Fisco cobra indevidamente IRS de mais-valias geradas com a venda de casa
Há serviços das Finanças que continuam a exigir o pagamento do imposto quando o imóvel é propriedade de um dos cônjuges e o valor da sua alienação é reinvestido na compra em conjunto de uma habitação.
Há serviços das Finanças que continuam a cobrar indevidamente IRS sobre mais-valias da venda de casa, quando o imóvel é propriedade de um dos cônjuges e o valor da sua alienação é reinvestido na compra em conjunto de uma habitação, contrariando o que está plasmado na lei, alerta a Provedoria da Justiça no relatório de atividades de 2023, divulgado esta sexta-feira.
A instituição liderada por Maria Lúcia Amaral começa por indicar que, em 2012, “constatou que a Autoridade Tributária (AT) não aplicava a exclusão de tributação nas situações em que o imóvel vendido era propriedade exclusiva de um dos cônjuges e a mais-valia era reinvestida pelo casal na aquisição em conjunto de outro imóvel”. Nesse sentido, dirigiu uma recomendação para o Fisco isentasse de imposto esses contribuintes, “uma vez que a lei não exigia que o imóvel alienado pertencesse a ambos”, lê-se no mesmo documento.
“A recomendação foi acatada pela AT, que até publicitou o entendimento correto no Portal das Finanças“, destaca. Este é o entendimento publicado no site das Finanças:
No entanto, 11 anos depois, “a Provedoria de Justiça tomou conhecimento de que há serviços da AT que continuam a não aplicar a exclusão de tributação nestas situações, perpetuando, sem fundamento e já após expresso reconhecimento, a parcial inoperância da lei“, critica. Para a provedora, “este caso suscita a especial preocupação de revelar a incapacidade de, na esfera de uma mesma entidade, assegurar uma aplicação uniforme da lei“, sublinha.
Buraco na lei permite cobrança coerciva mesmo a quem está isento
Outra falha detetada na execução da lei está relacionada com a medida extraordinária criada no final do ano passado, ainda pelo governo de António Costa, no âmbito da mitigação do impacto da inflação sobre as famílias. A lei determina que os agregados podem ficar isentos de IRS sobre mais-valias geradas com a venda de casas secundárias e terrenos para construção, desde que esses ganhos fossem destinados para amortizar o crédito para habitação própria e permanente.
O diploma “abrangeu retroativamente as famílias que obtiveram mais-valias em 2022”, salienta a Provedoria. Contudo, a AT pôde continuar com os processos de execução fiscal que já estavam a decorrer, mesmo quando o imposto não era devido, “por inexistência de lei que suspendesse as cobranças em curso”, critica.
“Em outubro de 2023, no âmbito do pacote Mais Habitação, foram excluídas de tributação as mais-valias provenientes da venda de terrenos para construção e da venda de imóveis habitacionais secundários, quando o respetivo valor tiver sido utilizado para amortizar a dívida de empréstimos à habitação própria e permanente (do sujeito passivo, do seu agregado familiar ou dos seus descendentes)”, lê-se no relatório.
A provedora salienta que “a medida, que entrou em vigor a 7 de outubro de 2023, abrangeu retroativamente as famílias que obtiveram mais-valias em 2022, estabelecendo-se que a exclusão de tributação se aplica às transmissões realizadas entre 1 de janeiro de 2022 e 31 de dezembro de 2024″.
No entanto, “à data da publicação e entrada em vigor do diploma, os contribuintes que tinham efetuado transmissões durante o ano de 2022 já tinham sido notificados pela AT para o pagamento de imposto sobre tais ganhos”, observa a provedora.
Ora, “apesar da entrada em vigor do regime, na falta de normas de salvaguarda quanto à aplicação da lei no tempo, a AT prosseguiu a tramitação dos processos de execução fiscal instaurados a quem não procedeu ao pagamento do imposto liquidado, por inexistência de lei que suspendesse as cobranças em curso”, sinaliza.
A Provedoria da Justiça arrasa a atuação da Autoridade Tributária: “Ou seja, num contexto em que se visava acudir rapidamente a dificuldades financeiras das famílias, a AT continuou a cobrar coercivamente um imposto que, por determinação expressa do legislador, não era devido”.
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