Confinamento deixa mais de 10 mil processos parados nos tribunais
Processo Tancos, Operação Marquês ou até o caso EDP são alguns dos 10.400 processos que se encontram adiados na justiça portuguesa desde a suspensão dos prazos.
Com o novo regime de suspensão de prazos processuais na consequência do segundo confinamento devido à pandemia de Covid-19, mais de 10.400 processos estão parados nos tribunais, sem nenhuma diligência marcada e sem fim à vista. Alguns desses processos em stand-by são os mais mediáticos como a Operação Marquês, o caso BES, processo de Tancos e a Operação LEX ou mesmo o julgamento de Rui Pinto.
Quase um ano após o fim do debate instrutório, no processo Operação Marquês, que coloca no banco dos arguidos o ex-primeiro-ministro José Sócrates por suspeitas de mais de 30 crimes, ele entre eles corrupção, ainda não existe data para a decisão instrutória. O debate instrutório terminou em julho mas o juiz Ivo Rosa já fez saber que não há data marcada para a decisão.
O juiz Ivo Rosa preferiu comunicar a decisão presencialmente ao invés de notificação ou pelos meios eletrónicos, não havendo data agendada. A fase de instrução, pedida por 19 dos arguidos, começou em 28 de janeiro de 2019, sob a direção do juiz Ivo Rosa, do Tribunal Central de Instrução Criminal. O juiz vai deixar de ter exclusividade no processo Operação Marquês após a decisão instrutória.
No último dia do debate instrutório, em setembro, o juiz Ivo Rosa destacou a complexidade do processo: 146 volumes, 56.238 folhas, às quais se juntam 4.895 folhas entregues na fase de instrução, que teve mais de 39 horas de alegações.
Num processo com 28 arguidos (19 pessoas e nove empresas), foram realizados na fase de instrução 11 interrogatórios a arguidos e inquirição de 44 testemunhas, o que perfaz mais 133 horas. Além da análise dos elementos de prova, ao tribunal foram colocadas 73 questões jurídicas, entre nulidades processuais, questões sobre inconstitucionalidade e de enquadramento jurídico-penal, a somar aos oito pareceres jurídicos, num total de 1.074 folhas.
Outro dos processos afetados pela suspensão dos prazos é o do Universo Espírito Santo, em que a abertura de instrução continua sem data.
Com início em 2014, um dos megaprocessos da história da Justiça portuguesa, o caso BES, viu em julho novos avanços com o despacho de acusação. Com 25 arguidos, 18 pessoas singulares e sete empresas, no processo estão em causa 348 crimes. Entre eles de burla qualificada, branqueamento de capitais, associação criminosa, falsificação de documentos, fraude no comércio internacional e desvio de fundos e corrupção ativa e passiva.
O processo do Universo Espírito Santo conta com o ex-presidente do BES, Ricardo Salgado, como arguido, sendo acusado de 65 crimes. Foram várias as razões para imputar a Salgado a responsabilidade ao nível de uma rede organizada de crimes económicos que acabou a resultar na queda e colapso do GES, no verão de 2014.
Entre os arguidos estão ainda José Manuel Espírito Santo, Manuel Fernando Espírito Santo, Alexander Cadosch, líder da Eurofin, Jean-Luc Schneider, ex-administrador da Espírito Santo Financiére, Amílcar Morais Pires, administrador financeiro do BES, e Isabel Almeida, administradora do BES.
O inquérito deste processo visava o apuramento de um conjunto de alegadas perdas sofridas por clientes das unidades bancárias Espírito Santo.
Também na Operação LEX o prazo para abertura da fase de instrução encontra-se suspenso devido ao novo confinamento. Em setembro de 2020, a PGR deu por encerrada a investigação, tendo deduzido acusação para julgamento contra 17 arguidos. Em causa estão os crimes de corrupção passiva e ativa para ato ilícito, recebimento indevido de vantagem, abuso de poder, usurpação de funções, falsificação de documento, fraude fiscal e branqueamento.
No banco dos arguidos estão Rui Rangel, ex-presidente do Tribunal da Relação de Lisboa, Luís Filipe Vieira, presidente do Benfica, Vaz das Neves, ex-presidente do Tribunal da Relação de Lisboa, Fátima Galante, ex-mulher de Rui Rangel e juíza com funções suspensas, entre outros.
O envolvimento de Rui Rangel neste processo levou à sua suspensão provisória de funções no Tribunal da Relação de Lisboa, em 2018, e posteriormente à sua demissão, em 2019. Também Fátima Galante foi sancionada pelo Conselho Superior de Magistratura (CSM) com aposentação compulsiva.
Rangel ainda recorreu ao Supremo Tribunal de Justiça da decisão do CSM por violação dos deveres e integridade, retidão e probidade, mas viu o seu recurso ser julgado improcedente.
Parado está também o processo EDP, estando a investigação dependente de um interrogatório ao antigo ministro da Economia Manuel Pinho, estando este planeado para abril.
Em julho, o juiz Carlos Alexandre apresentou o despacho de acusação e validou as medidas de coação propostas pelo aos três acusados. O despacho ditou que Mexia e Manso Neto ficassem suspensos das funções que exercem atualmente por oito meses. Entre as medidas de coação estava ainda a proibição de contactar, por qualquer meio, com arguidos, e o pagamento de cauções. Enquanto para o presidente da EDP e da EDP Renováveis o valor da caução é de um milhão de euros, para João Conceição o valor é de 500 mil euros. Medidas que foram contestadas pelos advogados dos acusados.
António Mexia comunicou no final do ano passado à EDP a sua indisponibilidade para integrar os novos órgãos sociais da companhia num próximo mandato, que seria o sexto à frente da empresa.
O processo das rendas excessivas da EDP está há cerca de oito anos em investigação no DCIAP e tem sete arguidos: António Mexia, João Manso Neto, o ex-ministro Manuel Pinho, o administrador da REN e antigo consultor de Pinho, João Conceição, Pedro Furtado, responsável de regulação na empresa gestora das redes energéticas, a própria EDP, e Artur Trindade.
Por fim, no caso Tancos está prevista a retoma do julgamento em abril, após a interrupção a 14 de janeiro. Em janeiro, o Conselho Regional de Lisboa da Ordem dos Advogados denunciou a falta de segurança sanitária no julgamento, que coloca no lado dos arguidos o antigo ministro da Defesa Azeredo Lopes. Em causa está o desrespeito de inúmeras regras de segurança.
A 2 de novembro começou o julgamento dos 23 arguidos do processo sobre o furto das armas de Tancos. O antigo ministro da Defesa Azeredo Lopes, o ex-diretor da Polícia Judiciária Militar Luís Vieira, vários elementos da PJ, membros da GNR e o alegado grupo responsável pelo furto de Tancos regressaram ao tribunal e responderam perante a Justiça no Tribunal Judicial da Comarca de Santarém.
Azeredo Lopes, que se demitiu do cargo político no seguimento do processo, está acusado dos crimes de denegação de Justiça e prevaricação, favorecimento pessoal praticado por funcionário, abuso de poder e denegação de Justiça. Nove dos arguidos são acusados de planear e executar o furto do material militar dos paióis nacionais e os restantes 14, entre os quais Azeredo Lopes, e os dois elementos da PJM, da encenação que esteve na base da recuperação do equipamento.
Por fim, o caso que envolve Rui Pinto também continua com o julgamento em stand-by. O criador do Football Leaks foi acusado de 90 crimes: 68 de acesso indevido, 14 de violação de correspondência, seis de acesso ilegítimo e ainda por sabotagem informática à SAD do Sporting e por tentativa de extorsão ao fundo de investimento Doyen.
O julgamento iniciou-se a 4 de setembro e foram arroladas 45 testemunhas pelo Rui Pinto. Entre elas a antiga eurodeputada Ana Gomes, o diretor nacional da PJ Luís Neves, Edward Snowden, o ex-ministro Miguel Poiares Maduro, o ex-presidente do Sporting Bruno de Carvalho, o treinador do Benfica Jorge Jesus, e Octávio Machado.
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