Nuno Parreira, responsável pela área de dispositivos móveis da Samsung em Portugal, fala sobre o atraso português no 5G e até o impacto da crise dos chips na empresa.
A pandemia foi “uma oportunidade ganha” para a Samsung, garante Nuno Parreira, que lidera a divisão de dispositivos móveis da marca sul-coreana em Portugal. Numa entrevista ao ECO, o responsável explica que os confinamentos pressionaram o mercado numa primeira fase, mas acabaram por impulsionar alguns segmentos, como o dos tablets e dos telemóveis topo de gama.
Nuno Parreira fala ainda sobre o atraso português no 5G. Explica que ainda não é um problema para a marca, apesar de Portugal ter sido pioneiro noutras tecnologias, como o 3G e o 4G. E apela às operadoras, à Anacom e ao Governo para que descomplexem a situação e se foquem no potencial da nova geração de rede móvel.
I. A chegada do 5G
O 5G tarda em chegar a Portugal. Já estamos em maio e continuamos sem tarifários comerciais de quinta geração. De que forma é que isso está afetar a Samsung?
Em Portugal afeta um pouco, porque somos a marca líder no 5G. Portugal é conhecido por ser um país recetivo à inovação e pioneiro. Eu vivi o lançamento da terceira e quarta gerações móveis, onde a Samsung também foi pioneira. E, a nível mundial, a Samsung lançou a primeira rede 5G e o primeiro smartphone há dois anos, em 2019.
Realmente, tem havido alguns atrasos, como é do conhecimento de todos. É um grande desafio que o país enfrenta neste momento e é óbvio que gostaríamos que o 5G já estivesse presente no mercado, pois iríamos, provavelmente, captar essa oportunidade. É uma oportunidade que ainda está um pouco adiada, mas temos vindo já a trabalhar em algumas campanhas de pré-posicionamento de 5G com os operadores.
Neste momento há três países na UE que não têm 5G: Portugal, Lituânia e Malta. Como explica isso à casa-mãe? Quando é que deixa de ser uma mera preocupação e começa a ser um verdadeiro problema?
Já tivemos oportunidade de explicar à casa-mãe. Eu vi Portugal como sendo dos países pioneiros no 3G e 4G. Por isso, a Samsung suportou na altura o mercado e os operadores nessas tecnologias. Neste momento, não vemos isto como um grande problema para nós. Ainda olhamos como uma oportunidade daqui a uns meses. Penso que será um problema maior, provavelmente, para os operadores e para os outros intervenientes no mercado na quinta geração móvel, como também para as nossas empresas e para os nossos consumidores. Mas, neste momento, ainda olhamos para o 5G como uma oportunidade que aí vem.
E quando é que começam a olhar como um problema?
Creio que as coisas se vão resolver. Como se diz, mais para a esquerda ou mais para a direita, as coisas vão-se resolver e penso que estaremos disponíveis no verão para começar a comercializar o 5G. Mas não depende da Samsung. A Samsung está pronta para apoiar o mercado, os consumidores e as empresas para o 5G. Por isso, vamos continuar expectantes.
Qual é a mensagem que deixava aos restantes stakeholders que têm posição de decisão, nomeadamente as operadoras que estão a licitar, a Anacom que está a promover o leilão e o Governo que supervisiona isto tudo?
A mensagem é a de tentarmos descomplexar as situações que possam estar a acontecer e focarmo-nos nos benefícios e na oportunidade que o 5G nos pode vir a trazer no mercado, ainda mais nesta fase de retoma económica. Pediria um maior foco no sentido de se descomplexar e de se tentar descomplicar a situação, no sentido da resolução da mesma o mais rápido possível. É essa a ambição do país, dos consumidores e das nossas empresas.
Penso que estaremos disponíveis no verão para começar a comercializar o 5G. […] Metade do mercado será 5G aquando do lançamento da tecnologia.
Qual vai ser a estratégia da Samsung para o verão, quando já se supõe que haja tarifários comerciais de 5G? Têm campanhas preparadas?
Já começámos [com campanhas] com todos os operadores. Já desenhámos campanhas para pré-posicionarmos o próprio operador e a Samsung como estando prontos para o que aí vem. Temos neste momento uma panóplia de produtos. Cerca de 60% dos nossos produtos são 5G. Estamos completamente ready. Os próprios produtos já estão todos testados também no mercado português, nas redes que já temos neste momento disponíveis para testar, pelo que estamos focados no desenvolvimento de campanhas específicas 5G na altura do lançamento.
Cada operador irá desenvolver as suas campanhas e iremos, como é óbvio, potenciar o portefólio que temos de ecossistema, não só na área de smartphones como tablets, como também de smartwatches. Vamos tentar catapultar essa vantagem competitiva no mercado, lançando inúmeras campanhas e preparando também o Natal, que será de certeza uma altura crucial para a massificação de produtos 5G no mercado português.
Da perceção que tem, os consumidores portugueses já querem telemóveis com 5G para estarem preparados?
Eu diria que sim. É óbvio que ainda não é o segmento mais importante, mas pela adesão que temos vindo a ter na venda de telefones 5G, penso que sim, já se nota essa preocupação e alguma segmentação de clientes. Cerca de 20% das unidades em Portugal são vendidas já com 5G, pelo que um quinto do mercado [português, não exclusivamente da Samsung] já é 5G nas vendas que temos neste momento.
Para um país que ainda não tem o 5G ready, disponível para o consumidor e para as empresas, 20% é um número interessante e é um número natural que está alinhado com os outros países da Europa antes de terem lançado a tecnologia 5G. Pensamos que metade do mercado será 5G aquando do lançamento da tecnologia e, depois, a partir do quarto trimestre, e em 2022, será a tecnologia predominante na venda de terminais e equipamentos em Portugal.
II. A pandemia e a crise dos chips
Qual é o balanço que faz do desempenho da divisão mobile da Samsung em Portugal no ano da pandemia?
Foi de facto um ano muito desafiante. Mas posso dizer que 2020 foi uma oportunidade ganha. Colocou-nos grandes desafios, grandes obstáculos, mas fomos rápidos a reagir à situação de mercado na altura da pandemia e conseguimos captar diversas oportunidades que foram surgindo — muitas relacionadas com o teletrabalho, com a própria educação remota, o que nos permitiu endereçar o mercado com diversos produtos e até com crescimento significativo de algumas categorias em Portugal, nomeadamente a os tablets.
Permitiu-nos também desenvolver uma robustez maior na nossa estratégia e planificação digital, como em todas as outras empresas. Conseguimos avançar cerca de dois a três anos nas nossas capacidades digitais, e foi importante para nós. É aqui uma vantagem competitiva que a Samsung tem, ao ser também uma empresa de tecnologia.
Ao nível de resultados e de quotas de mercado, fechámos o ano realmente em liderança, o ano em crescendo. Crescemos também muito a nossa quota de mercado na categoria de tablets, pelo que o nosso ecossistema funcionou e foi importante também para podermos ajudar a sociedade e a economia a tentar ultrapassar esta pandemia.
Como é que justifica esse crescimento na área dos tablets? Houve até uma altura em que se falava de que era um segmento que estava a morrer…
Foi algo natural. A Samsung também conseguiu captar rapidamente essa tendência. Começámos a registá-la logo no início de abril e, de facto, com a gestão muito fina que temos na nossa cadeia de abastecimento para todo o mundo, e neste caso para Portugal também, conseguimos ser rápidos e ágeis a responder a determinados desafios que o mercado livre nos colocou, como os operadores, como também na parte de B2B (onde a educação foi um dos motes principais e uma das oportunidades que conseguimos captar).
Sendo produtora, a Samsung está a salvo da grande crise mundial dos chips, ou pode ser afetada de alguma forma? Ou já o está a ser?
É conhecido e é público que a Samsung, a par de outro concorrente, veio a mercado sinalizar alguns desses problemas. Nós, como líderes de mercado de semicondutores, temos aqui também uma responsabilidade nessa matéria. E como todos os outros, estamos a sofrer nesta área de mobile, de produtos. Mas é óbvio que a Samsung tem uma panóplia de outros clientes que também servem estes próprios semicondutores e as memórias em questão.
Existe alguma consequência desse shortage. Mas nós, como temos uma cadeia de abastecimento tão bem oleada e somos bastante avançados nessa matéria, estamos a tentar minimizar essas situações. Neste momento, estamos até a captar mais quota de mercado a nível nacional e uma das razões é essa: uma grande vantagem competitiva que nós temos e que outros concorrentes não têm.
O que é que considera que foi mais desafiante num ano que, apesar de ser uma oportunidade ganha, como disse, terá tido os seus constrangimentos também?
Teve constrangimentos mais em questões de equipa, gestão da própria equipa interna. Quer queiramos, quer não, apesar de conseguirmos ter captado algum mercado, o mercado no segundo trimestre de 2020, de abril a junho, afundou de forma veemente. Foi um obstáculo que para nós e veio trazer alguns problemas.
Mas conseguimos dar a volta e conseguimos conquistar maior quota de mercado e lançar vários equipamentos com várias tecnologias, desde novos foldable, novos produtos da categoria A e produtos premium no segmento de tablets. Tudo isso veio dar-nos uma resposta a este desafio imposto pela crise pandémica. Também a par disso foi importante o lançamento de vários produtos compatíveis com 5G, que veio preparar-nos de melhor forma para este ano, apesar de haver este atraso.
[Com a pandemia], conseguimos avançar cerca de dois a três anos nas nossas capacidades digitais, e foi importante para nós.
Os dados preliminares que tive do primeiro trimestre mostram que também terão reforçado as vendas e a quota de mercado em Portugal. Podemos dizer que o setor já está, de certa forma, numa fase de retoma ou ainda não?
Sim, sem dúvida nenhuma. Posso informar em primeira mão que a Samsung teve a melhor semana de vendas na semana passada [25 de abril a 1 de maio], foi a melhor semana de vendas da Samsung em Portugal em 2021 [até então]. O que quer dizer que, apesar de terem havido boas semanas de vendas durante este período ainda final do lockdown, quando o mercado abriu, veio permitir que tivéssemos a melhor semana de vendas e continuamos a ter esta semana [2 a 8 de maio]. A retoma parece estar a acontecer de uma forma natural.
Isso foi fruto do desconfinamento?
Sim, veio do desconfinamento que aconteceu há cerca de duas semanas. Acontece que é um impulso natural do mercado, dado que os shoppings estavam fechados, inclusivamente. Neste momento, o que prevemos é uma retoma forte no terceiro e quarto trimestre em Portugal, que nos vai permitir ter aqui outro tipo de oportunidades. A oportunidade do crescimento do mercado é logo a primeira que queremos captar.
Tem ideia, mais ou menos, de quanto podem crescer este ano no segundo semestre?
O mercado tem vindo a ser impulsionado pelo segmento premium. O segmento premium tem vindo a fazer o drive do mercado. Ou seja, telefones acima dos 1.000 euros estão a crescer cerca de 40-45% e têm de facto estabilizado um pouco o mercado, não o tendo deixado cair. O que esperamos é que esta tendência continue, dado que vamos lançar novos produtos premium e vamos lançar novos produtos 5G. Não só nós, como provavelmente a nossa concorrência. Irá fazer com que o mercado seja impulsionado muito em valor.
Existem cada vez mais telemóveis acima de 1.000 euros num país em que o salário mínimo ronda os 600. Como é que explica isso? Porque é que há esta procura, à luz da conjuntura sócio-económica do país?
Creio que tem muito a ver com as respostas que o smartphone ou um tablet dão ao consumidor final. Aqui, o preço é um pouco relativo. Depende também do que é que podemos fazer com o smartphone. E, de facto, os nossos produtos premium têm vindo a responder a cada vez mais necessidades.
Os tablets com caneta, produtos mais premium, foram os mais vendidos. Ou seja, há aqui uma relação entre o preço e aquilo que o produto faz pelas pessoas. E as pessoas precisam de tecnologia, de produtos tecnologicamente avançados para responderem às necessidades, neste caso em lockdown.
Mas também existem outras necessidades: cada vez mais temos a necessidade de uma boa fotografia; somos cada vez mais obcecados por vídeo; e provavelmente estes produtos vêm colmatar essas necessidades. As pessoas em vez de comprarem outras categorias de produto, depositam cada vez mais confiança em smartphones e tablets e cada vez mais querem os produtos mais avançados do mercado. Para mim essa é a explicação que vemos no mercado.
Acompanhámos no ECO a falência da Phone House em plena pandemia. Na altura, a Samsung não quis comentar. Como é que receberam a notícia?
A Phone House foi um dos nossos primeiros clientes no mercado português. Tivemos sempre muito apreço e colaboração com a marca Phone House e com a empresa. A vida foi assim. Aconteceu. De resto, não temos grandes comentários a fazer. As lojas que estavam em posse da Phone House, o tema já está completamente resolvido. Já estamos com as lojas abertas ao público, que é isso que mais importa e o consumidor já pode desfrutar novamente das nossas lojas e é nossa intenção continuar assim.
III. Os dobráveis
Foram pioneiros nos telemóveis dobráveis. Tardaram a chegar a Portugal, mas entretanto já têm cá a gama Galaxy Z. Há cá mercado para isto? Qual é a dimensão das vendas em Portugal?
Podemos dizer que ainda é um mercado de nicho, pelo facto de os produtos se posicionarem num preço entre os 1.500 e os 2.000 euros. Mas é algo que vem para ficar. A Samsung, como é óbvio, como já aconteceu com a gama Note, há cerca de oito ou nove anos atrás, fixou também aqui uma categoria — e, na altura, era algo de nicho. Provavelmente muitos consumidores não acreditavam, pessoas também do mercado não acreditavam. Mas a Samsung veio responder a uma necessidade, que era um produto com caneta, onde pudéssemos expandir a nossa criatividade. E o Note veio para ficar.
No caso do Foldable, penso que é um pouco o mesmo, respondendo a outras necessidades. De acordo com os estudos que temos, o Foldable vai ser uma categoria muito importante no mercado a nível mundial no futuro e nós queremos posicionarmo-nos como líderes, como os primeiros a avançar nesta categoria. Iremos trazer novos produtos também nesta área, com certeza, durante o ano.
Alguma vez vão deixar de ser um produto de nicho? Acredita que pode ser mainstream?
Penso que sim. Não tenho visibilidade… mas de acordo com os estudos que temos, sim, vai ser um produto que vai deixar de ser de nicho. Cada vez mais vai ser mais fácil a produção, a qualidade dos próprios ecrãs vai ser melhorada, novos formatos irão surgir. Com certeza, o Foldable vai ser uma das categorias mais importantes no segmento de dispositivos móveis. Também para a casa, com tudo o que tem a ver com o exossistema de IoT, os ecrãs dobráveis serão muito importantes.
Consegue dar uma ideia numérica de quantos dobráveis vendem cá em Portugal?
Serão poucos milhares. Poucos milhares em Portugal. Mas são produtos com um preço médio muito elevado e valorizamos muito os clientes que foram os nossos primeiros clientes de produtos de ecrãs dobráveis. Vamos continuar a dar valor a estes clientes, que quiseram apostar nesta nova categoria, em conjunto com a Samsung Galaxy, e irão existir mais produtos.
Assine o ECO Premium
No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.
De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.
Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.
Comentários ({{ total }})
“60% dos produtos da Samsung já são 5G. Estamos completamente ready”
{{ noCommentsLabel }}