"Fiquei contente com o sinal de o ministro da Economia ser o número dois na hierarquia do Governo", diz António Saraiva. Mas para o presidente da CIP isto não significa uma secundarização de Centeno.
António Saraiva considera que, “hoje, os critérios de supervisão e de regulação da banca são tão apertados que a banca deixou de correr riscos”. Em entrevista ao ECO, dias antes de serem retomadas as negociações do Acordo sobre a Competitividade e Rendimentos, o presidente da Confederação Empresarial de Portugal (CIP) sublinha a importância que um banco de fomento tem para os empresários — “um ser humano de risco” –, nomeadamente para colmatar falhas de mercados. “Até agora não a colmatou”, lamenta.
Se a reestruturação das sociedades de garantia mútua, PME investimento e IFD numa única entidade vierem “finalmente colmatar essa falha de mercado, aplaudimos. Mas estamos cansados de promessas”, alerta.
António Saraiva considera que a escolha de Pedro Siza Vieira como número dois do Governo é um sinal no bom sentido. “Deu um sinal de que finalmente o peso da economia era importante”, afirma o patrão dos patrões. Mas isso não significa que “haja uma secundarização de Mário Centeno” ou que a consolidação das contas públicas tenha perdido primazia. “Quero que o país tenha finanças estáveis e que o ministro da Economia seja o ministro das empresas, que isso, sim, temos estado escassos nos últimos governos”, conclui António Saraiva, que garante que ficará à frente dos destinos da CIP apenas até 2023. “Foi essa a exigência”, frisa.
Está preocupado com a “secundarização” do ministro Mário Centeno na estrutura do Executivo? Antecipa-se um tirar do pé do acelerador da consolidação orçamental?
Não acho que haja uma secundarização do ministro Mário Centeno. A sociedade portuguesa é muito fértil em tabus e mitos dessa natureza. Nenhum Governo, de nenhum país, pode ter na saúde das suas finanças a sua estabilidade e o desenvolvimento futuro. Mário Centeno, em termos de hierarquia do Governo, não ficou no lugar que tinha no Governo anterior, mas não deixa de ser o ministro das Finanças e, pelas notícias que vamos sabendo, não deixa de ir bloqueando algumas iniciativas de alguns ministros que, na hierarquia até têm maior peso. Não colocaria a questão pela secundarização.
O Governo tem de funcionar harmónico, em equipa, definindo prioridades para o país, fatiando essas prioridades. E depois, de acordo com a fazenda disponível e com o crescimento que vamos obtendo, repartir e definindo prioridades. Fiquei contente com o sinal de o ministro da Economia ser o número dois na hierarquia do Governo, porque deu um sinal de que finalmente o peso da economia era importante. Agora, que isso represente a secundarização do ministro Mário Centeno, não. Quero é que o país tenha finanças estáveis e que o ministro da Economia seja o ministro das empresas, que isso, sim, temos estado escassos nos últimos governos. Quero que o ministro da Economia seja um verdadeiro ministro das empresas e que ponha os critérios da competitividade mais ao serviço das empresas.
O ministro das Finanças não deixa de ir bloqueando algumas iniciativas de alguns ministros que, na hierarquia até têm maior peso.
Os patrões pediam ao primeiro-ministro mais Siza Vieira e menos Centeno, segundo o Expresso. O ministro Siza Vieira vai ter um papel preponderante neste Governo? E o que é que isso traz de bom para as empresas?
É um ministro de Estado e é o segundo na hierarquia do Governo, por isso espera-se que não seja apenas uma mera sinalização. Que finalmente tenhamos um ministro das empresas. E reconhecendo, como reconheço, no ministro Siza Vieira um conhecimento das empresas e uma competência técnica [espero] que possa pôr essas competências e esse conhecimento ao serviço das empresas.
Como vê a promessa feita por Siza Vieira de um banco promocional nos primeiros 100 dias do Governo?
O país, e os empresários, estão cansados que nos acenarem com o famoso banco de fomento, que depois se designou de Instituição Financeira de Desenvolvimento. Estamos cansados de ter um projeto de banco de fomento. Depois da enorme desalavancagem que a banca fez na economia portuguesa — perto dos 50 mil milhões de euros — e tendo em conta a estrutura débil de capitais próprios, as empresas precisam de mecanismos de financiamento. Ser empresário é correr riscos e o empresário deixou de ter na banca um parceiro de risco, porque passamos a ser uma célula de Excel que acende amarelo, verde ou vermelho.
Hoje os critérios de supervisão e de regulação da banca são tão apertados que a banca deixou de correr riscos. Por isso, o empresário, que é fundamentalmente um empreendedor e um ser humano de risco, não tendo um parceiro de risco na banca tradicional, tem de encontrar novos mecanismos de financiamento. O banco de fomento deveria colmatar esta falha de mercado. Até agora não a colmatou. Se finalmente houver essa reestruturação das sociedades de garantia mútua, PME investimento e IFD nesta entidade que agora nos define e se isto finalmente vem colmatar essa falha de mercado, aplaudimos. Mas estamos cansados de promessas.
Ser empresário é correr riscos e o empresário deixou de ter na banca um parceiro de risco, porque passamos a ser uma célula de Excel que acende amarelo, verde ou vermelho.
Quanto à sua recondução na liderança da CIP. Porque é que decidiu continuar?
Decidi continuar porque tenho uma inquietude cívica que me caracteriza e da qual não me consigo libertar. Decidi continuar porque a esmagadora maioria dos meus colegas me incentivou e solicitou. De facto, gostaria de abraçar desafios profissionais que me foram feitos, gostaria de regressar à família com tempo diferente, tenho cinco netos para os quais gostaria de ter mais tempo. E com a idade que temos, 66 anos, era tempo de olhar para mim.
Mas face à inquietude cívica, ao pedido que a unanimidade praticamente dos meus associados me fizeram e ao perceber que estamos com desafios de uma dimensão que é preciso que a experiência que cada um de nós tem seja colocada ao serviço de uma causa comum como é esta do associativismo empresarial, achei que mais três anos — e foi só isso que aceitei — também não me faria seguramente mal. A minha inquietude cívica falou mais alto que o meu comodismo.
E nesses três anos estará a preparar alguém para o suceder?
Claro que sim. Tomei o testemunho em 2010 e vou largá-lo em 2023. Seguramente que em 2021, 2022 começaremos a encontrar aquele que fará o seu papel enquanto sexto presidente da CIP.
Portanto, não tem a expectativa de continuar para além de 2023, mesmo que os seus colegas voltem a insistir?
Não. Essa foi a exigência que eu coloquei. Dos três novos mandatos a que me poderia candidatar, aceitei com três condições: que só aceitaria fazer mais um mandato de três anos, que o meu sucessor teria de ser encontrado a partir do meio do mandato e que a minha comissão executiva deveria ter competências delegadas em cada um dos vice-presidentes para que o meu trabalho seja mais suave do que tem sido nestes últimos dez anos.
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“Critérios de supervisão são tão apertados que a banca deixou de correr riscos” com as empresas
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