Há 17 mil contribuintes na “lista negra” do Fisco. Devem 3,2 mil milhões
Apesar de em quase três anos terem desaparecido cerca de 20 mil contribuintes da lista de faltosos, o valor em dívida é muito semelhante.
São mais de 17 mil os contribuintes que têm dívidas ao Fisco e que já integram a lista de devedores. Em causa está uma dívida que totaliza 3,2 mil milhões de euros, revelou ao ECO fonte oficial da Autoridade Tributária (AT). A lista continua a revelar a tendência decrescente que se tem vindo a verificar, pelo menos, desde 2016, mas não existem dados referentes ao período de pandemia. Contudo, apesar de em quase três anos terem desaparecido cerca de 20 mil contribuintes da lista de faltosos, o valor em dívida é muito semelhante.
A lista de devedores apresenta todos os contribuintes, pessoas ou empresas, que não têm a sua situação tributária regularizada porque deixaram passar o prazo de pagamento voluntário “sem terem cumprido as suas obrigações” e sem apresentar garantia ou pedir dispensa. A lista foi criada em 2006 pelo então ministro Fernando Teixeira dos Santos e é atualizada diariamente para retirar os contribuintes que, entretanto, cumprem as suas obrigações fiscais. A entrada de contribuintes faltosos é feita mensalmente.
Os dados que a AT avançou ao ECO, referentes a 31 de maio, revelam que há 17.814 contribuintes a integrar a lista de devedores ao Fisco (há uma outra com os devedores à Segurança Social), sendo que 10.496 são pessoas singulares e 7.318 são empresas. O valor global em dívida é maior ao nível dos contribuintes singulares (1,73 mil milhões de euros), mas a diferença face às empresas não é muito significativa (mais 266 milhões de euros).
Os contribuintes, sejam singulares ou coletivos, estão agrupados em seis escalões. A maior parte dos contribuintes singulares têm dívidas entre 7.500 e 25 mil euros — são 2.946 contribuintes –, mas a fatia mais importante é da responsabilidade de 339 pessoas que devem 698,4 milhões de euros, ou seja, 15% do total da lista e 29% das dívidas dos contribuintes singulares.
Este último escalão, que agrega os contribuintes com dívidas superiores a um milhão de euros, tem uma particularidade: dezenas de nomes estrangeiros e um grande dinamismo. Esta quinta-feira o número de contribuintes neste escalão tinha caído para 161.
Por outro lado, ao nível das empresas, o maior número de devedores está concentrado também no primeiro escalão, ou seja, com dívidas entre dez e 15 mil euros (2.805 contribuintes coletivos), mas o nível de incumprimento mais elevado — 426 milhões de euros — é da responsabilidade de 2.223 empresas com dívidas entre 100 mil e 500 mil euros. Muito perto andam as 231 empresas que devem entre um milhão e cinco milhões de euros e que respondem por uma dívida total de 407,7 milhões de euros. A dever mais de cinco milhões de euros só há 21 empresas, responsáveis por 205,21 milhões de euros em incumprimento.
Mais uma vez, num sinal de dinamismo da lista, esta quinta-feira estavam apenas dez empresas neste último escalão: Euroamer, Lin Lines Incorporation, Sociedade de Investimentos Colinas Darge e Yonash. Quatro nomes que já integram a lista pelo menos desde 2019, aos quais se juntam a Círculos & Rotundas Unipessoal, Imócompletissimo – Consultora de Imóveis, Manuel Joaquim Silva Barbosa Sucessores, Manuel Silva Ribeiro e Silva, Proeza de Luxo e Surprisemermaid. Não é possível saber quais os montantes em dívida a título individual.
Para sair da lista é necessário regularizar a situação tributária, seja através do pagamento da dívida em questão ou prestação de garantia. “A eliminação depende, no entanto, da confirmação do pagamento ou da idoneidade da garantia pelos serviços competentes a efetuar em prazo não superior, em média, a uma semana”, explica a AT na página de publicitação da lista. “A invalidade ou insuficiência do meio de pagamento ou da garantia que tiverem sido apresentados implicam a reposição do devedor na respetiva lista até à sua situação tributária ser definitivamente regularizada”, acrescenta a AT.
Apesar de questionada pelo ECO desde maio de 2020 sobre os detalhes da lista de devedores, para avaliar o impacto da pandemia nos níveis de incumprimento, a AT nunca avançou dados e agora diz não ser possível fazê-lo, porque “não guarda imagens da lista, uma vez que a informação divulgada”, feita de acordo com as regras definidas pela Comissão Nacional de Proteção de Dados, “se destina exclusivamente aos fins que determinaram a publicitação, não devendo ser reproduzida ou utilizada para fins diferentes dos previstos nessas normas legais, designadamente para a organização de ficheiros informáticos, incluindo devedores de outro tipo de obrigações”.
Assim, apenas é possível perceber que genericamente o número de devedores tem vindo a cair desde 2016, usando dados compilados a partir da comunicação social, citando as Finanças. Por exemplo, em julho de 2016 havia 38.999 contribuintes, quando em abril de 2018 já eram 30.497 e a 13 de setembro de 2019 eram 28 mil, mas com um nível de dívida muito idêntico ao atual (3,31 mil milhões de euros, tal como o ECO avançou).
Esta descida é, em grande parte, explicada pelo Programa Especial de Redução do Endividamento ao Estado (PERES), uma espécie de perdão fiscal, uma vez que houve um perdão de juros e custas, mas não do valor de imposto por pagar. Esta operação foi fundamental para Portugal cumprir os objetivos do défice em 2016 e sair do Procedimento dos Défices Excessivos. Mas também pela suspensão dos processos de execução fiscal com residência fiscal nos concelhos afetados pelos fogos, como noticiou o Observador.
E apesar de ser expectável que os níveis de incumprimento tivessem disparado durante a pandemia, o Executivo adotou várias medidas que impediram que empresas e contribuintes singulares, mesmo com dívidas, viessem a ser inseridos na lista de devedores. Como, por exemplo, o Executivo ter por diversas vezes prorrogado o diferimento de obrigações fiscais – voltou a fazê-lo no Conselho de Ministros de quinta-feira -, e tacitamente decidir que os impostos em dívida podem ser pagos a prestações, sem terem de ser os contribuintes a pedir a adesão a planos de pagamento, aderindo a partir do momento em que é paga a primeira prestação. Ora quem tem dívidas ao Fisco mas está a pagá-las a prestações não faz parte da lista de devedores. Por outro lado, o prazo para o pagamento de dívidas em processos de execução fiscal passou de três para cinco anos.
Por outro lado, a pandemia também poderá ter condicionado os recursos da AT e, como um devedor só vê o seu nome publicitado na lista depois de notificado e de lhe ser dada oportunidade de contestar (resposta que tem de ser analisada pelos funcionários do Fisco), isso pode ter atrasado a introdução de alguns nomes.
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