Guerra deve dar “mais ímpeto à necessidade de deixar gás e petróleo”
O novo relatório do IPCC das Nações Unidas, que será publicado a 4 de abril, "pintará um quadro triste sobre o vício em combustíveis fósseis", dizem especialistas.
Quase duas centenas de países começam a discutir esta segunda-feira a aprovação de um novo relatório sobre diferentes cenários que podem ajudar a limitar o aquecimento global e os seus efeitos devastadores.
Após mais de um século e meio de desenvolvimento económico voltado para os combustíveis fósseis, o mundo ganhou aproximadamente +1,1°C em média em relação à era pré-industrial, multiplicando ondas de calor, secas, tempestades ou inundações devastadoras.
O novo relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas das Nações Unidas, que será publicado no dia 4 de abril, após duas semanas de discussões à porta fechada, “pintará um quadro triste sobre o vício em combustíveis fósseis”, disse Stephen Cornelius, da organização World Wild Fund (WWF), que trabalha como “observador” nas negociações.
Na primeira parte do relatório, publicada em agosto de 2021, o IPCC apontou para a aceleração do aquecimento global, prevendo que o limiar de +1,5°C em relação à era pré-industrial – o objetivo mais ambicioso do acordo de Paris – poderia ser alcançado já perto de 2030.
A segunda parte, finalizada em fevereiro, descrita como “um compêndio do sofrimento humano” pelo chefe da ONU, pintou um quadro mais do que sombrio dos impactos passados, presentes e futuros nas pessoas e nos ecossistemas, enfatizando que retardar a ação reduz as hipóteses de um “futuro habitável”.
A terceira parte abordará as possíveis formas de desacelerar o aquecimento global, dividindo as possibilidades por grandes setores (energia, transporte, indústria, agricultura, etc.), sem esquecer as questões de aceitabilidade social, o papel de tecnologias e o armazenamento de carbono.
“Estamos a falar de uma transformação em grande escala de todos os principais sistemas: energia, transporte, infraestrutura, edifícios, agricultura e alimentos”, disse à agência France Presse (AFP) a economista Céline Guivarch, uma das autoras do relatório.
Acrescentou que, se quisermos alcançar a neutralidade carbónica em 2050, é preciso “iniciar agora” grandes transformações, sublinhando: “nunca é tarde demais para agir” para evitar o pior.
Estas questões, que afetam a própria organização dos modos de vida, de consumo e de produção, correm o risco de suscitar vivas discussões nestas próximas duas semanas em que os 195 Estados vão preparar linha a linha o “resumo para os decisores” das milhares de páginas do relatório científico.
Num contexto ainda mais “inflamável” pela invasão da Ucrânia pela Rússia, Alden Meyer, analista do ‘think tank’ E3G, espera discursos em torno do conflito.
Na frente climática, diz esperar que, “no longo prazo”, esta guerra “dê mais impulso e ímpeto à necessidade de deixar do gás e do petróleo em geral”.
“Este é um relatório crucial publicado num momento crucial em que estados, empresas e investidores estão a recalibrar os seus planos para acelerar a saída rápida dos combustíveis fósseis e a transição para sistemas alimentares sustentáveis e mais resilientes”, disse Kaisa Kosonen, da Greenpeace.
“Agora, mais do que nunca, o IPCC deve fornecer ferramentas concretas e práticas para a humanidade, que está numa encruzilhada”, acrescentou.
Enquanto, segundo a ONU, os atuais compromissos dos Estados, se fossem respeitados, levariam a um aquecimento “catastrófico” de +2,7°C, os signatários do acordo de Paris são chamados a fortalecer as suas ambições de redução das emissões de gases de efeito estufa pela conferência climática da ONU COP27, no Egito, em novembro.
“Sabemos, há muito tempo, o que temos de fazer (…). Os nossos líderes devem tirar-nos dos combustíveis fósseis”, insiste Taryn Fransen, do World Resources Institute.
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