Investidores contra decisão do Governo de limitar vistos gold ao interior
Decisão é justificada pelo contexto, mas o regime era razão de conflito entre Lisboa e Bruxelas. Investidores, promotores e mediadores consideram que é um sinal negativo para o capital estrangeiro.
Os vistos gold vão acabar para as grandes cidades e regiões do litoral do país a partir de julho do próximo ano. O Governo concretizou, esta terça-feira, a revisão do regime que já estava prevista e que pretende canalizar o investimento para o interior e territórios de baixa densidade. Mas os investidores dizem que, aí, não querem.
A alteração “apenas vai ter uma consequência: ditar o fim do programa, por total falta de interesse para quem aqui pretende investir e residir”, considera Hugo Santos Ferreira, vice-presidente executivo da Associação Portuguesa de Promotores e Investidores Imobiliários (APPII). Os dados compilados pela organização indicam que 97% dos vistos atribuídos até à data localizam-se no litoral.
“Pretender obrigar ou levar os investidores a colocar o seu capital onde estes não desejam (e apenas 3% dos investidores ao abrigo do programa golden visa quis investir o seu capital fora do imobiliário dos centros urbanos) ou onde ainda vêm muito risco para investir como é o caso de aquisição de imóveis no interior do país ou fora de centros urbanos mais consolidados, apenas terá uma consequência: levar os investidores a procurar outros países e outros programas de captação de investimento estrangeiro fora do território nacional que mereçam o seu interesse”, alerta.
"Pretender obrigar ou levar os investidores a colocar o seu capital onde estes não desejam apenas terá uma consequência: levar os investidores a procurar outros países e outros programas de captação de investimento estrangeiro fora do território nacional que mereçam o seu interesse.”
O programa de concessão de Autorização de Residência para Investimento (ARI) — que foi criado em outubro de 2012 — prevê atualmente uma discriminação positiva para o investimento feito em ativos do interior. Há um desconto de 20% no valor exigido de aquisição do ativo, mas os investidores dizem que esse desconto não foi usado por falta de interesse, tendo continuado o foco no litoral, em especial Lisboa, Porto e Algarve.
Não só não houve apetite por esse investimento no passado como, segundo a APPII, não há para o futuro. A associação fez um inquérito junto dos 200 associados (que representam investimentos anuais na ordem dos 30 mil milhões de euros) e concluiu que 100% pretende investir no litoral, não tendo havido nenhum a demonstrar intenções de investimento apenas no interior. Estão focados em Lisboa e Porto.
Imobiliárias criticam decisão “ideológica”
“A meu ver, não poderia haver pior altura para introduzir alterações ao regime de autorização de residência para atividades de investimento. Já seria um erro fazê-lo quando foi anunciado para o Orçamento do Estado 2020, e perante a situação pandémica que vivemos, torna-se ainda mais incompreensível, numa decisão, que, a meu ver, é meramente ideológica“, diz Luís Lima, presidente da Associação dos Profissionais e Empresas de Mediação Imobiliária de Portugal (APEMIP).
O Governo defendeu que a alteração ao regime (que continuará em regime transitório até 2022) é justificada pelo “contexto diferente” que se vive atualmente face ao existente quando foram instituídos os vistos gold. No entanto, esta era uma razão de conflito entre Lisboa e Bruxelas. O Parlamento Europeu pediu, em outubro, aos países da União Europeia para acabarem de forma imediata com os programas de vistos gold, defendendo que esta é uma entrada rápida para criminosos.
"A meu ver, não poderia haver pior altura para introduzir alterações ao regime de autorização de residência para atividades de investimento. Já seria um erro fazê-lo quando foi anunciado para o OE 2020, e perante a situação pandémica que vivemos, torna-se ainda mais incompreensível, numa decisão, que, a meu ver, é meramente ideológica.”
A APEMIP rejeita igualmente que este regime seja a causa para a pressão no mercado imobiliário, apontando para o número de transações. Em oito anos, foram atribuídos 9.340 autorizações e o investimento acumulado é superior a 5,6 mil milhões de euros, de acordo com dados compilados pela Lusa. Em 2020, nos primeiros 11 meses montante do total ascende a 619 milhões de euros, menos 11% que em igual período de 2019. Entre janeiro e novembro, foram atribuídos 1.133 autorizações.
“Não serão decerto os vistos gold os responsáveis pela falta de habitação ou pela especulação de preços“, defende Luís Lima. “Há que ter em conta que este mecanismo foi introduzido num período de crise económica, em que havia necessidade de escoamento de stock de casas que nunca serviriam a classe média e média baixa, pois estavam dirigidas a um segmento alto”.
Reconhece agora que poderá haver a necessidade de introduzir ajustes em zonas onde há maior pressão imobiliária, nomeadamente Lisboa e Porto. No entanto, a associação considera que esse ajustamento seria conseguido através do aumento do valor mínimo de investido, como propôs no final do ano passado. “Retirá-las [a estas cidades] deste programa é dar aos potenciais investidores um sinal negativo e de descredibilização de Portugal enquanto destino de investimento“, acrescenta o presidente da APEMIP.
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