Um Programa de Estabilidade ou de campanha?
O mais extraordinário é que, sem qualquer justificação, o governo corta substancialmente as previsões de crescimento económico face ao previsto no PE do ano passado.
O Programa de Estabilidade (PE) 2023-2027 continua o caminho de Portugal de empobrecimento, estagnação económica e divergência face aos nossos concorrentes Europeus.
Mesmo com o PRR (que era a “bazuca” nas palavras do Primeiro-Ministro – que curiosamente há uns tempos deixou de usar essa expressão), o crescimento económico não ultrapassa os 2% ao ano.
Se pensarmos que nas contas do Governo o PRR representa, pelo seu efeito financeiro, um crescimento anual de 0,7%, percebe-se que sem este instrumento, Portugal estaria a crescer em torno de 1% ao ano.
Mas o mais extraordinário é que, sem qualquer justificação, o governo corta substancialmente as previsões de crescimento económico face ao previsto no PE do ano passado.
No ano passado a estimativa de crescimento para 2023 era de 3,3% (agora é de 1.8%). No ano passado, a previsão de crescimento para 2024-2026 rondava os 2,6%. Agora é de 2% ao ano.
Isso resulta da redução do PIB potencial de 2,5% para 1,8%, demonstrando o quanto estão erradas as políticas deste governo. A produtividade vai crescer apenas 1,6% ao ano.
Mas face ao OE23, a revisão do crescimento para 2023 é feita em alta, assente num maior crescimento das exportações e um menor crescimento das importações. Também aqui não há qualquer explicação. E é contraditório com a estrutura produtiva da economia Portuguesa.
Contudo, o crescimento de 2023 assenta quase exclusivamente na procura interna (contributo de 1,6 p.p. em 1,8% de crescimento), com a procura externa líquida a ter um contributo muito reduzido (0,2 p.p.).
Ao longo dos próximos cinco anos, de acordo com o PE, o PIB aumentará 9,9% em termos reais. O crescimento médio anual é de 1,9%. Em termos nominais, o PIB aumenta 27,9%. O crescimento médio anual é de 5,1%, ainda impulsionado pela inflação. A inflação é revista em alta, no ano em curso, para 5,1%, e vai reduzindo para 2%. Se isolarmos cada uma das componentes da procura global, as exportações serão a componente mais dinâmica – prevê-se que aumentam 22,5%, mais do dobro do PIB –, à média de 4,1% ao ano. Prevê-se que as importações cresçam menos do que as exportações (20,3%, o que dá 3,8% ao ano), pelo que, no período como um todo, a procura externa líquida terá um contributo positivo para o crescimento, de cerca de 1 ponto percentual (em 9,9%).
Contudo, o que se espera é que num espaço como o da UE, os países mais pobres se vão aproximando dos mais ricos (embora desde 2000 Portugal divergiu da média Europeia). Comparar o crescimento português com o da Alemanha ou da França, ou da Zona Euro, dominada por estes dois países que quase perfazem metade da economia conjunta do euro, é comparar o que não deve ser comparado.
Esse grupo de países é objeto de políticas especiais de apoio da União visando acelerar a sua convergência. É o grupo dos Países da Coesão: Bulgária, República Checa, Estónia, Grécia, Croácia, Chipre, Letónia, Lituânia, Hungria, Malta, Polónia, Portugal, Roménia, Eslovénia e Eslováquia.
Só um país registou nos últimos 7 anos um crescimento do PIB potencial menor do que Portugal: a Grécia. Ou outros cresceram muito mais.
O PIB potencial português aumentou, entre 2015 e 2022, à média de 1,5% ao ano. A Grécia viu o seu PIB potencial registar uma queda catastrófica de 0,9% em média anual. Os outros 13 cresceram 3% ao ano, o dobro de Portugal.
Assim, já fomos ultrapassados pela Lituânia (2017), a Polónia (2021) e a Hungria (2022), em termos de rendimento médio por pessoa. Este ano o venhamos a ser também pela Roménia.
Este Programa de Estabilidade põe a economia convergir para um crescimento potencial de 1,8%. No essencial, é o que se passou nos últimos 7 anos, quando o crescimento potencial português foi de 1,5% ao ano e o dos Países da Coesão (sem a Grécia e Portugal) foi de 3%.
Do ponto de vista orçamental impressiona a evolução da carga fiscal. Em 2015 a carga fiscal era de 34,4% do PIB. Em 2021 foi de 35,3%. Depois, em 2022, subiu 1,1 p.p., para 36,4%.
Só a receita de impostos subiu cerca de 9 mil milhões de euros em 2022 face a 2021 e mais 5,5 mil milhões face ao previsto no OE22 (que recorde-se foi entregue em abril de 2022). Só o IVA aumentou 18,1%, cerca de 3,5 mil milhões, e o IRC subiu 59,6%, cerca de 2,9 mil milhões.
Em 7 anos, o governo PS aumentou a carga fiscal em 2 p.p., tanto quanto tinha aumentado entre 2010 e 2015, mas aí em contexto de resgate financeiro.
Já as medidas de apoio para a mitigação dos efeitos da inflação foram de 4,8 mil milhões euros. Ou seja, face ao aumento da receita fiscal, e ao contrário do referido pelo Ministro das Finanças, ficaram 4,2 mil milhões por devolver aos Portugueses.
Quando se olha para a passagem do défice de 2021 para 2022 (de 2,9% PIB para 0.4% – pg 34 do PE), percebe-se ainda melhor a dimensão do saque fiscal. As receitas fiscais contribuíram para a redução do défice em 4,8 p.p. PIB! Tendo em conta que as contribuições sociais aumentaram 1,1 p.p e que as despesas com a Covid-19 diminuíram, face a 2021, em 1.8 p.p., mesmo considerando a redução da receita do REACT (o apoio Europeu à Covid-19) em 0,8 p.p., temos que o ponto de partida orçamental, fruto da conjuntura, era um extraordinário e histórico superavit de 4% PIB!
O governo aumentou a despesa estrutural (pessoal, consumos intermédios, prestações sociais e outra despesa corrente – a despesa de investimento teve uma ligeira redução de 0,1 p.p. do PIB) em 2,2 p.p., sendo que os apoios sociais para mitigar o efeito da inflação valeram também 2,2 p.p., chegando assim a um défice orçamental de 0,4.
Até 2027 o governo prevê atingir um superavit de 0,1% PIB. Promete reduzir a carga fiscal em 0,6 p.p. do PIB, sendo que as contribuições sociais mantêm o seu peso no PIB. Mas sabemos bem como funcionam as promessas Socialistas em matéria de carga fiscal: Todos os anos no papel a carga fiscal desce; raro é o ano em que não soube.
Já no investimento público, que em 2022 foi de 2,5% PIB (uma ligeira quebra face a 2021), o governo promete um aumento para 3,2% PIB para 2023, subindo para um patamar em torno de 3,5% ao ano. Convém recordar que as promessas sobre investimento público são como as da carga fiscal, mas ao contrário: nunca são cumpridas, mas enquanto a carga fiscal fica acima do previsto, a execução do investimento público fica abaixo do orçamentado. Considerando que o PRR representa um investimento público acima de 1% PIB/ano, percebemos que a componente nacional do investimento público vai continuar abaixo dos 2% PIB/ano.
Em síntese, o governo já está em campanha, usando o brutal aumento da receita fiscal, para continuar a alimentar a dependência do Estado, o empobrecimento e a forte degradação dos serviços públicos (por incapacidade de reformas nos serviços e na gestão pública).
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