Em torno do caso Apple
É possível vislumbrar uma tendência, por parte da Comissão, para utilizar as regras dos auxílios de estado como alternativa a normas de combate à evasão fiscal e à erosão das receitas tributárias.
O Tribunal Geral da União Europeia (“TG”) emitiu, no passado dia 15 de julho de 2020, o Acórdão sobre o caso Apple.
Em causa no processo estavam alegados auxílios de estado concedidos a duas empresas do grupo, localizadas na Irlanda, mediante a emissão de Tax Rulings. De acordo com a Comissão, através dessas decisões, a Irlanda concedeu à Apple um tratamento fiscal seletivo, o que constituiu um auxílio estatal ilegal ao abrigo da legislação da União Europeia.
O TG e à semelhança do que havia decidido no caso Starbucks, determinou a anulação da Decisão da Comissão, considerando que esta entidade não esteve apta a demonstrar a existência de um tratamento mais favorável.
Em Portugal, os contribuintes também têm a possibilidade de obter, junto da Administração tributária, uma interpretação vinculativa prévia quanto a determinado regime fiscal aplicável à sua situação concreta, mediante a apresentação de Informações Prévias Vinculativas.
No entanto, este mecanismo rege-se por normas diferentes das existentes nalguns outros estados, pautando-se pela publicidade das decisões e possibilitando a outros contribuintes conhecer as mais recentes posições da Administração tributária quanto a um regime que lhes seja aplicável, permitindo-lhes, assim, socorrer-se da interpretação veiculada para sustentarem a sua posição.
Estes Pedidos de Informação Vinculativa portugueses “escapam” ao rótulo de potenciais formas de concessão, indireta que seja, de auxílios de estado, porque são públicos e porque podem ser invocados como justificação para a adoção de um determinado enquadramento fiscal por outros contribuintes, que não apenas aqueles que formularam o pedido de informação.
É possível vislumbrar uma tendência, porém, por parte da Comissão, para utilizar as regras dos auxílios de estado como alternativa a normas de combate à evasão fiscal e à erosão das receitas tributárias dos Estados membros. Sem admitir a dificuldade de aplicar estas regras tributárias – como a cláusula geral anti-abuso ou a dos preços de transferência-, a Comissão europeia recorreu às medidas previstas para regular os auxílios de estado para, desta forma, alcançar o que lhe não foi possível obter através da aplicação da lei fiscal. Faz entrar pela janela o que não consegue fazer entrar pela porta?
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