Portugal já tem 25% das obrigações com taxas negativas

BCE tem sido um bom amigo da dívida portuguesa. Mais de 26 mil milhões de euros de obrigações nacionais negoceiam com juros negativos, baixando os custos de financiamento e os cofres públicos.

Mario Draghi, presidente do BCE, tem dado motivos para governos sorrirem com baixa dos juros.Flickr BCE

Não há dúvidas de que Portugal continua a beneficiar de um bom momento no mercado de dívida. Mas se ainda há gente pouco convencida, deixamos um novo argumento: mais de um quarto da dívida portuguesa no mercado apresenta taxas de juro negativas, totalizando os 26,6 mil milhões de euros, de acordo com os dados da plataforma online Tradeweb fornecidos ao ECO. Um cenário para o qual tem contribuído decisivamente o Banco Central Europeu (BCE), que tem permitido à República portuguesa baixar os seus custos de financiamento. Mas Portugal está longe de ser o principal ganhador neste cenário de juros baixos.

Há um total de 116,8 mil milhões de euros de obrigações do Tesouro que o Governo já emitiu em mercado primário e que os investidores podem negociar entre si no mercado secundário. Cerca de 22,8% destas obrigações estão a ser transacionadas com taxas negativas, segundo a Tradeweb. O que quer dizer que os investidores estão a comprar estes títulos de dívida por um valor superior àquele que vão ser reembolsos nas suas maturidades, transmitindo um sinal de confiança em relação à capacidade do país de pagar a sua dívida.

Ainda na última semana, mais uma linha de obrigações do Tesouro viu a taxa de juro cair para terreno negativo. Foi a yield associada à dívida a três anos, que negoceia atualmente nos -0,078% e que se juntou às outras linhas com maturidades inferiores com taxas em terreno negativo: dois anos, 12 meses, seis meses e três meses.

O que acontece na prática é que os investidores estão a aceitar adquirir estes títulos por 105 euros, por exemplo, quando sabem que no vencimento a irão receber menos, 100 euros, isto se mantiveram estes títulos até final. Daí a taxa de rentabilidade do ativo ser negativa.

Ainda assim, isto não significa que os investidores vão perder. Em primeiro lugar, as obrigações do Tesouro pagam um cupão todos os anos, garantindo um rendimento anual para quem as detém. Depois, estes títulos podem manter a tendência de valorização que têm observado este ano. Nesse caso, um investidor pode comprar uma obrigação a 105 euros na esperança de a vender por 106 euros ou mais, realizando-se mais-valias com isso. Este cenário não é descabido na medida que os mercados continuam a favorecer a dívida portuguesa em antecipação à decisão da agência Fitch que deverá retirar Portugal da categoria “lixo”.

Os dados da Tradeweb não incluem os bilhetes do Tesouro, cujas taxas também se apresentam com sinal menos. Segundo o IGCP, no final de setembro, havia um total de 14,7 mil milhões de euros em títulos com prazo de vencimento não excede os 12 meses a negociar no mercado.

70% da dívida alemã abaixo da linha de água

Por que é importante para Portugal? Embora estes dados se refiram às obrigações no mercado secundário, Portugal acaba por beneficiar indiretamente desta circunstância, porque estas taxas servem de referência sempre que há uma nova emissão de dívida por parte do IGCP. Em último caso, isto ajuda a reduzir os custos de financiamento do país. Por exemplo, no último leilão de bilhetes do Tesouro, a República conseguiu financiar-se com os juros mais negativos de sempre a seis meses e 12 meses.

Ainda assim, Portugal surge em último lugar do ranking europeu com maior montante de obrigações a negociar com taxas negativas. Há razões para isso, a começar pelo rating do país, que reflete o perfil financeiro menos favorável de Portugal em relação outros países, como a Alemanha, onde cerca de 70% da dívida tem juros negativos, um total de 776 mil milhões de euros. Ainda há dúvidas de que Berlim é o cofre-forte para os investidores?

No total dos países europeus em análise no gráfico seguinte, a média de obrigações com yields abaixo de zero é de 47,65%. E países como a Alemanha, Holanda, França, Finlândia e Áustria estão conseguir tirar um melhor proveito do atual momento do que Portugal, também em função as respetivas situações económica e financeira.

Portugal abaixo da Zona Euro

Fonte: Tradeweb (Europa inclui: Áustria, Bélgica, Finlândia, França, Alemanha, Irlanda, Itália, Holanda, Portugal, Eslováquia, Eslovénia e Espanha).

A instituição liderada por Mario Draghi tem sido um dos grandes responsáveis por este cenário de juros abaixo de zero no mercado de dívida. E isto não tem apenas a ver com o plano agressivo de compras. Há outro fator: há já algum tempo que a taxa de depósito do banco central está nos -0,4%, sendo este o juro que os bancos comerciais e outras instituições financeiras têm de pagar se pretenderem parquear o seu dinheiro nas contas do BCE.

Com a transferência deste encargo do banco para os clientes, sobretudo empresas e fundos de pensões, estes investidores preferem aplicar o dinheiro em ativos seguros como as obrigações alemãs que, apesar de terem juros negativos, não deixam de ser mais atrativas do que deixar o dinheiro parado no banco.

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