Com rumo atual, PIB abranda no médio prazo e problemas estruturais não estão resolvidos
"Para memória futura, não acredito em milagres", disse Teodora Cardoso. Com rumo atual, o PIB até pode crescer 1,8% este ano, mas depois vai abrandar. Já o défice, não está estruturalmente resolvido.
Com as medidas de política aplicadas e anunciadas até ao momento, o crescimento da economia até acelera em 2017 — poderá atingir os 1,8% — mas depois vai perdendo ritmo. Já no que toca ao défice, o país está em condições de sair da vigilância reforçada de Bruxelas (excluindo impactos da banca) mas ainda está longe de garantir o necessário ajustamento estrutural. Esta é a projeção do Conselho das Finanças Públicas, apresentada esta sexta-feira, no relatório “Finanças Públicas – Situação e Condicionantes 2017-2021.”
“O PIB tem uma aceleração para 1,7%, que até poderia ser ligeiramente superior, não nos espantaria que fosse 1,8%, e depois tende a abrandar até 2021”, explicou Teodora Cardoso, presidente do Conselho das Finanças Públicas (CFP). Já a nível de finanças públicas, “a principal conclusão deste relatório é que ainda que tudo corra bem a nível do Procedimento por Défices Excessivos, ficamos com um grande espaço ainda para cobrir de ajustamento estrutural a que ficaremos submetidos logo após a saída”, adiantou.
"Este relatório não faz previsões. (…) O nosso papel não é adivinhar nem propor medidas. É mostrar como estamos e, com estas políticas, o que acontecerá à economia e ao Orçamento. ”
Mas antes de ir aos números, a presidente do CFP começou a apresentação com um aviso: “Este relatório não faz previsões.” Teodora Cardoso fez questão de explicar que este documento parte de um cenário de políticas invariantes — isto é, apenas toma em consideração as medidas já apresentadas, implementadas ou suficientemente especificadas pelo Governo de António Costa — e projeta o que acontecerá.
“Isto é diferente de apresentar previsões”, garantiu, frisando que a quem o cabe fazer é ao Executivo. “O nosso papel não é adivinhar nem propor medidas. É mostrar como estamos e, com estas políticas, o que acontecerá à economia e ao Orçamento. É evidente que outras medidas serão necessárias mas isso não nos compete a nós dizer”, argumentou.
Eu nunca falei em milagres e, para memória futura, não acredito em milagres.
O aviso chega depois de fortes críticas do primeiro-ministro, António Costa, que depois de Teodora Cardoso ter considerado que, até certo ponto, a redução conseguida no défice orçamental de 2016 (que ficou em 2,1%), foi um “milagre”, acusou o CFP de um “monumental falhanço”. Questionada sobre a polémica, Teodora Cardoso respondeu: “Eu nunca falei em milagres e, para memória futura, não acredito em milagres.” E frisou que o que fez na entrevista “foi explicar o que se passou.”
Então e qual é o pano de fundo?
Ao longo deste horizonte, o PIB vai crescer com o contributo da procura interna, verificando-se até 2019 um ligeiro contributo negativo das exportações líquidas. Contudo, Teodora Cardoso explicou que estes pequenos contributos negativos são dados pelo aumento do investimento e frisou que, sendo canalizado para atividades produtivas, “isso não será assustador”.
PIB cresce mais em 2017, mas depois abranda
Fonte: CFP – Situação e Condicionantes 2017-2021
Estas projeções são ligeiramente mais pessimistas do que as apresentadas pelo Banco de Portugal, esta quarta-feira, com uma metodologia muito semelhante. Sobre 2017, Teodora Cardoso admitiu que não considerou o impacto da visita do Papa Francisco, agendada para este 13 de maio, ao contrário do que fez o Banco de Portugal. “Considerámos a evolução das exportações e a procura externa, mas é perfeitamente aceitável que esse efeito nas exportações seja mais positivo em 2017. Mas é um efeito pontual”, defendeu a economista.
No que diz respeito ao crescimento do emprego, projeta-se a continuação de um crescimento, embora desacelere, tal como acontece ao PIB, até ao final do horizonte temporal em análise. Por exemplo: este ano projeta-se um crescimento de 1,1% do emprego, enquanto em 2021, num cenário de políticas invariantes, este crescimento abranda para 0,4%.
Há condições para Portugal sair do PDE, mas nesta projeção não está considerada nenhuma influência de possíveis necessidades de intervenção no sistema financeiro. Mas isso poderá ter impacto na possibilidade de sairmos. Seria péssimo se saíssemos do PDE e voltássemos a entrar.
Já o saldo estrutural “continua a não cumprir a regra a que ficamos sujeitos caso saiamos do Procedimento por Défice Excessivo”, notou a responsável, somando que a margem de segurança também não está ainda cumprida no que toca ao défice global.
“Há condições para Portugal sair do PDE, mas nesta projeção não está considerada nenhuma influência de possíveis necessidades de intervenção no sistema financeiro. Mas isso poderá ter impacto na possibilidade de sairmos do procedimento por défices excessivos”, ressalvou a responsável. E deixou um aviso: “Seria péssimo se saíssemos do PDE e voltássemos a entrar. Isso já aconteceu no passado e não é favorável. É menos ainda neste caso porque as regras do fiscal compact são ainda mais rigorosas do que as do passado.”
Saldos orçamentais melhoram, mas não o suficiente
Comparando as projeções do défice do CFP com as do Governo, verifica-se que em 2017 o valor fica ligeiramente acima: o ministro das Finanças, Mário Centeno, está comprometido com uma meta de 1,6% para o défice global deste ano. Para os próximos anos o Governo deverá atualizar as suas previsões no Programa de Estabilidade, que será entregue em abril.
Sobre a dívida, o CFP projeta uma redução já este ano e a manutenção da tendência de descida até 2021. Ainda assim, no final deste horizonte de projeção o rácio deverá continuar acima dos 120% do PIB: o CFP projeta 122,8%.
Comparando as projeções atuais com as de setembro de 2016, verifica-se uma melhoria dos números. Teodora Cardoso explicou que a diferença tem sobretudo que ver com o comportamento da economia em 2016. O primeiro semestre foi muito negativo, mas a segunda metade do ano surpreendeu pela positiva. “O nosso ponto de partida em 2016 era mau. Mas depois houve uma viragem, até a nível internacional”, nota, lembrando o Brexit e as eleições norte-americanas, que tinham provocado pessimismo quanto à evolução económica.
Fim de mandatos no CFP é “um problema que se coloca”
Teodora Cardoso comentou ainda a dificuldade que tem sido resolver o fim dos mandatos do vice-presidente do Conselho Superior do CFP, Jürgen von Hagen, e do vogal executivo, Rui Nuno Baleiras. Tal como o ECO contou em janeiro, foram propostos Teresa Ter-Minassian e Luís Vitório para substituir os dois responsáveis. Mas o nome de Luís Vitório levantou dúvidas ao Executivo desde o início e a proposta acabou por ser recusada.
Poderá discordar, mas deverá explicar porquê. Se continuar apenas a discordar [dos nomes propostos] isto destrói completamente os estatutos.
“Enquanto não forem substituídos, os atuais membros mantêm-se”, disse Teodora Cardoso. Mas admitiu que “o problema realmente se coloca”. Recordou que “já depois de terem terminado os mandatos, o Governo enviou uma carta aos proponentes [o governador do Banco de Portugal e o Presidente do Tribunal de Contas] dizendo que não aprovava a proposta”. E frisou: “Dizendo apenas isto.”
Ora, para a presidente do CFP isto levanta um problema jurídico porque “de acordo com os estatutos, o Governo é que nomeia mas a sua nomeação é apenas um ato formal”, argumentando que a escolha cabe a Carlos Costa e a Vítor Caldeira. Teodora Cardoso frisou: “poderá discordar, mas deverá explicar porquê. Se continuar apenas a discordar isto destrói completamente os estatutos.”
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