Como José Eduardo dos Santos vai manter o poder sem estar no poder
Entre os filhos que assumem cargos de poder e os apoiantes que nomeou para funções estratégicas, José do Eduardo dos Santos tem tudo a postos para manter o poder mesmo quando o largar.
Angola vai a votos e José Eduardo dos Santos vai deixar a presidência que mantém há 38 anos. As eleições gerais poderiam marcar um ponto de viragem para o país, mas os analistas que acompanham a política angolana têm dúvidas de que assim o seja. Entre os filhos que assumem cargos de poder e os apoiantes que nomeou para funções estratégicas, além do lugar que garantiu no Conselho da República, José do Eduardo dos Santos tem tudo a postos para manter o poder mesmo quando o largar, independentemente do resultado das eleições.
Petróleo, finanças, telecomunicações. Filhos controlam o país
Através dos filhos, José Eduardo dos Santos mantém o controlo de algumas das maiores empresas do país, públicas e privadas. Isabel dos Santos é o exemplo mais claro disso. A empresária multimilionária, considerada uma das mulheres mais poderosas do mundo e a filha mais velha do ainda presidente angolano é, desde o ano passado, por nomeação de José Eduardo dos Santos, a presidente do conselho de administração da Sonangol. Ao liderar a maior empresa de Angola, Isabel dos Santos assume também posições de poder em boa parte do setor bancário angolano.
A Sonangol, em nome próprio ou através de participadas, detém quase 40% do Banco Económico (o antigo Banco Espírito Santo Angola), 25% do Banco Caixa Geral Angola e 8,5% do Banco Angolano de Investimento. A petrolífera é ainda acionista indireta do Millennium Atlântico, banco que resulta da fusão entre e o Banco Privado Atlântico e o Millennium Angola, parte do grupo BCP, que, por sua vez, é detido em cerca de 15% pela Sonangol. Isabel dos Santos é também acionista de referência do BIC Angola, onde detém 42,5%.
Para além do setor petrolífero e da banca, Isabel dos Santos controla também a Unitel, maior operadora móvel de Angola, que controla também a maioria do capital do Banco de Fomento Angola (BFA, onde o português BPI detém o restante capital). Na área da comunicação José Eduardo dos Santos conta ainda com a filha Welwitschia, mais conhecida por Tchizé, que desde 2008 controla o Canal 2 da Televisão Pública de Angola, sendo também deputada.
José Filomeno dos Santos é outra peça importante da família do Presidente. Em 2013, o segundo filho de José Eduardo dos Santos foi nomeado para chairman do Fundo Soberano de Angola, um veículo para o desenvolvimento do país onde o Presidente injetou cinco mil milhões de dólares, provenientes das receitas petrolíferas da Sonangol.
“Mais do mesmo” no MPLA
No campo político, José Eduardo dos Santos também mantém o controlo. Desde logo, ainda que abandone a presidência do país, mantém-se como presidente do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA). Aliás, a única lista candidata ao Comité Central do Partido é aquela que José Eduardo dos Santos encabeça.
Ao mesmo tempo, o candidato do MPLA à presidência de Angola foi escolhido pelo próprio José Eduardo dos Santos. João Lourenço foi o número dois do partido durante vários anos e companheiro próximo do atual presidente.
José Eduardo dos Santos protegeu-se ainda com um decreto, aprovado no final de junho, que veio reformar o regime jurídico dos ex-presidentes da República de Angola. Com este novo regime, José Eduardo dos Santos passa a gozar da imunidade conferida aos membros da Assembleia Nacional, beneficiando ainda de uma pensão vitalícia correspondente a 80% do salário base do presidente em funções. Também no final de junho, o Parlamento angolano assegurou um lugar a José Eduardo dos Santos no Conselho da República, um órgão consultivo do Presidente da República cujos membros gozam de imunidade judicial.
Por tudo isto, ainda que haja uma mudança no nome do presidente, uma vitória do MPLA só trará mais do mesmo para Angola, consideram os analistas. “Uma vitória para o MPLA em Angola nas próximas eleições está a aparecer cada vez mais provável, cimentando o caminho para mais do mesmo em termos da política económica do país”, escreveram recentemente os analistas da consultora BMI Research.
Nomes de confiança nas forças de segurança. Por oito anos
Outra das medidas com que José Eduardo dos Santos avançou recentemente para segurar o poder prende-se com os órgãos de segurança do país. A 21 de julho, o Parlamento angolano aprovou uma lei que permite prolongar o mandato das chefias das Forças Armadas Angolanas, da Polícia Nacional e do Serviço de Inteligência e Segurança do Estado angolano. Na prática, meses antes de abandonar o cargo de Presidente, José Eduardo dos Santos pode nomear as chefias destes órgãos, por um período de quatro anos, prorrogáveis por igual período. Ou seja, mantém nesses cargos, durante oito anos, pessoas da sua confiança, que só poderão ser demitidos se forem culpados de “conduta criminal ou disciplinarmente grave”.
De acordo com a imprensa angolana, Manuel Hélder Vieira Dias, mais conhecido por general Kopelipa, terá sido um dos beneficiários desta lei que convenceu José Eduardo dos Santos a escrevê-la. No Parlamento, o general Kopelipa, ministro de Estado e chefe da Casa Militar, disse que a lei tem como objetivo a “estabilidade institucional do exercício das funções” destes órgãos de defesa.
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