CMVM sem poder para avaliar queixa contra auditoria da EY à Caixa
Queixa de ex-gestores do banco contra a EY por causa dos alegados erros e incorreções na auditoria de gestão ainda não entrou na CMVM. Mas regulador liderado por Figueiredo Dias estará de mãos atadas.
Antigos administradores da Caixa Geral de Depósitos (CGD) da equipa de Faria de Oliveira (2008-2010) vão avançar com uma participação à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) contra a auditora EY, por causa dos alegados erros e incorreções que encontraram na auditoria aos atos de gestão do banco público. Mas o regulador liderado por Gabriela Figueiredo Dias estará de mãos atadas. Porquê? Porque a entidade que produziu a auditoria não está na esfera de supervisão da CMVM, razão pela qual o regulador não tem autoridade sequer para pedir o relatório para analisar a qualidade do trabalho realizado.
Em causa estão “inconsistências, incoerências e erros detetados no relatório feito pela EY aos atos de gestão da CGD”, revelou ao Expresso o ex-administrador que está a liderar o processo de denúncia junto da CMVM, que desde há três anos passou também a supervisionar as auditoras. “A auditoria da EY está repleta de incorreções e inverdades relativas à correspondência entre normas regulamentares e normas internas da Caixa aplicadas à época, entre outras”, explicou o antigo responsável da CGD, que quer ver a CMVM a avaliar o trabalho feito pela auditora. Mas a queixa deverá “cair em saco roto”, apurou o ECO.
Isto porque quem fez a auditoria aos atos de gestão do banco público no período entre 2000 e 2015 foi a Ernst & Young, SA (no relatório da auditoria é perfeitamente verificável quem assina o documento) e não a Ernst & Young Audit & Associados SROC, SA. E só esta última entidade é que está sujeita às regras aplicadas às auditoras por parte do regulador do mercado de capitais. Em Portugal, a rede Ernst & Young SROC inclui três outras firmas-membro da Ernst & Young Global: a Ernst & Young, SA (responsável pela auditoria à CGD), a EY Managed Services, Lda. e ainda a Ernst & Young Angola, Lda. Ou seja, são quatro empresas diferentes que fazem parte do mesmo grupo internacional. Contactada, a EY não quis prestar qualquer declaração.
Já a CMVM disse ao ECO que a participação ainda não tinha dado entrada nos seus serviços: “Não recebemos até agora qualquer denúncia. Se, e quando entrar, ela será objeto da nossa melhor análise”.
"A EY levou a cabo uma ação de auditoria e produziu um relatório que está enviesado na sua conceção e viciado em várias das suas ilações e descuidado, por culpa própria ou por falhas de obtenção de informação, em vários dados e conclusões.”
Da equipa de Faria de Oliveira que tomou posse em 2008 fizeram parte Francisco Bandeira, Jorge Tomé, Rodolfo Lavrador, Pedro Cardoso, Norberto Rosa e José Araújo e Silva. A auditoria da EY acabou por “vitimar” estes três últimos gestores: Pedro Cardoso esteve na calha para liderar o Bison Bank (antigo Banif BI), Norberto Rosa deixou de poder presidir à comissão de auditoria do BCP e, conforme adiantou o ECO, Araújo e Silva afastou-se da administração do EuroBic por sua iniciativa para se precaver de qualquer dissabor do Banco de Portugal.
Um outro antigo administrador disse ao semanário que é muito provável que todos os elementos daquela equipa venham a subscrever a queixa. Faria de Oliveira não quis comentar a ação dos seus ex-colegas de administração, mas também ele se juntou ao coro de críticas ao trabalho realizado pela EY. Disse o atual presidente da Associação Portuguesa de Bancos (APB) na audição da comissão de inquérito à CGD na passada sexta-feira: “A EY levou a cabo uma ação de auditoria e produziu um relatório que está enviesado na sua conceção e viciado em várias das suas ilações, e descuidado, por culpa própria ou por falhas de obtenção de informação, em vários dados e conclusões“.
Foram vários os reparos elencados por Faria de Oliveira: inverdades, erros nos anos de originação de algumas operações de crédito, falhas no enquadramento regulatório aplicável à época, inconsistências na informação, distinção pouco clara dos mandatos, contexto macroeconómico e exercício de benchmarking face a outros bancos em falta, entre outras críticas.
Na mesma sede, também Carlos Santos Ferreira (líder da CGD entre 2005 e 2007) tinha criticado na semana passada o relatório da EY. “É factual, mas é um relatório factualmente infeliz” porque “tem dados omissos, dados errados, dados contraditórios, uma apresentação pouco cuidada e pouco profissional”. Antes, as críticas à EY tinham vindo os antigos órgãos de fiscalização do banco público: mais precisamente do antigo revisor oficial de contas, Manuel de Oliveira Rego, e do antigo presidente da comissão de auditoria, Eduardo Paz Ferreira.
Esta semana, a comissão parlamentar de inquérito começa a ouvir os devedores. Diogo Gaspar Ferreira, um dos promotores do resort de luxo de Vale do Lobo, desloca-se ao Parlamento na próxima quinta-feira. No dia seguinte será a vez de Joe Berardo. Já esta terça-feira são ouvidos dois responsáveis do Banco de Portugal, José Cunha Pereira e Carlos Eduardo Santos, que faziam o acompanhamento da CGD.
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