No ECO24, o presidente da CIP falou sobre as negociações para o aumento do salário mínimo nacional em 2019. Para o próximo ano, espera um orçamento "mais amigos das empresas".
O Presidente da Confederação Empresarial de Portugal (CIP) anunciou em junho a possibilidade de, no próximo ano, o salário mínimo poder ser aumentado para lá dos 600 euros, mais do que a meta estabelecida pelo Governo. Três meses depois, o cenário parece não ser tão positivo para António Saraiva. Em entrevista ao ECO24, diz que “as condições [para esse aumento] têm vindo a degradar-se“. E
A CIP está disposta a ir “até onde a economia e a situação das empresas o permitir”, começou por afirmar o representante dos patróes, quando questionado sobre a “surpresa” anunciada em junho aos trabalhadores portugueses. No entanto, decorrido este tempo, muita coisa mudou.
“Lamentavelmente, desde a altura em que fiz essas declarações até hoje, ao contrário do que seria desejável para o país, e não apenas para nós, as condições têm vindo a degradar-se. A produtividade — um fator determinante para a melhoria da nossa competitividade –, tem vindo a degradar-se já desde o ano passado. De facto, os sinais não são positivos para que possamos alimentar essa esperança“, disse.
Conforme explicou, na altura das declarações, António Saraiva antevia que “pudesse existir alguma retoma” e que o Orçamento para o próximo ano “pudesse sinalizar à economia algum conforto e alguma alteração da política económica”. Contudo, diz, não vê que isso esteja a acontecer. Neste sentido, afirma, haverá duas hipóteses: “Virmos a aceitar o valor que o Governo propuser ou, em diálogo e em negociação, poder haver alguma modelação, para cima ou para baixo, de acordo com os indicadores“.
Sublinhando que “os salários não podem ser geridos por decreto nem por ideologias, mas sim pela capacidade que a economia tem de gerar riqueza e por aquilo que as empresas produzem”, o presidente da CIP continuou, explicando que “sem empresas fortes não há um estado social justo nem uma política salarial que seja melhorada“. Embora reconheça que os trabalhadores portugueses têm, obviamente, “um salário mínimo que é baixo” e que gostaria “que os salários pudessem aumentar, mas sustentadamente”, Saraiva afirma que “são as empresas que têm que pagar os salários e devem ser as empresas a definir esses mesmos salários“.
Lamentavelmente, desde a altura em que fiz essas declarações até hoje, ao contrário do que seria desejável para o país, e não apenas para nós, as condições têm vindo a degradar-se. De facto, os sinais não são positivos para que possamos alimentar essa esperança.
Confrontado com as declarações proferidas pela CIP sobre os aumentos salariais nos últimos anos — nas quais defendiam que acabariam por provocar o aumento do desemprego, coisa que não aconteceu, pelo contrário –, Saraiva admitiu o erro, justificando que “essa avaliação seria de todos os parceiros sociais”. “Não será apenas a CIP a errar, mas assume a quota-parte de responsabilidade”. Contudo, foi ainda mais adiante e explicou: “O que nós dissemos, e continuo a dizê-lo, é os salários mínimos, ou outros, que extravasassem em muito aquilo que são as possibilidades das empresas, e sejam apenas definidos por decreto, sem razoabilidade económica, podem perigar, e perigarão, seguramente o desemprego“.
“Espero que o Governo não cometa os mesmos erros do ano passado”
Olhando para trás, o patrão dos patrões apela à mudança do modelo de desenvolvimento, do paradigma da sociedade portugueses, das empresas e da economia. “É essa política económica que nós queremos, sustentadamente. Dando-lhes [às micro e pequenas empresas] escala e dimensão, promovendo fusões e concentrações, saindo desta pequenez e desta pulverização”.
Para o OE2019, Saraiva espera “que o Governo não mantenha o seu autismo e que não cometa os mesmos erros que cometeu o ano passado” e, assim, seja capaz de apresentar um “orçamento mais amigo das empresas”. “Eu acredito, e sou crente”, disse. Para o responsável, o Governo não pode olhar para as empresas como uma “mera fonte de receita, como tem acontecido”. Pelo contrário, as empresas devem ser vistas como “motores de crescimento da economia e como células de dinamização dessa economia”.
Os Governos, e este Governo igualmente, não podem ver as empresas como mera fonte de receita, como tem acontecido. Têm que olhar para as empresas como motores de crescimento da economia, como células de dinamização dessa economia.
Para o OE do próximo ano, a CIP apresentou 50 propostas, “muitas delas decalcadas daquilo que o Governo já aprovou em Conselho de Ministros”, explicou. No ano passado, as propostas apresentadas pela CIP foram ignoradas pelo Governo, coisa que, este ano, não deverá acontecer: “A esperança é a última coisa a morrer. E se estamos convictos, como eu estou, da razão que nos assiste, não podemos perder essa esperança“.
Das 50 propostas apresentadas, sete são bastante “objetivas e prioritárias”. Mas, a esperança mostrada pela CIP, não caiu do céu. “Têm surgido alguns sinais o sentido de serem aprovadas, nas reuniões que temos mantido em sede de concertação social, nas reuniões com o Ministro do Trabalho”, salientou.
A CIP pretende que “das boas intenções” do Programa Capitalizar — criado pelo Governo para ajudar as empresas no investimento, no financiamento e no capital –, “se passe às ações”. E deixou no ar uma questão: “Se o Governo já aprovou em Conselho de Ministros esse programa, se o que falta é operacionalizá-lo, porque não fazê-lo e porque não ouvir estas propostas?”. Destas propostas, Saraiva destacou a principal: “Estabilidade fiscal. Não mexam nos impostos. Chega! Basta!“. E defendeu a baixa do IRC, explicando que, “se a taxa de IRC for diminuída”, está a ser dado aos investidores um sinal positivo.
“Oposição do PSD tem sido, lamentavelmente, inexistente”
As críticas de António Saraiva não foram direcionadas apenas ao Governo de António Costa. O PSD, mas mais propriamente o seu líder, Rui Rio, também foi visado. Quando passam oito meses desde que Rio assumiu a liderança do maior partido da oposição, António Saraiva afirmou ainda não conseguiu perceber qual é a agenda económica do social-democrata.
“Muito honestamente, ainda não consegui perceber”, atirou Saraiva. E, continuou: “Gostaria que o PSD, independentemente das suas lideranças, se assumisse como um partido assertivo, porque também aí, em sede parlamentar, a democracia também exige uma oposição forte e assertiva… E ela tem sido, lamentavelmente, inexistente”, acrescentou.
CGD “não apoia as empresas”
Inexistente também é a ajuda do banco estatal às empresas. A CGD “não apoia o tecido empresarial”, acusou o presidente da CIP, no ECO24. Além do apoio prestado pela Instituição Financeira de Desenvolvimento (IFD), também a instituição bancária deveria assumir esse papel. “Que vantagens tem o país em manter um banco público com aquela dimensão, se não der apoio ao seu tecido empresarial?“, questionou.
“Faço uma avaliação demasiado, diria, fundamentalista [da CGD]”, disse António Saraiva admitindo, no entanto, que está ciente das regras que atualmente os bancos têm de cumprir em termos de avaliação do risco do crédito.
“Bem sei que a supervisão e a regulação hoje são diferentes, obriga-os [aos bancos] a determinadas regras, e temos que ter cuidados para não acontecerem fenómenos que hoje todos lamentamos e que são maus exemplos, e que nos envergonham inclusivamente enquanto empresários”. Mas pede mais ajuda às empresas.
Apesar de continuarem alavancadas, têm feito o esforço para desalavancar, nota. Hoje, afirmou, “temos um tecido empresarial sólido, dinâmico e com necessidade de investimento, e sem acesso a crédito“.
“Hoje, a banca diz que melhores rácios, que tem capital disponível para bons projetos mas é a banca que avalia o que são bons projetos e, por isso, a esmagadora maioria, não chega, à economia real”, alerta.
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António Saraiva: Salário mínimo acima dos 600 euros? “Sinais não são positivos”
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