Incêndios deitam por terra 20 a 22 milhões de euros de produção de castanha. Preços vão aquecer
Portugal é dos maiores produtores mundiais, com a maior superfície no norte e centro do país, zonas fustigadas pelos fogos. Associação aponta para 80% da produção afetada e disparo nos preços.
Portugal é o sétimo maior produtor mundial de castanha, com a maioria da produção a destinar-se à exportação. Porém, os incêndios deste ano, que têm assolado o norte e centro do país, zona nobre de plantação de castanheiros, estão a provocar perdas entre os produtores, que podem ascender a entre 20 a 22 milhões de euros, de acordo com estimativas preliminares da Associação Portuguesa da Castanha.
“Considerando aquilo que é a enormíssima área ardida este ano o impacto na produção será sério. A afetação dos soutos é sobretudo grande na parte norte da região centro, uma área de plantação da martaínha, a principal variedade da DOP (Denominação de Origem Protegida) da castanha dos soutos da lapa”, assinala José Gomes Laranjo, da Associação Portuguesa da Castanha, em declarações ao ECO.
Em 2024, a superfície de souto em Portugal atingiu 51.174 hectares (ha), com a maior área a localizar-se na região norte e centro do país, de acordo com dados do Instituto Nacional de Estatística (INE). A produção total no país alcançou 27.159 toneladas, com Trás-os-Montes a ser a região agrária com o maior contributo (20.398 toneladas), seguida pela Beira Litoral (3.155 toneladas) e pela Beira Interior (1.881 toneladas).
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Os múltiplos incêndios rurais de grande dimensão que assolam o país desde julho, sobretudo nas regiões norte e centro, estão contudo a afetar o ganha-pão de muitos agricultores, que já começam a fazer contas aos prejuízos. José Gomes Laranjo, que nota que as estimativas são preliminares e serão necessariamente atualizadas, aponta para “80% da produção deste ano afetada” pelos incêndios.
“Na parte norte da região centro, estamos a falar de cerca de seis ou sete mil hectares de martaínha – a variedade de castanha mais consumida – em cerca de 30 mil a 40 mil hectares que já arderam naquela zona”, destaca o responsável da Associação Portuguesa da Castanha. “Podem representar 20 a 22 milhões de euros de produção perdida este ano“, estima.
Segundo dados da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO na sigla em inglês), em 2023, último ano para os quais disponibiliza dados, Portugal foi o sétimo país a nível mundial com a maior produção de castanha num ranking liderado pelo China. Espanha ocupa o segundo lugar, seguido pela Turquia, Itália, Coreia e Grécia.
A produção deste fruto em Portugal tem vindo a crescer nos últimos anos, depois da quebra registada em 2022 e 2021. Contudo, ainda fica aquém das 42.183 toneladas registadas em 2020 e manteve-se, em 2024, abaixo do seu potencial, de acordo com dados do Instituto Nacional de Estatística. No ano passado, a produtividade média dos soutos no país foi de 531 kg/ha, atingindo os 2.322 kg/ha na Beira Litoral.
Segundo as estatísticas agrícolas do ano passado, a produção da castanha em Trás-os-Montes ficou abaixo do potencial produtivo, com produtividade apenas superior à de 2022 (ano de seca) e à de 2023 (ano de septoriose), sobretudo devido à entrada em produção de novas plantações e ao aumento da eficiência da colheita. Porém, “a situação foi atenuada pela qualidade dos frutos e pelo aumento das cotações“, assinala o INE.
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Com os incêndios, a produção deverá cair novamente este ano. “Dos 80% afetados, talvez 40% estejam irremediavelmente perdidos e poderão vir a carecer de novas plantações, um prejuízo que se vai prolongar por meia dúzia de anos“, realça José Gomes Laranjo.
Até porque, como explica ao ECO Jorge Lage, investigador sobre a cultura popular da castanha que publicou seis livros sobre o tema, um “castanheiro depois de arder pode deitar rebentos, mas normalmente têm de ser replantados e demoram cinco e seis anos” para começar a dar fruto. “Depois vai aumentado a produção e em 20/30 anos atinge uma produção muito satisfatória e rentável”, detalha.
O especialista em castanha defende, assim, a importância de fileiras que separem os extremos da agricultura, constituindo “corta-fogos naturais“. “Muitas vezes, no extremo junto ao castanhal, há mato e pasto que não foi limpo. Deve haver medidas mais rigorosas e eram necessários subsídios”, considera.
Uma publicação sobre o contributo para o reforço das fileiras do castanheiro, olival e vinha no concelho de Trancoso, no âmbito de um protocolo de Cooperação entre a Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro e a Câmara Municipal de Trancoso, com a colaboração de Instituto Politécnico da Guarda, destaca que “a fileira da castanha portuguesa revela uma importância particular na economia de regiões específicas do Norte e Centro do país, que se caracterizam pela sua baixa densidade populacional, sendo a produção da castanha uma das principais fontes de rendimento dos agricultores“.
Exportações têm como principal destino Espanha
A principal fatia da produção de castanha tem como destino a exportação. De acordo com dados do INE, em 2024, o país vendeu ao exterior cerca de 7,4 milhões de quilos deste fruto, o correspondente a mais de 22,3 milhões de euros. Números que representam uma queda de 36,6% nos quilos exportados e 16,6% em valor face a 2023.
Quando considerado o valor em euros exportado, em 2024, Espanha, Itália, Brasil, França e Alemanha são os cincos principais destinos das vendas portuguesas.
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Os incêndios terão impacto nos preços, quer ao nível da exportação, quer sobretudo na produção escoada para o mercado interno. “A martaínha ocupava um lugar muito específico na altura da castanha e é muito apetecida pelos assadores”, realça José Gomes Laranjo, da Associação Nacional da Castanha. Ou seja, com pouca produção disponível, os preços vão subir e os portugueses vão pagar mais caro pelo fruto nas superfícies comerciais ou nos assadores de rua.
Perante o atual contexto, a associação marcou para sexta-feira uma reunião com a fileira “para fazer uma análise conjunta das incidências”.
“Temos de olhar para o futuro e perceber como ajudar estes agricultores quer já tecnicamente, quer posteriormente criando estratégias“, sublinha José Gomes Laranjo.
(Notícia atualizada às 14h55 com a informação de que Portugal é o sétimo e não oitavo maior produtor mundial de castanha, mas uma vez que antes se tinha considerado a produção da Bolívia, onde a espécie cultivada é a castanha do pará)
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