O secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares identifica aquelas que são para o Governo as principais reformas estruturais.
O fim dos Contratos de Associação com escolas privadas e a internalização, no Estado, de alguns serviços, em curso no setor da Saúde, são algumas das reformas estruturais identificadas por Pedro Nuno Santos nesta parte da entrevista que deu ao ECO. Os serviços prestados serão os mesmos? Sim. Mas, no caso das escolas reconhece que os privados eram provavelmente mais escolhidos por oferecerem outros serviços que a escola pública não consegue oferecer, pelo menos no imediato.
Pedro Nuno Santos espera ter pensão de reforma ou, aliás, como depois corrige, vive “com essa certeza”. Para já mantém-se o compromisso de, no quadro da legislatura, estudar a diversificação das fontes de financiamento da Segurança Social. Levando em conta um contexto em que as empresas são cada vez mais capital-intensivo, a tributação do capital é um dos cenários. Mas atenção, esclarece, nada disto significa mais impostos.
Nesta conversa sobre reformas estruturais, o secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares fala não só do que foi feito na Educação e do trabalhão que está a ser desenvolvido e será concretizado na Segurança Social, mas também do combate à precariedade no Estado e da descentralização. Que ainda não está sequer no início. Na sua perspetiva, o PS não tem “provavelmente” a mesma definição de reformas estruturais que o PSD e o CDS.
As reformas estruturais, que é uma expressão que tem quase perdido conteúdo, estão na sua opinião na agenda do Governo? O primeiro-ministro tem referido ultimamente a questão da qualificação. Essa é, na sua opinião, uma das principais reformas estruturais?
É uma das mais importantes reformas estruturais. Quando os portugueses ouvem falar de reformas estruturais, identificam-nas como cortes nos salários, cortes nos seus direitos e, de facto, nos últimos anos, isso tem sido sinónimo de reformas estruturais.
Nós temos um programa nacional de reformas com diversos eixos onde, no documento como um todo, está a estratégia e a visão estratégica deste Governo para o país a médio prazo. Comporta um conjunto de medidas e de ideais de intervenções, onde as qualificações são uma delas e a inovação e modernização do nosso tecido produtivo é outra. Há reformas estruturais em matéria de ligação do tecido empresarial às nossas universidades e em matéria de qualificações, que estão por fazer ou que estão muito atrasadas, e que permitiram graduar a nossa economia.
Mas há outras reformas estruturais esquecidas. Combater a precariedade no mercado do trabalho é obviamente uma reforma importante, desde logo no Estado, que tem aqui um papel importante a desempenhar. O combate à pobreza e à desigualdade, apontadas também como problema do nosso país pela OCDE, são preocupações que nós temos e que merecem e justificam reformas estruturais.
Não temos a mesma definição de reformas estruturais que têm, provavelmente, o PSD e o CDS em muitas matérias.
Queremos fazer reformas estruturais e elas estão a ser feitas em Portugal. Algumas delas pretendem acabar com rendas na nossa economia, no caso da saúde e no caso da educação.
E o que estão a fazer no caso da educação?
No caso da educação, tínhamos grupos privados de educação que suportavam parte do seu orçamento, nos chamados Contratos de Associação, mesmo em zonas onde havia oferta pública a funcionar abaixo da sua capacidade. Não realizar Contratos de Associação onde eles não são necessários é obviamente uma medida que reduz rendas num setor. Quando nós queremos internalizar, no SNS, um conjunto de atividades em matéria de meios de diagnóstico, análises clínicas ou fisioterapia, que já anunciámos e onde o Ministro da Saúde tem estado focado, estamos ao mesmo tempo a reduzir rendas de grupos privados, onde uma parte significativa do seu negócio depende de dinheiro público.
A melhorar o serviço público ou com garantia de que, pelo menos, se mantém?
Há sempre um objetivo de melhoria do serviço. Na educação e também obviamente na saúde. Não faz sentido nenhum, e qualquer cidadão português percebe isso, que existindo uma escola, que o Estado modernizou, a funcionar com 50% da capacidade, do outro lado na rua se tenha uma escola com Contrato de Associação cheia. Do ponto de vista da gestão dos recursos públicos isto não tem nenhum cabimento.
Muitos desses colégios ofereciam um conjunto de serviços que as escolas públicas não oferecem nem podem oferecer, pelo menos no imediato.
E porque é que as pessoas preferem a escola privada? Se a escola privada está cheia porque é que as pessoas não vão para a escola pública?
Não parto desse princípio. Muitos desses colégios ofereciam um conjunto de serviços que as escolas públicas não oferecem nem podem oferecer, pelo menos no imediato. No entanto, as escolas públicas portuguesas são de grande qualidade. A verdade é que os nossos alunos têm tido cada vez melhores resultados nos testes internacionais comparativos, nos testes PISA, ultrapassando os alunos suecos. O que quer dizer que, apesar de tudo e de tantos problemas que ainda temos para enfrentar em Portugal, também na educação, temos tido resultados no sistema público.
Se nós quisermos regularizar a situação de milhares de precários na Administração Púbica, não podemos deixar de o fazer pela via concursal.
Mas em termos gerais de qualificação precisamos ainda de melhorar.
Estamos muito atrasados ainda.
No caso da precariedade, o Governo fez um estudo, chegou a um conjunto de conclusões e agora vai criar uma comissão. Se fosse no setor privado, tinha de se integrar imediatamente os precários. Porque é que o Estado não respeita as mesmas regras do setor privado?
Porque não tem também a mesma liberdade de contratação do setor privado. Por transparência para com os cidadãos, o Estado impõe um regime concursal. Se nós quisermos regularizar a situação de milhares de precários na Administração Púbica, não podemos deixar de o fazer pela via concursal.
Mas é um concurso a fingir porque já se sabe quais são as pessoas que vão entrar.
Não, os concursos não podem ser a fingir. Vamos esperar para perceber a plenitude de toda a estratégia de regularização. E disse uma coisa que é obviamente verdade. As nossas empresas têm leis para cumprir e, quando são identificadas situações precárias, são obrigadas a integrar no quadro aquele trabalhador. Se o Estado quer fazer cumprir a lei tem de a cumprir na sua própria casa.
Mas não cumpre, não é?
Aquilo que nós queremos, neste momento, é que cumpra. E por isso é que vamos encetar este processo extraordinário de regularização.
Num contexto de aumento de produtividade, aumento do desenvolvimento tecnológico das nossas empresas, com um número crescente de capital intensivo, temos obviamente de repensar as fontes de financiamento da Segurança Social.
Há uma das reformas que não referiu que foi a reforma da Segurança Social. Pergunto-lhe de outra forma: acha que vai ter pensão de reforma?
Eu? Eu acho que vou ter pensão de reforma. Aliás, eu vivo com essa certeza. Nós sempre dissemos que era importante proceder-se a um debate, a um estudo da diversificação das fontes de financiamento da Segurança Social. Esse é um compromisso que está nas posições conjuntas, no Programa de Governo do Partido Socialista. A prazo, no quadro da nossa legislatura, apresentaremos uma proposta de diversificação das fontes da Segurança Social.
Tributando o capital?
Vivemos num contexto de aumento da produtividade, com empresas com cada vez mais capital intensivo, com maior valor acrescentado. E depois temos empresas de mão-de-obra intensiva, com menor valor acrescentado, que têm um peso maior no financiamento da Segurança Social, porque ele é apenas fruto de contribuições do fator trabalho. É um debate que temos de fazer, sem fechar a porta a nenhuma solução. Num contexto de aumento de produtividade, aumento do desenvolvimento tecnológico das nossas empresas, com um número crescente de capital intensivo, temos obviamente de repensar as fontes de financiamento da Segurança Social.
Todo o seu raciocínio me leva a concluir que se terá de encontrar um modelo para tributar o capital, no sentido capital versus trabalho.
Aquilo que quero dizer é que esse trabalho, essa procura de diversificação das fontes de financiamento, não deve fechar a porta a nenhuma solução. Percebo as conclusões que está a retirar das minhas palavras…
São legítimas ou não as conclusões?
São legítimas. Mas não estou a apontar nenhum caminho, nem a falar sequer de aumento de impostos sobre as nossas empresas, para que não fique aqui uma zona cinzenta. Não estou aqui a falar de aumento da tributação sobre as nossas empresas, que fique claro. Estou a dizer que há um compromisso de estudar a diversificação das fontes de financiamento da Segurança Social e essa é uma preocupação que nós temos, um compromisso, aliás.
Descentralização? Há um processo em curso. Não estamos sequer no princípio.
Uma das reformas é a famosa reforma do Estado. Um dos temas da atualidade é a descentralização. Isso enquadra-se na reforma do Estado?
Sim, obviamente. O primeiro-ministro, quando foi presidente da Câmara Municipal de Lisboa, liderou um processo de descentralização para as freguesias que correu bem. Tem essa experiência e conhecimento da capacidade de as autarquias poderem exercer, melhor até que a Administração Central, um conjunto de competências. Há um trabalho que está a ser feito. Isso pressupõe uma reforma do Estado, na medida em que haverá descentralização de competências, dos meios e recursos, para que essas competências possam ser exercidas.
É um trabalho que é facilitado por estarmos em ano de eleições autárquicas ou pelo contrário?
Acho que nem beneficia nem prejudica.
A Associação Nacional de Municípios tem manifestado que com mais competências tem que vir mais dinheiro. Será assim?
Como é óbvio. As competências têm de ser acompanhadas de meios para que possam ser exercidas. Nisso estamos todos de acordo.
Há calendário para essa descentralização?
Há um processo em curso. Não estamos sequer no princípio. Ele tem sido amplamente debatido no seio da ANAFRE, da Associação Nacional das Freguesias, na Associação Nacional dos Municípios, com os diferentes partidos políticos, sejam parceiros do Governo ou não. Não excluímos ninguém deste debate. O próprio PSD, que é uma força autárquica muito relevante, não pode nem está sequer excluído deste debate. Vamos esperar para conhecermos os seus resultados.
Assine o ECO Premium
No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.
De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.
Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.
Comentários ({{ total }})
Pedro Nuno Santos reafirma que diversificar financiamento da Segurança Social é um dos objetivos
{{ noCommentsLabel }}