzal realça ainda que “dois dos imigrantes vivem numa casa que é propriedade da empresa sem qualquer custo”. Paralelamente, a empresa alentejana dá formação em restauração aos imigrantes e ajudam-nos a aprender a língua portuguesa.
Reto Jörg garante estar “muito contente com o desempenho destes colaboradores” e recorda que “hoje em dia é difícil encontrar pessoas que queiram trabalhar numa cozinha”. Acrescentando que como recebem muitos turistas no segmento do enoturismo e os imigrantes falam inglês “acabam por ser uma mais-valia para o serviço de mesa”.
Hoje em dia é difícil encontrar pessoas que queiram trabalhar numa cozinha.
A população estrangeira residente em Portugal aumentou em 2022 pelo sétimo ano consecutivo, totalizando 781.915 cidadãos, mantendo-se a comunidade brasileira como a mais representativa e a que mais cresceu, de acordo com dados do SEF. No final de 2022, viviam em Portugal 239.744 brasileiros, seguido dos cidadãos do Reino Unido (45.218), de Cabo Verde (36.748), Índia (35.416), Itália (34.039), Angola (31.761), França (27.512), Ucrânia (25.445), Nepal (23.839) e Guiné-Bissau (23.737).
O presidente da Associação da Hotelaria de Portugal afirmou que a mão-de-obra imigrante em Portugal representa já 15% do total. Bernardo Trindade prevê que o “futuro vai ser construído com imigrantes e que é preciso dignificar estes trabalhadores”.
Vitacress facilita a acomodação inicial em habitações próprias
Dos 420 colaboradores da Vitacress, o negócio agroalimentar do grupo RAR, 20% são oriundos de diversas nacionalidades, incluindo europeus, americanos e asiáticos. Carlos Vicente, diretor-geral da empresa, justifica que “estes trabalhadores concorrem à Vitacress atraídos por empregos estáveis e oportunidades de carreira a longo prazo, dado que a nossa operação não é sazonal”.
Cerca de 20% da nossa equipa é composta por colaboradores de diversas nacionalidades, incluindo europeus, americanos e asiáticos. Estes trabalhadores concorrem à Vitacress atraídos por empregos estáveis e oportunidades de carreira a longo prazo, dado que a nossa operação não é sazonal.
A empresa que foi comprada em 2008 pelo Grupo RAR e fatura atualmente 40 milhões de euros, “facilita a acomodação inicial de novos colaboradores em habitações próprias, proporcionando apoio durante a sua adaptação à vida local”. O gestor garante que a empresa “assegura igualdade de acesso a todas as oportunidades de formação e progressão na carreira, baseadas no mérito e competências individuais”.
O tema da imigração tem feito correr muita tinta e partidos como o Chega têm adotado discursos anti-imigração. O presidente da Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP) disse que “quem for contra a imigração é contra o desenvolvimento do país”. O antigo embaixador, que assumiu a presidência da CAP no ano passado, destacou a importância dos trabalhadores estrangeiros para setores como a agricultura, turismo ou construção, que dependem desta mão-de-obra “para a sua sobrevivência”.
No caso particular da agricultura, o presidente da confederação lembrou que algumas empresas chegam a ter 300 trabalhadores imigrantes, uma vez que em Portugal seria impossível recrutar este número. Porém, ressalvou que deve haver controlo para que as pessoas sejam contratadas “em boa e devida forma”, com contratos de trabalho.
Natixis e Euronext apostam na diversidade cultural
Para além dos setores mais tradicionais, as tecnológicas também recrutam mão-de-obra imigrante. A Natixis e a Euronext têm nas suas equipas colaboradores de várias nacionalidades. No caso da tecnológica Natixis, dos 2.400 colaboradores que trabalham em Portugal, 20% corresponde a perfis internacionais, de 37 nacionalidades distintas.
Para Maurício Marques, diretor de recursos humanos da Natixis em Portugal, as empresas só têm a ganhar com esta diversidade, que na ótica do gestor “garantem não só skills específicas de certas geografias (normas internacionais, conhecimento de línguas, entre outras), como também uma melhor adaptação à cultura do cliente através da incorporação de um modo de pensar e agir global na forma como nos relacionamos com as equipas localizadas nos vários continentes”.
O diretor de recursos humanos da Natixis em Portugal enumera que a empresa “disponibiliza alojamento para apoiar os colaboradores que venham de outras geografias” e tem “ainda prevista a disponibilização de suporte na obtenção do visto de trabalho e outros documentos necessários para a legalização da situação em Portugal”.
A Euronext assume-se como “diversa e inclusiva” e conta com mais de 60 nacionalidades representadas no conjunto dos 18 países onde opera, distribuídos por três continentes – Europa, América do Norte, e Ásia. Em Portugal, tem 24 colaboradores permanentes provenientes de 11 países – Irão, Brasil, Venezuela, Argentina, Chipre, Países Baixos, França, Angola, e Reino Unido.
No caso dos trabalhadores que vieram especificamente de outros países para trabalhar especificamente na Euronext, a empresa salienta que “existe uma estrutura de apoio para o estabelecimento do colaborador no país, nomeadamente através do apoio no registo junto das entidades relevantes (fiscalidade, residência, entre outros)”, adianta fonte oficial da Euronext ao ECO.
A Euronext, que tem um centro tecnológico no Porto, tem ainda um programa específico dedicado à Diversidade e Inclusão. Entre as iniciativas está uma formação em multiculturalismo (para todos os colaboradores) para promover o respeito por diferentes normas culturais e programas de mentoria. Celebram ainda o Dia Internacional da Diversidade Cultural através de workshops de sensibilização para a diversidade, e até degustações de alimentos provenientes de diferentes geografias.
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