The Economist diz que crise dos professores reforçou imagem de “rigor orçamental do Governo”

A unidade de análise económica da revista The Economist defende, em declarações ao ECO, que António Costa fez uma "jogada política" que "reforçou a sua imagem de responsabilidade orçamental".

Para a Economist Intelligence Unit (EIU) a ameaça de demissão do primeiro-ministro, António Costa, na sequência da aprovação na especialidade da contagem integral do tempo de serviço dos professores, foi “uma jogada política”, mas “a opinião pública ficou do lado do PS”. O Governo reforçou com este “conflito” a sua imagem de responsabilidade orçamental e os partidos da direita apenas revelaram “falta de estratégia”, defende a unidade de análise económica da revista britânica The Economist.

Esta foi uma jogada que correu mal quer ao CDS quer ao PSD, o que só torna mais óbvia a dificuldade que os partidos à direita têm em lidar com o sucesso económico e orçamental de um partido de centro-esquerda“, afirma ao ECO, Ana Luís Andrade, a analista da EIU que acompanha a economia nacional.

Questionada sobre os impactos que esta crise política vai ter sobre o desempenho nas urnas, Ana Luís Andrade defende que o recuo dos partidos da direita para fazer depender a contagem dos nove anos, quatro meses e dois dias de condicionantes económicas como o crescimento ou o equilíbrio das contas públicas não é “uma derrota certa da direita, mas apenas um sintoma da falta de estratégia política, que em última análise, provavelmente levará a um pobre resultado eleitoral destes partidos nas próximas legislativas”.

Para a esquerda a leitura é diferente: “Apesar de a ameaça de demissão do Governo também ter sido uma jogada política, a opinião popular ficou do lado do PS”, sublinha Ana Luís Andrade, reforçando que “este episódio foi uma vitória clara para o PS”. Aliás, António Costa viu a sua estratégia ser apoiada esta terça-feira pelo comissário europeu dos Assuntos Económicos. “António Costa teve uma posição sábia e firme. Não temos nenhuma razão para modificar a nossa avaliação sobre a economia portuguesa”, disse Pierre Moscovici, na apresentação das Previsões de Primavera.

Ainda assim, a analista da EIU recusa fazer antecipações para as eleições legislativas. “As tendências de voto atuais não são precisas. Muita coisa pode mudar até outubro”, afirma.

Certo será até lá a instabilidade política. “A instabilidade política permanecerá elevada nos próximos meses, especialmente porque nada está definido“, reitera, sem antecipar aqui ruturas definitivas entre os parceiros da geringonça. “A deterioração das relações entre o PS e os partidos à esquerda é algo que já antecipávamos e para o qual temos vindo a chamar a atenção”, recorda. “É normal que PCP e BE aumentem a pressão ao Governo, e que o seu discurso se radicalize mais, à medida que tentam posicionar-se politicamente para as eleições legislativas”, acrescenta.

No relatório que foi publicado esta segunda-feira sobre Portugal e a que o ECO teve acesso a um pequeno excerto, a unidade de análise económica da revista britânica The Economist sublinha que “a popularidade do PS provavelmente vai ser afetada pela contestação em curso de professores e enfermeiros, assim como pela greve dos camionistas de matérias perigosas em meados de abril. O Governo também está a ser escrutinado por uma série de nomeações de familiares de políticos proeminentes, abrindo a Administração a críticas de nepotismo”, pode ler-se no relatório que refere assim o que ficou conhecido como o familygate.

A EIU sublinha, no mesmo relatório, que “ainda não é certa a posição do PS sobre se quer consolidar a aproximação à esquerda (e assim aumentar a cooperação com o BE e o PCP) ou continuar próximo do centro para conseguir forjar acordos com o PSD de centro-direita, o principal partido da oposição”. Este relatório foi fechado a 20 de abril e por isso ainda não apanha a crise política que teve início na noite de 2 de maio, na reunião da comissão de Educação.

Este aumento de tensões, cristalizado na polémica dos professores, representa apenas um contratempo para os partidos de centro-esquerda que deve ser analisado num contexto pré-eleitoral, e não uma quebra estrutural nas relações”, defende, ao ECO, Ana Luís Andrade. E justifica: “Até porque, como estamos a ver por toda a Europa ocidental, o panorama político está a fragmentar-se cada vez mais e o declínio do sistema bipartidário exige uma maior e mais abrangente cooperação interpartidária”.

Para a analista da EIU é precisamente esta crescente fragmentação e instabilidade política que fazem com que “as reações dos mercados sejam mais moderadas perante eventos como este”. “Episódios como este que vivemos em Portugal nos últimos dias não vão ser suficientes para assustar os investidores ou provocar uma mudança de rating. Em parte, os investidores já estão habituados a Governos mais frágeis e a um ritmo de reforma mais lento”, sublinha, acrescentando que “Espanha é o mais recente exemplo disso”.

A economista desvaloriza o peso orçamental da medida em questão e lembra que a “meta do défice de 2019 não está em risco de incumprimento”. Isto apesar de esta terça-feira a Comissão Europeia defender que Portugal vai ter o dobro do défice previsto por Mário Centeno — 0,4% de défice. “Assumindo o custo total de 800 milhões de euros por ano (professores e outras carreiras) referido pelo Ministério das Finanças, e com base nas nossas projeções económicas, a medida iria provocar uma deterioração no balanço orçamental nos próximos anos, mas nunca poria em causa o cumprimento das regras orçamentais europeias”, precisa, ressalvando contudo que “é difícil dizer quanto é que a reposição integral custaria ao Estado”.

As contas mais recentes, que o ECO avançou na segunda-feira, dão conta de que a recuperação do tempo de serviço dos professores, e o consequente alargamento da medida às restantes carreiras especiais, custaria 560 milhões de euros, além do que já foi aprovado pelo Governo a partir de 2023, 140 milhões de euros por ano se fossem concretizados até ao final da próxima legislatura como prevê o Executivo. Este é o valor bruto, que não tem em conta aquilo que o Estado ganharia com aumento das receitas do IRS, contribuições para a Segurança Social e para a ADSE.

“Apesar da melhoria registada nos últimos anos, a economia portuguesa continua a ser das mais endividadas da zona euro, e não tem capacidade fiscal para acomodar estas e muitas outras exigências“, frisa a economista, que antecipa um crescimento de 1,8% este ano, previsão que se situa entre os 1,7% de Bruxelas e FMI e os 1,9% do Governo. As previsões de Primavera da Comissão Europeia relembram que Portugal tem a terceira dívida mais elevada da União Europeia, abaixo apenas da Grécia e da Itália, e é um dos quatro países que têm uma dívida pública superior a 100% do PIB, um grupo ao qual também se junta a Bélgica.

Para Ana Luís Andrade “este conflito evidenciou aquele que tem sido o maior desafio para o Governo de António Costa, e um tema recorrente nesta legislatura: conciliar a narrativa política do PS, assente no ‘virar a página da austeridade’, com metas orçamentais recorde. No entanto este Governo trouxe efetivamente uma mudança estrutural: criou, e tem vindo a solidificar, o consenso político à volta de uma política orçamental prudente”.

Em jeito de conclusão, a analista da EIU que acompanha a economia nacional, defende que “um dos legados mais importantes deste Governo é a responsabilidade orçamental, o que ficou evidenciado neste conflito”.

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