Autarcas preparam queixa a Bruxelas contra reprogramação do Portugal 2020
"Estou a ponderar apresentar queixa em Bruxelas contra o exercício de reprogramação se o Governo não arrepiar caminho", disse ao ECO, Almeida Henriques. Há mais queixas vindas do Norte.
O exercício de reprogramação do atual quadro comunitário de apoio está a gerar forte descontentamento entre os autarcas do país, em especial no norte do país. Há quem admita levar a insatisfação até às últimas consequências caso o Governo não aceda aos seus argumentos. O presidente da Câmara de Viseu e vice-presidente da Associação Nacional de Municípios Portugueses, Almeida Henriques, está a liderar o movimento de contestação que poderá acabar na apresentação de uma queixa em Bruxelas contra as opções do Governo de reprogramação do Portugal 2020.
“Estou a ponderar apresentar queixa em Bruxelas contra o exercício de reprogramação se o Governo não arrepiar caminho”, disse ao ECO, Almeida Henriques. “Estou a preparar um texto para recolher apoios, caso o Governo persista no erro”, avançou ainda o social-democrata, que ocupou o cargo de secretário de Estado do Desenvolvimento Regional no Governo de Pedro Passos Coelho, até às eleições autárquicas de 2013 nas quais disputou a Câmara de Viseu com José Junqueiro do Partido Socialista e venceu. Uma vitória que reforçou no escrutínio de outubro de 2017 “Este reforço de votação dá-nos uma voz muito mais forte para falarmos no país, dá-nos uma voz mais forte para voltarmos a colocar na agenda aquilo que são as questões principais para o nosso concelho e região”, disse no discurso de vitória.
Estou a ponderar apresentar queixa em Bruxelas contra o exercício de reprogramação se o Governo não arrepiar caminho. Estou a preparar um texto para recolher apoios, caso o Governo persista no erro.
E é isso que o autarca está a fazer. “Estou a preparar o percurso”, diz ao ECO, remetendo uma decisão final sobre a ação a tomar para “depois de conhecida versão final da reprogramação”, sendo que a reunião da ANMP, na qual essa versão será revelada foi adiada, revelou Almeida Henriques. Contudo, fonte oficial do Ministério do Planeamento avançou ao ECO que “não há reuniões previstas com a ANMP”.
Para o antigo secretário de Estado, que teve o pelouro dos fundos comunitários e que foi responsável pela reprogramação técnica e estratégica do Quadro de Referência Estratégica Nacional (QREN) — o quadro comunitário anterior –, o problema está na opção do Executivo de desviar para investimentos em Lisboa — expansão do Metropolitano de Lisboa e Linha de Cascais — verbas que estavam inicialmente alocadas a outras regiões do país.
O ministro das Infraestruturas, Pedro Marques, já revelou que os Metros de Lisboa e Porto vão ter 180 a 185 milhões de euros do Fundo de Coesão, o sistema de mobilidade do Mondego vai ter 50 milhões e para a linha de Cascais estão reservados mais 50 milhões. E de onde vem o dinheiro? O ECO já tinha avançado que o Programa Operacional Sustentabilidade e Eficiência no Uso de Recursos (POSEUR) vai ser o escolhido para financiar estas prioridades. Apesar de haver uma fatia significativa neste Programa Operacional (PO) no qual não é possível mexer, tendo em conta os compromissos assumidos junto da Comissão Europeia aquando da negociação do Acordo de Parceria, em termos de combate às alterações climáticas, há uma parte, ao nível da eficiência energética, que vai ser realocada, nomeadamente as verbas que estavam reservadas para os contadores inteligentes e da eficiência energética na habitação.
É como alguém aqui dizia, com alguma sátira, mas naturalmente com muita magoa, é uma espécie de Robin Hood ao contrário, estamos a tirar aos menos desenvolvidos para dar condições de maior desenvolvimento a quem já está num patamar superior.
“É como alguém aqui dizia, com alguma sátira, mas naturalmente com muita magoa: é uma espécie de Robin Hood ao contrário, estamos a tirar aos menos desenvolvidos para dar condições de maior desenvolvimento a quem já está num patamar superior”, acusou Ricardo Rio, presidente da Câmara de Braga, no final da reunião dos autarcas do norte que decorreu esta segunda-feira em Braga. “Acima de tudo há um agravamento daquilo que são as discriminações e discrepâncias de tratamento das várias regiões pelo Estado Central” na proposta de reprogramação dos fundos do Portugal 2020 apresentada pelo Governo, explicou, no final da terceira reunião da Plataforma de Concertação Intermunicipal da Região Norte, que reúne as Comunidades Intermunicipais (CIM) do Norte e a Área Metropolitana do Porto. O presidente da CIM do Cávado alertou ainda o Governo que o Norte não irá ficar “passivo” quanto à possibilidade de desvio de fundos da região para outros fins.
A preocupação dos municípios não é nova. No congresso da ANMP que reelegeu Manuel Machado como presidente, a reprogramação do Portugal 2020 foi eleita como prioridade. “A necessidade de uma reprogramação do Portugal 2020 que respeite a coesão territorial”, — designadamente com reforço de verbas para a regeneração urbana, a revisão do modelo de financiamento do ciclo urbano da água, e a diferenciação positiva dos territórios de baixa densidade — foi também defendida na resolução do XXIII Congresso da ANMP que foi aprovada por unanimidade dos delegados presentes.
Para os municípios do Norte, o descontentamento vai mais longe: criticam a opção do Executivo de transferir verbas do Feder para o Fundo Social Europeu — para que o Programa Operacional Regional do Norte passe a assumir responsabilidades que até agora cabiam ao Orçamento do Estado, nomeadamente aos Ministérios da Educação e do Ensino Superior. Em causa estão despesas com a ação social escolar — alimentação nas escolas ou o transporte das crianças — mas também o contrato Emprego e Inserção do Instituto de Emprego e Formação Profissional, que passarão a ser asseguradas pelo Norte 2020 com verbas do Fundo Social Europeu, elencou ao ECO, o presidente da Câmara de Famalicão que é também o presidente do Conselho Regional do Norte.
A solução está a ser defendida pelo Executivo não só para o Norte, mas também para o Centro. Contudo, a presidente do Centro 2020, Ana Abrunhosa, recusou fazer qualquer comentário ao ECO sobre a opção, defendendo nada está fechado e que a reprogramação ainda está a ser negociada.
A ideia é que “o dinheiro que está a ser reprogramado fique na região” em vez de servir “ao financiamento do Orçamento do Estado”, defendeu o socialista Eduardo Vítor Rodrigues, presidente do Conselho Metropolitano do Porto, no final da reunião que decorreu na passada sexta-feira.
[A ideia é que] o dinheiro que está a ser reprogramado fique na região, [em vez de servir] ao financiamento do Orçamento do Estado.
Os autarcas acreditam que Bruxelas não dará luz verde a este exercício de reprogramação — para já os serviços estão a avaliar as primeiras linhas gerais que o Governo entregou à comissária europeia da Política Regional, Corina Cretu, mas ainda não há feed back, sabe o ECO. “Não me parece que Bruxelas aceite que isto aconteça”, disse, ao ECO, o presidente da Câmara Municipal de Famalicão, Paulo Cunha, no final da semana passada.
O Executivo responde a estas críticas com o argumento de que “o documento ainda não está fechado”, disse ao ECO fonte oficial do gabinete de Pedro Marques.
Os autarcas, para já, querem esgotar todas as vias negociais. “Só se utiliza a opção extrema [apresentar uma queixa formal em Bruxelas] se necessário”, concluiu Almeida Henriques.
(Notícia atualizada com mais informação)
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