Lei prevê aumentos também para pensões mais altas, mas Governo recusa
As pensões acima dos 2.633 têm direito a aumentos à boleia da inflação? O Governo diz que não, mas há fiscalistas que desafiam essa interpretação. Dizem que são devidas subidas de 6,32 euros por mês.
A partir deste mês, a maioria dos pensionistas beneficia de aumentos entre os 0,24% e os 0,7%. Aqueles cujas reformas ultrapassem os 2.632,8 euros mensais não contam, contudo, com qualquer subida. Ao ECO, fonte oficial do Ministério do Trabalho confirma que as pensões acima desse valor vão ficar congeladas, mas há fiscalistas que defendem uma outra interpretação da lei, sublinhando que há espaço para um aumento de 6,32 euros por mês (quase 90 euros por ano) para as pensões mais elevadas.
A lei que fixou as regras de atualização das pensões prevê que, sempre que a média do crescimento real do PIB seja igual ou superior a 2%, mas inferior a 3%, as pensões acima dos seis Indexantes dos Apoios Sociais (os tais 2.632,8 euros) sejam alvo de uma atualização correspondente ao Índice de Preços no Consumidor (IPC) deduzido de 0,25 pontos percentuais.
De acordo com os dados publicados pelo Instituto Nacional de Estatística no início de dezembro, o IPC nos últimos 12 meses (sem habitação) foi de 0,24%. Ora, tal significa que às pensões mais altas deveria ser aplicada uma taxa de variação negativa (-0,1%), o que significaria um corte nessas prestações. A lei previne, contudo, tais situações com uma norma de salvaguarda que estabelece que, da aplicação das regras em causa, não pode resultar uma diminuição do valor da pensão.
A mesma lei define, por outro lado, que qualquer aumento aplicado a estas pensões deverá ter como mínimo o “valor máximo de atualização” conseguido nas pensões entre os dois e os seis Indexantes dos Apoios Sociais. Este ano, esse máximo está nos 6,32 euros, já que as prestações nesse intervalo beneficiam apenas de uma variação de 0,24%.
Segundo a interpretação dos fiscalistas da EY, esse ponto da lei devia conceder, assim, às pensões mais altas (entre seis IAS e 12 IAS) um aumento fixo de 6,32 euros por mês, quase 89 euros por ano. “Não podemos fazer tábua rasa do número 5º [do artigo 6º da Lei 53-B/2006]”, defende a fiscalista Anabela Silva.
Para esta fiscalista e segundo as simulações que foram feitas pela EY para o ECO, mesmo com a taxa de variação nos 0%, é o aumento referido que tem de ser aplicado. Só a revogação desse número cinco da lei (que prevê os tais mínimos de aumento) possibilitaria um congelamento, salientam os mesmos especialistas.
No ano passado, por exemplo, essa norma foi aplicada sem que fosse levantada qualquer dúvida. Na altura, as pensões acima dos seis IAS beneficiaram de um aumento de 0,78% (a inflação tinha sido 1,03%), não podendo o aumento ser inferior a 26,93 euros, valor que correspondia ao máximo de atualização conseguido nas pensões intermédias.
A interpretação dessa mesma lei não está a ser, contudo, consensual, este ano. Enquanto os fiscalistas da EY defendem que há lugar a um aumento de 6,32 euros, o Governo insiste num congelamento.
Questionado pelo ECO, o Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social garante que não está previsto qualquer aumento, em 2020, para estas pensões, uma vez que o valor da inflação “não o permite”. Fonte do gabinete de Ana Mendes Godinho explicou que, uma vez que a taxa de variação é 0%, não haverá qualquer atualização.
No relatório do Orçamento do Estado para 2020, já estava fixado o congelamento destas pensões, uma vez que apenas as pensões até aos seis IAS aparecem como alvo de atualizações. “A atualização das pensões e de outras prestações sociais atribuídas pelo sistema de segurança social, nos termos da Lei n.º 53-B/2006, de 29 de dezembro, na sua redação atual, bem como a atualização das pensões do regime de proteção social convergente, nos termos da Lei n.º 52/2007, de 31 de agosto, na sua redação atual. O OE 2020 prevê uma atualização: de 0,7% para as pensões do regime geral da segurança social e do regime de proteção social convergente até duas vezes o valor do IAS e de 0,24% para as pensões do regime geral da segurança social, compreendidas entre duas e seis vezes o valor do IAS”, lê-se no documento apresentado na Assembleia da República, em dezembro.
Em conversa com o ECO, a advogada Madalena Caldeira, da Abreu Advogados, corrobora a leitura que o Executivo tem defendido. “[O número cinco] está a pressupor um aumento”, frisa a especialista. “Não me parece que haja espaço [para um aumento]”, defende.
Divergências à parte, o Governo prepara-se para publicar, muito em breve, a portaria que fixa os aumentos das pensões para este ano sem prever atualizações para estas reformas mais altas. Para estas prestações, o único aumento será para as pensões que estejam imediatamente acima dos seis IAS, de modo a que se mantenha a posição relativa com as pensões imediatamente abaixo dos seis IAS (que será alvo de uma subida de 0,24%).
O Ministério de Ana Mendes Godinho não quis, contudo, adiantar qual será o valor desse aumento, nem que franja específica de pensões será abrangida. Fonte oficial atirou o esclarecimento desses pormenores para a tal portaria que deverá ser publicada a muito curto prazo.
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