Prémio de risco da dívida europeia dispara com ascensão da extrema-direita
A subida das forças conservadoras e nacionalistas nas eleições europeias causou um aumento significativo dos spreads das obrigações soberanas na Zona Euro. O prémio de risco de França disparou 50%.
Os efeitos das eleições para o Parlamento Europeu não se fizeram apenas sentir no quadro político. Desde que foram conhecidos os resultados das últimas eleições europeias, que sinalizaram uma subida das forças conservadoras e nacionalistas em muitos países, que o mercado da dívida soberana europeia tem estado em alvoroço.
No espaço de poucos dias, o prémio de risco da maioria dos Estados-membros da Zona Euro face à Alemanha dilatou-se significativamente. Foi o caso de França, com o spread da yield das suas obrigações a 10 anos face às Bunds a disparar 50% no espaço de duas semanas. Se a 6 de junho o prémio de risco entre os dois títulos era de 50 pontos base, a 19 de junho encontrava-se nos 75 pontos base.
“Os mercados estão desconfortáveis com o menor alinhamento europeu com as metas orçamentais devido a maior fragmentação política em França e Alemanha sobretudo”, refere Filipe Garcia, economista e presidente da IMF – Informação de Mercados Financeiros.
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A forte pressão sobre os títulos franceses é uma resposta direta à obtenção de 31,5% dos votos do Rassemblement National, o partido de Marine Le Pen, que levou o Presidente Emmanuel Macron a dissolver a Assembleia Nacional e a convocar eleições legislativas antecipadas para 30 de junho.
“Uma deslocação política do centro, para qualquer que seja o extremo, implica adicionar mais despesa, aumentando a probabilidade de as despesas aumentarem de forma mais descontrolada, e por isso é que estamos a assistir a este aumento dos spreads“, refere João Queiroz, head of trading do Banco Carregosa.
No entanto, não tem sido apenas o Tesouro francês a estar sob pressão dos investidores. Desde 9 de junho que o prémio de risco de Portugal, Bélgica e Países Baixos face à Alemanha aumentou, em média, 23%. No caso do Tesouro português, por exemplo, se o spread da yield das obrigações do Tesouro a 10 anos face às Bunds era de 61 pontos base a 6 de junho, na quarta-feira estava acima dos 75 pontos base.
Também sob pressão têm estado os títulos de dívida italianos. A vitória do Fratelli d’Italia de Giorgia Meloni, com 28% dos votos, que consolidou a sua posição como um dos principais influenciadores da política europeia, voltou a aproximar a yield das obrigações a 10 anos da barreira dos 4%, dilatando o prémio de risco face às Bunds em 27% para os atuais 152 pontos base.
“O aumento da incerteza é sempre negativo para os investidores”, refere Pedro Lino, CEO da Optimize, sublinhando ainda que, no caso de França, “as propostas dos partidos que podem ganhar incluem a nacionalização de algumas empresas ou medidas que poderiam colocar em causa a permanência da França no Euro”.
Todos os holofotes estão agora sobre as eleições francesas
Com o recomeço do procedimento de défices excessivos, que está suspenso desde 2020 devido à pandemia de Covid-19, a Comissão Europeia pretende agora retomar uma disciplina fiscal mais rigorosa para assegurar que os países da União Europeia não acumulam dívidas insustentáveis, comprometendo a estabilidade financeira da região.
Foi exatamente isso que sinalizou a Comissão esta quarta-feira, ao declarar que a França e seis outros países (Bélgica, Itália, Hungria, Malta, Polónia e Eslováquia) deveriam ser disciplinados por terem défices orçamentais superiores aos limites da União Europeia, com prazos de redução a serem fixados em novembro.
A Itália, que atualmente carrega uma dívida de cerca de 138% do PIB e deverá crescer menos de 1% este ano, foi rápida a tranquilizar os mercados, com o ministro da Economia, Giancarlo Giorgetti, a afirmar a necessidade de o país ter uma abordagem responsável na gestão da política orçamental.
A pressão dos investidores sobre as obrigações soberanas europeias será assim um fator crucial para garantir que os governos sigam as trajetórias de consolidação acordadas com a Comissão Europeia.
Mas em França a reação dos investidores foi diferente, com a yield das obrigações francesas a disparar a uma velocidade como não se via desde 2011.
Esta reação dos investidores ressalta a importância de uma trajetória orçamental clara e responsável por parte de qualquer força política que assuma as rédeas do país, numa altura em que ganha espaço a ideia de o partido de Marine Le Pen ganhar as próximas eleições e levar avante algumas das suas propostas, que passam por uma política económica protecionista, aumento da despesa pública e a redução da idade da reforma.
“Sendo otimista, os spreads devem reduzir-se, mas devido à instabilidade crescente na sociedade francesa é natural que o prémio de risco se mantenha mais elevado, quando comparado como período pré-eleições”, antecipa Pedro Lino.
A pressão dos investidores sobre as obrigações soberanas europeias será, assim, um fator crucial para garantir que os governos sigam as trajetórias de consolidação acordadas com a Comissão Europeia.
Com todos os olhos postos nas próximas eleições francesas, a expectativa é que a pressão dos mercados continue a ser um fator decisivo para manter os governos europeus alinhados com as metas de consolidação orçamental, evitando uma fragmentação potencialmente desastrosa do espaço europeu.
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