“É muito importante clarificar completamente” apoios pós-moratórias, alerta Mário Centeno
O governador do BdP não se mostra pessimista com o fim das moratórias, mas diz ao ECO que é "muito importante clarificar completamente" a evolução futura dos apoios nos setores mais afetados.
Ano e meio depois de terem sido criadas, as moratórias públicas de crédito vão terminar no final de setembro tanto para os cidadãos (principalmente crédito à habitação) como para as empresas. Com o prazo a aproximar-se, o governador do Banco de Portugal, instituição que também está envolvida neste processo, alerta sobre a necessidade de se “clarificar completamente o quadro de apoios subsequentes”. E avisa que é preciso retomar a trajetória de redução de dívida na economia portuguesa, assim que for possível.
“Com a aproximação do momento em que as moratórias terminam para estes setores (porque para os restantes este processo já se iniciou em março) é muito importante clarificar completamente o quadro de apoios subsequentes“, afirma Mário Centeno em resposta a questões do ECO na sequência do Summer CEmp, a escola de verão da Comissão Europeia em que o governador participou.
Este alerta chega numa altura em que os bancos verificam se os clientes têm condições para retomar o pagamento das prestações do crédito e encontram soluções alternativas para evitar incumprimentos. Centeno confia na capacidade dos bancos em cumprirem as suas “particulares responsabilidades na identificação e acompanhamento dos clientes em dificuldades, bem como na procura de soluções”, o que “permitirá responder às dificuldades que se venham a observar”.
Para o líder do supervisor bancário, “terminar com as moratórias não significa deixar um vazio de políticas de apoio, antes pelo contrário“. “Significa fazer evoluir as medidas de apoio, em especial para os setores mais afetados pela pandemia“, complementa, reconhecendo o “grande desafio” de adaptar as medidas existentes. Na resposta por escrito ao ECO, o governador dá o exemplo do lay-off simplificado “por ser temporário, simples e eficaz”. O primeiro-ministro já confirmou em entrevista ao Expresso que essa medida vai manter-se no Orçamento do Estado para 2022 (OE2022).
A par deste alerta, Mário Centeno não mostra pessimismo com o aproximar do dia 30 de setembro, argumentando que “a economia portuguesa tem demonstrado resiliência e a sinistralidade nos créditos, que entretanto já deixaram de estar abrangidas pelo regime de moratórias, não é particularmente gravosa“. E mantém a ideia de que o país não podia ter prolongado ainda mais as moratórias sob o risco de ficar “isolado” na UE, o que “teria um impacto negativo na perceção internacional sobre a economia portuguesa”.
“Portugal tem que terminar com o regime de moratórias, que foi um importante instrumento de combate aos efeitos da crise pandémica, dentro dos prazos definidos pela EBA” (Autoridade Bancária Europeia), conclui.
Segundo os dados do Banco de Portugal, havia no final de julho 36,8 mil milhões de euros em empréstimos abrangidos por moratórias, menos 700 milhões do que em junho. Desse valor total, 41% é de cidadãos, que estarão protegidos por regimes especiais para evitar incumprimento — por exemplo, os cidadãos com crédito à habitação ficam protegidos pelo período mínimo de 90 dias –, e 59% é de empresas, as quais terão uma garantia de até 25% dos valores em dívida junto da banca.
Redução da dívida da economia tem de estar no horizonte
Com a progressiva melhoria dos indicadores económicos e os progressos do processo de vacinação, o governador do Banco de Portugal começa já a preocupar-se com a estabilidade financeira do período pós-pandémico, após um ano e meio em que o endividamento da economia reinou. Portugal tem vindo a atingir consecutivamente recordes na dívida das empresas, cidadãos e Estado, com um acréscimo de 35 mil milhões de euros provocado pela pandemia, como mostram os dados do banco central.
É “importante que todos os agentes económicos tenham presente que devem retomar o processo de redução do endividamento, assim que as condições económicas e financeiras o permitam“, apela Mário Centeno, argumentando que “esse foi o sinal mais determinante do sucesso da trajetória financeira do país no período pré-pandémico”.
O Estado, que foi também o que mais aumentou o endividamento durante a pandemia para compensar a quebra de rendimentos dos cidadãos e empresas, terá de fazer o maior esforço na redução da dívida pública uma vez que terá de cumprir as regras orçamentais europeias a partir de 2023, caso estas não sejam mudadas até lá. A remar a favor da redução da dívida está o crescimento económico dos próximos anos, dado que o que interessa é o peso do endividamento no PIB.
“Com a evolução muito favorável da vacinação em Portugal (que lideramos na Europa, onde a evolução também tem sido muito positiva), estão reunidas as condições para a saída sustentada da crise”, antecipa o governador do Banco de Portugal, mostrando confiança de que “vamos sair da crise muito mais rapidamente do que nas últimas crises (2009 e 2011)”.
Para o também economista, “os dados têm comprovado isso mesmo, demonstrando uma forte reação de consumidores e empresas sempre que as condições da pandemia permitiram a ‘abertura’ da economia“, dando o exemplo da continuação do aumento da confiança e a melhoria do clima económico no mês de agosto divulgada esta semana pelo Instituto Nacional de Estatística (INE).
Questionado sobre se espera uma revisão em alta das previsões do banco central, Centeno responde que “o Banco de Portugal atualizará as suas previsões no âmbito dos exercícios habituais de projeções para a economia portuguesa”, ou seja, em outubro. Ainda assim, reconhece que o crescimento homólogo de 15,5% e de 4,9% em cadeia do PIB no segundo trimestre “é compatível com a última previsão do Banco de Portugal para o crescimento do produto no conjunto do ano (4,8%)”.
“Porém, como também já tive a oportunidade de sublinhar, a recuperação é assimétrica, não por países, mas por setores de atividade“, remata.
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