Tribunal de Contas descarta responsabilidade nos atrasos do investimento público
O Governo quer simplificar o processo do investimento público, tendo Ana Catarina Mendes criticado a demora do Tribunal de Contas. A entidade liderada por Vítor Caldeira descarta responsabilidade.
O Governo vai aproveitar o Programa de Estabilização Económica e Social (PEES) para implementar um Simplex SOS para desburocratizar o investimento público, tendo o objetivo de acelerar a recuperação económica. Ainda não se conhecem as alterações propostas, mas no passado o PS criticou o Tribunal de Contas pelos “demorados” e “múltiplos” vistos do Tribunal de Contas. Questionado pelo ECO, a entidade liderada por Vítor Caldeira remete para as regras definidas por lei, descarta responsabilidade nestes atrasos e mostra-se disponível para colaborar com o Executivo nas alterações legislativas que estão a ser preparadas.
António Costa deu o pontapé de partida para o PEES na semana passada, na comissão política do PS, com os quatro pilares, a começar pela maior celeridade dos procedimentos da contratação pública, tanto nos prazos como na burocracia envolvida. Esta terça-feira, Manuel Machado, presidente da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP), também disse que era necessário um “simplex” para o investimento público.
Não se conhecem pormenores sobre o que é que o Governo quer mudar no código dos contratos públicos ou noutras leis relacionadas com a contratação pública, mas esta já era uma prioridade do Partido Socialista antes da pandemia. O problema também já tinha sido identificado no Executivo de Siza Vieira que disse ao Expresso no final de abril que iria avançar com “projetos de alteração que garantam a conciliação entre a exigência de transparência e controlo da correção dos procedimentos de adjudicação e a necessidade de rever alguns dos aspetos que a experiência dos últimos anos revelou determinarem mais atrasos”.
Em fevereiro, Ana Catarina Mendes colocou o ónus no Tribunal de Contas ao dizer ao Público que as contratações públicas estão “obrigadas a múltiplos vistos do Tribunal de Contas que são demorados”. “Os concursos estão desertos, porque os procedimentos e os cadernos de encargos dificultam que haja concorrentes”, acrescentou. A líder parlamentar do PS disse iria concentrar-se nas “respostas para a simplificação da contratação pública, garantindo todas as regras de transparência e um novo quadro legislativo que remova os obstáculos do investimento”, abrindo a porta a mudanças nas regras dos vistos do Tribunal de Contas.
Confrontado com estas declarações e a intenção do Governo de mexer com estes procedimentos, o Tribunal de Contas responde ao ECO o que está na lei, descartando ter responsabilidades nestes atrasos: “Note-se que o Tribunal de Contas só dispõe de 30 dias úteis para se pronunciar sobre um processo de visto, se após esses 30 dias o Tribunal não se pronunciar recai um visto administrativo – visto tácito“. Ou seja, passados os 30 dias úteis, o processo continua com um visto automático.
No caso de o Tribunal devolver o processo para pedir mais elementos ou esclarecimentos a contagem do prazo é interrompida e a mesma é retomada quando chega a resposta dos serviços.
No entanto, pode haver atrasos noutras fases do processo porque o prazo é interrompido caso o Tribunal de Contas devolva o processo à entidade em questão para pedir mais elementos ou esclarecimentos. A contagem do prazo “é retomada quando chega a resposta dos serviços”, esclarece fonte oficial do TdC. E há exemplos recentes deste tipo de atrasos, como é o caso do contrato de serviço público da CP que, segundo o Dinheiro Vivo, foi devolvido ao Ministério das Finanças e ao das Infraestruturas em dezembro de 2019 e foi enviado novamente ao TdC apenas em abril de 2020.
Recentemente, o próprio presidente do TdC ligou, a propósito da Conta Geral do Estado de 2018, a “má execução” do investimento público, visível na diferença entre o objetivo do Governo no Orçamento do Estado e o que é executado, à execução média dos fundos comunitários (Portugal 2020), o que também era um argumento dado pelo Executivo PS no início da legislatura anterior e que levou a críticas ao anterior Governo PSD/CDS. “Não fizemos uma análise detalhada das causas dessa má execução, mas seguramente uma das razões prende-se com a taxa de execução média [do Portugal 2020]”, disse Vítor Caldeira, no Parlamento.
Já quanto às alterações que o Governo quer introduzir, a entidade liderada por Vítor Caldeira diz que “não foi consultado sobre esta matéria até ao momento”, mas mostra abertura para colaborar no processo: “Nos termos da lei, o Governo ou a Assembleia da República podem solicitar ao Tribunal a emissão de parecer sobre projetos legislativos em matéria financeira“. O Tribunal de Contas revela ainda ao ECO que, relativamente à fiscalização prévia, apresentou em janeiro ao Governo um projeto de alteração à lei orgânica do TdC que “contempla medidas neste domínio”, mas cujo conteúdo não é conhecido.
"Os primeiros responsáveis pelo controlo são os próprios organismos e entidades que promovem o investimento público, assim como serão também os mais interessados em assegurar que o investimento que fazem está de acordo com a lei e é um investimento de qualidade.”
“O Tribunal de Contas desempenha naturalmente o seu papel de controlo externo independente”, afirma, sublinhando, porém, que “os primeiros responsáveis pelo controlo são os próprios organismos e entidades que promovem o investimento público, assim como serão também os mais interessados em assegurar que o investimento que fazem está de acordo com a lei e é um investimento de qualidade”. “Logo, se todos fizermos o trabalho bem feito, não haverá falta de controlo“, conclui fonte oficial do TdC.
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