Governo admite prolongar suspensão da caducidade da contração coletiva para lá de 2024
Ana Mendes Godinho avisa que, neste "momento crucial", não pode haver trincheiras, mas tem de haver pontes, e acena com disponibilidade para ir mais além na caducidade da contratação coletiva.
Com a aprovação do Orçamento do Estado ainda por garantir, a ministra do Trabalho foi, esta segunda-feira, à Assembleia da República avisar que este é um “momento crucial” para o país, pelo que “não pode haver trincheiras“. Antes, “tem de haver pontes“. Aos deputados, Ana Mendes Godinho garantiu que a proposta orçamental que está em cima da mesa é “claramente de esquerda” e adiantou, “piscando o olho” aos partidos mais à esquerda, que o Governo está disponível para prolongar a suspensão da caducidade coletiva para lá de 2024.
“Perante as várias discordâncias e dúvidas face ao modelo proposto para a alteração à arbitragem, foi transmitida a disponibilidade para, no processo legislativo, prever uma suspensão do prazo de sobrevigência mesmo sem o limite de tempo já anunciado para 2024″, anunciou a responsável pela pasta do Trabalho, mostrando-se, assim, aberta a ir mais além do que as medidas aprovadas pelo Governo, no âmbito da Agenda do Trabalho Digno, para prevenir a caducidade dos contratos coletivos e evitar vazios de cobertura, nomeadamente o reforço do mecanismo de arbitragem necessária e o prolongamento da moratória da caducidade por 12 meses.
De notar que esta é uma matéria cara tanto ao Bloco de Esquerda como o PCP, que defendem, contudo, a eliminação da caducidade da contratação coletiva e não a sua suspensão, como tem proposto o Executivo de António Costa.
A ministra do Trabalho aproveitou, de resto, para frisar que o Orçamento do Estado que está em cima da mesa “é claramente de esquerda” — incluindo “o maior investimento social de sempre na Segurança Social e nas prestações sociais” — e resulta de “intensas evoluções” face à proposta inicial apresentada por João Leão na Assembleia da República.
Ana Mendes Godinho sublinhou, também, que a proposta orçamental em causa “vai muito além” dos OE aprovados por uma maioria de esquerda, nos últimos anos, atirando que “este é um momento crucial para Portugal”, no qual “não pode haver trincheiras, tem de haver pontes”. A governante defendeu também que a maioria de esquerda “não pode ter sido um epifenómeno, tem de ser um caminho“, já que “ainda há tanto por fazer”.
“Votar contra este Orçamento é votar contra estes avanços estruturais. Não é o Governo que perde, é o país”, enfatizou ainda a ministra do Trabalho, referindo-se, por exemplo, no que diz respeito a medidas merecedoras de destaque, ao reforço do abono de família, ao alargamento da gratuitidade das creches, ao aumento extraordinário das pensões até 1.097 euros já em janeiro (que corresponde a um aumento de 600 milhões de euros das despesas com pensões) e à aposta na formação profissional dos trabalhadores em áreas estratégicas.
Ana Mendes Godinho frisou, além disso, que, em paralelo com o processo orçamental, o salário mínimo deverá ter “o maior aumento das últimas décadas“, subindo 6% face a 2021 e 200 euros face a 2015 para 705 euros.
Na intervenção final, a ministra do Trabalho insistiu que o Governo “não desiste do país”, acredita que a sua proposta orçamental “é essencial no momento que vivemos e continuará “à procura de pontos que permitam manter as políticas sociais de esquerda“. “O Governo não procura consensos por temer eleições. Procura consensos porque, confiando no apoio dos portugueses, entende que os portugueses lhe confiaram este mandato para garantir uma governação estável de esquerda“, atirou Mendes Godinho.
Governo recusa acabar com fator de sustentabilidade
Na audição desta segunda-feira, o Bloco de Esquerda frisou repetidamente que quer ver revogado o fator de sustentabilidade, que hoje tira 15,5% às pensões pedidas antecipadamente, mas o Governo garantiu que não irá fazê-lo. “Não vamos acabar com o fator de sustentabilidade”, assegurou, esta segunda-feira, a ministra do Trabalho, explicando que esse corte é “decisivo” para a sustentabilidade da Segurança Social.
Ana Mendes Godinho adiantou, questionada pelo bloquista José Soeiro, que, em 2020, excluindo as prestações atribuídas pela Caixa Geral de Aposentações (CGA), 10 mil pessoas foram alvo do corte em questão, que a responsável considera um “instrumento que garante aos jovens que [a Segurança Social] é um sistema intergeracional“. Eliminar o fator de sustentabilidade para todos induziria, acrescentou a governante, “a que todas as pessoas deixassem de trabalhar”. “A esperança média de vida diz que temos de procurar envelhecimento ativo“, atirou ainda.
Esta é uma das nove propostas que o Bloco de Esquerda apresentou no âmbito das negociações orçamentais. Face à posição da ministra do Trabalho, a bloquista Isabel Pires acusou o Governo, na segunda ronda da audição desta segunda-feira, de intransigência sobre um corte que “não faz sentido“. Em reação, o secretário de Estado do Trabalho, Miguel Cabrita, disse não conseguir “entender a acusação de intransigência”, elencando, logo de seguida, as reivindicações do BE a que o Governo já procurou dar resposta, nomeadamente a compensação por cessação de contrato a termo e a regulamentação do trabalho em plataformas digitais.
“Limitar a discussão a um ou dois pontos, quando a negociação foi muito mais abrangente, é redutor face ao trabalho que temos feito em conjunto“, salientou, na mesma linha, a ministra do Trabalho, na sua intervenção final.
A votação na generalidade da proposta de OE para 2022 está marcada para esta quarta-feira, dia 27 de outubro. Tanto o Bloco de Esquerda, como o PCP já anunciaram que irão votar contra, não fechando, contudo, completamente a porta a uma eventual mudança nesse sentido de voto, fruto da negociação. “O Orçamento é o instrumento que nos permite continuar a recuperação. . Parar este esforço é impedir que o país progrida”, avisou a ministra da Segurança Social, esta tarde.
Aos deputados, Ana Mendes Godinho explicou, por outro lado, esta segunda-feira, que já contactou e “pediu desculpas” aos parceiros sociais, por o Governo ter aprovado em Conselho de Ministros medidas no âmbito da Agenda do Trabalho Digno que não tinha sido negociadas em sede de Concertação Social, situação que levou mesmo as confederações patronais a suspenderem a sua participação nessa instituição e a solicitarem uma audiência ao Presidente da República.
Em causa estão o alargamento da compensação para 24 dias por ano em caso de cessação de contrato a termo ou a termo incerto, a reposição dos valores de pagamento das horas extraordinárias em vigor até 2012, a partir das 120 horas anuais e o alargamento do princípio do tratamento mais favorável às situações de teletrabalho e trabalho em plataformas digitais. Um dia antes destas medidas terem sido aprovadas em Conselho de Ministros, o Governo esteve sentado à mesa com os parceiros sociais, mas não apresentou qualquer proposta neste sentido, tendo surpreendido (pela negativa) o patronato.
(Notícia atualizada às 19h33)
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