Vítor Melícias afasta eleições antecipadas na mutualista e considera que o maior desafio da nova liderança de Virgílio Lima passa por regressar às origens: apostar mais no mutualismo e menos na banca.
Virgílio Lima é o homem que se segue na liderança da Associação Mutualista Montepio Geral, isto após a saída de Tomás Correia, que esteve 11 anos à frente dos destinos da maior mutualista do país. Vítor Melícias, presidente da assembleia geral e com mais de 30 anos de casa, considera que a “nova” administração vai conseguir sair da sombra do anterior líder. Porque Tomás Correia não é homem para continuar a interferir na vida da instituição e “nem os outros deixarão” que isso aconteça. “Mas eles são quatro bananas?“, refere Vítor Melícias, que é visto como o braço-direito de Tomás Correia.
Em entrevista ao ECO, Vítor Melícias diz que o maior desafio passa por fazer regressar o Montepio ao mutualismo e dar menos importância à parte bancária. E afasta o cenário de eleições antecipadas como exigem alguns associados que se candidataram nas últimas eleições em listas da oposição a Tomás Correia.
O regulador já deu luz verde à nova equipa de gestão, que será liderada por Virgílio Lima. Vai conseguir trabalhar com autonomia face a Tomás Correia ou Tomás Correia vai querer exercer, de alguma forma, influência nas decisões da administração?
Julgo que não. No lugar de Tomás Correia, não faria isso. Sempre fiz isso: estava nos bombeiros, depois de sair, nunca mais. Nas mutualidades, quando saí, saí mesmo. Se me perguntarem uma opinião, eu dou-a muitas vezes. Agora, Tomás Correia estar lá a interferir? Ele não é homem para isso. Nem os outros deixarão. Mas eles são quatro bananas? Não estamos a brincar.
O que poderá mudar com a nova gestão?
Ainda não falei com Virgílio Lima, não sei quais são os planos dele. Mas julgo que uma das coisas que Tomás Correia acabou por não fazer por causa de todas as perturbações foi mutualizar ainda mais a associação mutualista. Valorizar mais o aspeto associação do que o aspeto das tarefas bancárias, seguradoras, etc. Dar mais capacidade à associação mutualista de atuar como associação de economia social.
Voltar às origens?
Voltar àquilo que eu fiz quando para lá fui. O Montepio era praticamente conhecido apenas como uma banca. Depois ficou mais conhecido como associação mutualista. O Montepio é uma associação de solidariedade social.
É esse o maior desafio da nova equipa?
A nova equipa terá mais hipóteses de o fazer. Já há uma gestão competente, solidária na parte bancária. Uma vez que a Lusitânia já está estável — teve ali uns problemas, mas está estável agora –, a Associação Mutualista só tem de fazer a gestão regular e normal.
Que avaliação faz de Virgílio Lima?
O Virgílio Lima já lá está pelo menos há 40 anos. Ele está lá desde sempre. Quando eu entrei, ele já lá andava. Percorreu todos os setores. Se alguém conhece o Montepio e a sua história, é ele.
É um bom sucessor, portanto?
Se fosse eu a votar, votava nele. Mas isto não quer dizer nada.
O Virgílio Lima já lá está pelo menos há 40 anos. Ele está lá desde sempre. Quando eu entrei, ele já lá andava. Percorreu todos os setores. Se alguém conhece o Montepio e a sua história, é ele.
A nova equipa vai terminar o mandato tendo em conta as circunstâncias?
Sim, sempre aconteceu isso. Todas as vezes em que um presidente saiu, um dos que estava na administração subiu a presidente. Quando eu saí, o Costa Leal subiu. Morreu o Silva Lopes, Tomás Correia sucedeu. Nem houve eleições, nem houve necessidade de eleições para nada.
Neste caso, temos a particularidade dos novos estatutos que vão introduzir mudanças na vida da Associação Mutualista. Podemos ter novas eleições no próximo ano?
Mas não são mudanças radicais. Não faria sentido nenhum. Nunca aconteceu e vai acontecer agora para quê? Em que é que houve alteração de estrutura ou de funcionamento de estruturas?
Em relação ao banco, encontra alguma explicação para não ter um CEO desde há quase dois anos?
Agora já apresentaram um nome. O facto de haver alguma instabilidade nestas coisas perturba sempre a imagem de serenidade e perturba o próprio funcionamento. Mas isso são coisas que se vão remediando dentro do possível. Ora porque uns não foram considerados idóneos, outros que não sei quê… isso resolve-se.
Como tem visto o braço-de-ferro entre o acionista e o presidente do conselho de administração do banco?
Não vejo braço-de-ferro nenhum. Muito pelo contrário. Na última reunião do conselho geral, ele [Carlos Tavares] esteve lá connosco a apresentar as contas e esteve tudo muito bem com ele.
Mas no momento em que Carlos Tavares saiu da reunião, Tomás Correia não disse coisas boas dele.
Isso foram coisas que eu não ouvi. Já li no jornal, mas não faço caso disso. Não acredito.
Pedro Leitão será um bom CEO?
Não o conheço, não me vou pronunciar.
Falou-se na hipótese de a Santa Casa de Misericórdia de Lisboa ficar com uma posição de 10% no banco a troco de 200 milhões. Foi uma operação que não avançou depois de muita polémica. Fazia sentido a operação?
Falou-se mal e erradamente até por pessoas responsáveis no Parlamento. Isso é das coisas mais inacreditáveis. Aquilo era uma coisa tão simples como isto: para manter a Caixa Económica com a sua natureza de instituição de economia social, o Montepio iria alargar as participações para poder manter ali o núcleo da economia social. Para isso desafiaram-se as misericórdias e entraram muitas. E desafiou-se a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa. Mas como toda a gente ficou tão aflita porque achava que a Santa Casa ia à falência…
Mas fazia sentido a operação?
Para mim fazia todo o sentido. Mas estou perfeitamente tranquilo. Acho até mais: se agora viessem pedir [para entrar no capital], eu diria que não. Parece que a Santa Casa é do Estado e que não quero cá coisas do Estado. O Estado tratou aquele assunto como se a Santa Casa fosse do Estado. A Santa Casa da Misericórdia de Lisboa é uma instituição da sociedade civil, é da economia social. Mas o Estado tratou esta matéria como se a Santa Casa fosse uma coisa pública. Portanto, se aquilo é dinheiro público, eu não quero num banco de economia social.
Para mim fazia todo o sentido [a Santa Casa entrar no Banco Montepio]. Mas estou perfeitamente tranquilo. Acho até mais: se agora viessem pedir, eu diria que não. Parece que a Santa Casa é do Estado e que não quero cá coisas do Estado.
O argumento na altura era este: estava a tirar-se dinheiro para ajudar os mais necessitados para se investir num banco. Não é um argumento válido?
Não. E já fui presidente tanto da Caixa Económica como da Santa Casa de Misericórdia de Lisboa.
Há condições para uma maior abertura do Banco Montepio a outras instituições?
Já estão a participar.
Houve um primeiro passo que Tomás Correia considerou simbólico.
Portugal precisa de ter um bom banco de economia social. Como existe em França, no Canadá e noutros países. O Montepio pode ser muito bem o núcleo disso. Mas não é para engolir os outros. É para conjugar forças nas proporcionalidades das próprias capacidades para fazer efetivamente um bom banco de economia social em Portugal. Se se levantam as vozes contra, mais vale estar sossegado e cada um segue na sua vida.
Há pouco falou nesta tendência de o sistema querer apenas bancos grandes. Teme que o Banco Montepio seja vendido?
Não penso nada disso. Neste momento, pelo menos, é completamente impensável. Agora, a evolução da economia do mundo, sobretudo da finança, é imprevisível. Não se sabe o que vai acontecer em matéria de finanças.
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Tomás Correia continuará a mandar no Montepio? “Os que lá estão não são bananas”, diz Vítor Melícias
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