Ministro das Finanças defende esta sexta-feira o Orçamento do Estado no Parlamento. Das previsões económicas e orçamentais às dúvidas das instituições, leia o guia para a audição.
O ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento, vai esta sexta-feira ao Parlamento defender a proposta do Orçamento do Estado para 2026 (OE2026), entregue no passado dia 10 de outubro. Arranca assim formalmente o processo do debate com os deputados, com a apresentação e justificação do Governo da sua estratégia económica e orçamental.
O ECO preparou um guia para a audição na Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública (COFAP) que está marcada para as 10 horas e que antecede a da ministra do Trabalho e Segurança Social, Maria do Rosário Palma Ramalho.
As previsões económicas
O Governo prevê um crescimento da economia portuguesa de 2% este ano e de 2,3% no próximo, depois da taxa de 2,1% registada em 2024. O objetivo de Miranda Sarmento para este ano fica próximo da projeção da generalidade das instituições económicas nacionais e internacionais, enquanto para o próximo ano se revela ligeiramente mais otimista.
Em 2026, o Banco de Portugal e a Comissão Europeia esperam um avanço do PIB de 2,2%, o FMI de 2,1%, a OCDE de 1,9% e o CFP de 1,8%.

Como o ECO explica aqui, o consumo privado tem sido o principal motor do desempenho económico, com as exportações a perderem terreno. Para o próximo ano, contudo, o Governo prevê uma forte aceleração do investimento. No entanto, a procura interna continuará a ser o principal contributo para o acréscimo esperado do Produto Interno Bruto (PIB), já que a procura externa líquida continuará negativa, com as exportações condicionadas pelo contexto internacional.
Para 2026, o Ministério das Finanças prevê uma subida de 2,7% do consumo privado, de 5,5% do investimento, de 1,8% das exportações e de 3,6% das importações.
O Governo projeta ainda que, no conjunto de 2025, a inflação (medida pelo Índice Harmonizado de Preços no Consumidor) se situe em 2,4%, não antecipando um abrandamento significativo dos preços nos próximos meses.
Já para 2026 aponta para um abrandamento para 2,1%, próximo da meta do Banco Central Europeu (BCE). Ademais, conta com o emprego em máximos históricos e taxa de desemprego em mínimos.
As previsões orçamentais
O Ministério das Finanças mantém as previsões de excedente orçamental nas contas públicas, tal como prometido ainda no anterior Executivo de Luís Montenegro. A tutela inscreveu no relatório do OE2026 um excedente de 0,3% do PIB este ano e de 0,1% em 2026.
Com a projeção de um saldo orçamental correspondente a 230 milhões de euros no próximo ano, Joaquim Miranda Sarmento já avisou que “não há propriamente espaço” para integrar medidas da oposição na fase da especialidade — como o aumento permanente de pensões, já defendida pelo Chega e pelo PS.
A estimativa para o próximo ano vai contra a do Banco de Portugal, que aponta para um saldo negativo de 1,3% do PIB, e a do CFP, que antecipa um défice de 0,6% em 2026 e que esta quinta-feira criticou duramente as projeções.
São 2.300 milhões de euros de diferença na projeção do saldo, que a instituição presidida por Nazaré da Costa Cabral atribui em larga medida a uma subestimação da despesa por parte do Governo.
Para controlar as contas, uma das soluções que o Governo poderá utilizar é a não execução da totalidade dos empréstimos do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), embora rejeite este cenário. No que toca à dívida pública, as Finanças prometem continuar a trajetória de redução, prevendo um rácio de 90,2% este ano e de 87,8% no próximo. A concretizar-se será o nível mais baixo desde 2009, ficando pela primeira vez em mais de uma década abaixo do limiar dos 90% do PIB.

A política orçamental expansionista
As principais medidas de política orçamental do Governo previstas para o próximo ano têm um impacto negativo no saldo de 695 milhões de euros, resultado de um aumento de 1.031 milhões de euros do lado da despesa, que ultrapassa o contributo de 336 milhões de euros do lado da receita.
Para a Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO), a política orçamental deverá ser restritiva pró-cíclica este ano, “refletindo uma melhoria do saldo primário estrutural num contexto de deterioração da conjuntura económica”.
Na apreciação preliminar da proposta do OE2026, os técnicos que dão apoio aos deputados estimam que o saldo primário estrutural deverá subir de 2,1% do produto potencial nominal em 2024 para 2,7% em 2025, o que corresponde a uma melhoria do saldo primário estrutural, refletindo uma política orçamental restritiva.
No entanto, caso as previsões do Governo se concretizem, a UTAO aponta para uma política orçamental “expansionista e marginalmente contracíclica” em 2026, refletindo uma “degradação do saldo primário estrutural num contexto de deterioração residual da atividade económica”. Também o Conselho das Finanças Públicas aponta para um “impulso expansionista gerado pelo orçamento nacional”.
As contas negociadas com Bruxelas
O Governo fez um ajustamento nas contas públicas negociadas com a Comissão Europeia, prevendo um aumento mais acentuado da despesa líquida primária (que exclui os encargos com juros, medidas discricionárias e as despesas com subsídios de desemprego) este ano e menor no próximo ano. No entanto, continua a garantir que o Estado irá assegurar o compromisso de médio prazo assumido com Bruxelas no que toca à sustentabilidade das finanças públicas.
Dez dias depois de inscrever no OE a previsão de um crescimento da despesa líquida primária de 4,2% em 2025 e de 5,6% em 2026, o Ministério das Finanças enviou à Comissão Europeia uma nova projeção. Na nova tabela, os valores são revistos para 5,5% este ano e 4,8% em 2026. A meta acordada com a Comissão Europeia é de 5% em 2025 e 5,1% em 2026, contudo os Estados-membros podem incorrer num desvio anual de 0,3 pontos ou de 0,6 pontos no acumulado de 2025 a 2028.
A rigidez da despesa pública
O Governo estima que depois de uma subida do nível da despesa de 42,6% do PIB em 2024 para 43,9% em 2025, o seu peso se reduza para 43,7% em 2026 (embora em termos nominais suba 6.069 milhões de euros). A UTAO alertou que a dinâmica da receita não é suficiente para compensar as pressões ascendentes da despesa, verificando-se “uma estrutura rígida da despesa permanente, particularmente em pensões, que terá tendência a agravar-se nos anos vindouros, considerando a estrutura demográfica nacional”.
Na apreciação do Conselho das Finanças Públicas (CFP), a instituição presidida por Nazaré da Costa Cabral assinala que a diminuição da despesa pública em rácio do PIB é “influenciada por um conjunto de fatores circunstanciais” e, em termos nominais, o aumento previsto “é impulsionado pela despesa corrente primária, aumentando o seu grau de rigidez”. E alerta que quer o crescimento das despesas com prestações sociais, quer com pessoal é superior ao do PIB nominal (4,8%).
A proposta do OE2026 prevê que as despesas com pessoal subam de 10,5% em 2024 para 10,6% do PIB em 2025, rácio que prevê manter no próximo ano, enquanto as prestações sociais representam 18% em 2024 e 2025 e o seu peso acresce 0,1 pontos em 2026.

A solução para o ISP
O Governo não incluiu na proposta do OE2026 nenhuma previsão para a eliminação dos descontos nas taxas de ISP, apesar das recomendações da Comissão Europeia. Miranda Sarmento sinalizou apenas que o processo deverá ser gradual e que o Executivo está a trabalhar numa solução com Bruxelas que não encareça os preços dos combustíveis, que deverá ocorrer em “momentos de redução dos preços, para poder reverter estes descontos”.
Na análise ao Orçamento, o CFP estima que o impacto anual direto do aumento de receita esperada com a atualização integral das taxas de ISP poderia ascender a 873 milhões de euros. A instituição estima ainda que a atualização da taxa de carbono no ano de 2026 levaria a um acrescento na receita fiscal de 47 milhões de euros. A estes montantes somar-se-ia ainda uma receita adicional de IVA, no valor de 212 milhões de euros, decorrente do facto de este imposto ser aplicado a todas as componentes que formam o seu preço.
O investimento e a execução do PRR
O investimento vai crescer 5,5% no próximo ano, à boleia da execução do PRR, que em 2026 entra no ano derradeiro de execução. Para este ano, o crescimento previsto é de 3,6%, um abrandamento face aos 4,2% de 2024. São estas as previsões do Governo no OE2026 e que, na conferência de imprensa de apresentação da proposta de Orçamento, Joaquim Miranda Sarmento disse terem sido construídas sob o pressuposto que os 22,2 mil milhões de euros do PRR “serão executados na totalidade”.
A fatia de leão deste bolo resulta da aceleração prevista para o investimento público. Depois de em 2024, a sua execução se ter situado no nível mais baixo desde 2014, ficando 15,7% aquém do previsto, o Governo defendeu no Orçamento que, ainda assim, o investimento público voltou a ultrapassar nesse ano, e pela primeira vez desde 2011, o consumo de capital fixo – uma aproximação do que podemos considerar o desgaste das infraestruturas e dos equipamentos.
Contudo, argumenta que, até 2024, o stock de capital público em percentagem do PIB “ainda não tinha invertido a tendência descendente” devido aos efeitos dos anos anteriores.
Na proposta do Orçamento, o Governo prevê um crescimento do investimento público de 6,8% em 2026 face a este ano. Deste modo, conta chegar ao final do próximo ano, 10.931 milhões de euros executados, 3.228 milhões de euros dos quais financiados por PRR. Apesar deste aumento nominal, o Executivo fez – como já é tradicional nos executivos das duas cores políticas – uma revisão em baixa de 673 milhões de euros do ponto de partida, ou seja, da execução prevista para 2025 face ao estimado em outubro do ano passado.

O contributo da Segurança Social que já não chega
Instituições económicas como o Conselho das Finanças Públicas têm alertado que os excedentes orçamentais têm sido sustentados sobretudo pelo saldo positivo da Segurança Social, resultado em larga medida do dinamismo no mercado de trabalho. Um cenário que, advertem, coloca o saldo positivo das Administrações Públicas particularmente ‘refém’ de fatores cíclicos.
Mas para o próximo ano, o CFP assinala que a Segurança Social não será suficiente. A instituição alerta que o défice da Administração Central irá agravar-se de 1,7% do PIB em 2025 para 2,2% do PIB em 2026, o que será apenas parcialmente compensado pelo reforço do excedente previsto para os Fundos de Segurança Social (FSS). A outra parte resulta, em menor grau, da Administração Regional e Local.
Em 2024 e 2025, o excedente orçamental dos FSS mais do que compensou, por si só, o défice da Administração Central, mas o mesmo não ocorrerá no próximo ano, sendo necessário contar com o excedente da Administração Regional e Local para manter um excedente das Administrações Públicas, explica a instituição liderada por Nazaré da Costa Cabral, que destaca mais uma vez o aumento da despesa.
A despesa em defesa que ainda não contempla os empréstimos
O Governo ativou a flexibilidade orçamental permitida por Bruxelas para aumentar o investimento em defesa e solicitou a adesão ao programa comunitário de empréstimos a custos mais favoráveis para financiar despesa nesta área. Com o tema a tornar-se uma das prioridades políticas europeias, Portugal comprometeu-se não só a atingir ainda este ano a meta de despesa da NATO de 2% do PIB, como utilizando o conceito mais restrito de Bruxelas aponta para uma despesa de 1,3% do PIB no próximo ano.
No entanto, apesar de prever um aumento das verbas para a defesa, esta despesa estará aquém da necessária para cumprir as metas e o Governo não inscreveu no Orçamento a previsão de execução dos empréstimos comunitários – por o programa ainda estar a ser fechado.
A resposta poderá passar pela utilização da verba à disposição do Ministério das Finanças para despesas imprevistas no valor de 1.200 milhões de euros. O CFP destaca, contudo, que caso seja utilizada, no seu todo ou em parte, para pagar salários, bens e serviços ou investimento terá impacto no saldo orçamental.
A Função pública e a “compressão” salarial
A despesa com salários, promoções e progressões da Administração Pública central vai subir 1,56 mil milhões de euros, no próximo ano, para 24.964,8 milhões de euros, de acordo com o relatório que acompanha a proposta do Orçamento. Saúde e Educação concentram mais de metade dos custos com esta rubrica, segundo o mesmo documento.
Em cima da mesa, está uma atualização salarial da Função Pública em 56,58 euros até vencimentos de cerca de 2.600 euros ou de 2,15% para ordenados superiores. É esta a proposta que foi apresentada aos sindicatos representativos dos funcionários públicos.
O OE2026 cristaliza esse modelo de atualização, não antecipando uma eventual revisão em alta, como reivindicam os sindicatos representativos dos funcionários públicos. Na apreciação preliminar à proposta de Orçamento, a UTAO considera que “este modelo de atualização, por si só, continua a contribuir para a compressão salarial dentro das carreiras de trabalhadores das Administrações Públicas”.
Pelas contas dos peritos que apoiam os deputados da Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública (COFAP), a atualização salarial dos funcionários das Administrações Públicas, que custa 512 milhões de euros, comporta apenas “cerca de um terço do aumento total previsto para a rubrica de despesas com pessoal em 2026″.
Para além disso, as Finanças pretendem congelar o número de trabalhadores do Estado, ao indicar que, para 2026, prevê os mesmos 760,7 mil funcionários que já existem atualmente, a que corresponde uma previsão de despesa de 34.142 milhões de euros. Ou seja, apesar de estimar igual número de trabalhadores do Estado, a despesa vai crescer em 1.644 milhões de euros. Para este incremento no total das despesas com pessoal contribuem os seguintes fatores:
- aumento decorrente das progressões, promoções, que representa um acréscimo de 357 milhões de euros;
- atualização do Rendimento Mínimo Mensal Garantido (RMMG), no valor de 116 milhões de euros;
- aumento resultante do agregado de acordos salariais com carreiras profissionais, promovido pelo Governo, no valor de 262 milhões de euros (cerca de 16% do aumento total);
- e atualização salarial propriamente dita, que comporta um aumento de 512 milhões de euros, ou seja, cerca de 31% do incremento total. Esta atualização salarial será realizada com base no previsto no acordo de rendimentos, ou seja, uma valorização de 56,58€, com um mínimo de 2,15%.

As cativações
Os programas orçamentais dos vários ministérios vão libertar mais verbas no próximo ano. No total, as cativações vão recuar 17,2%, passando de 2,48 mil milhões de euros para 2,05 mil milhões na comparação com o orçamentado para este ano, segundo as contas do ECO com base nos mapas da proposta do OE2026. Isto significa mais 429,43 milhões de fundos que deixam de estar no mealheiro dos vários ministros e são disponibilizados para as várias medidas de política, devido às novas regras que constam da proposta orçamental.
Saúde, Defesa, Infraestruturas e Habitação e Presidência são os programas com mais fundos libertados na comparação com o orçamentado para este ano. Pelo contrário, Educação, Administração Interna e Finanças são as áreas que vão sofrer mais cativações no próximo ano.
Na proposta de OE2026, há novas regras para as cativações: passam a corresponder a 5% da dotação do programa orçamental. Apesar da diminuição do valor das cativações, há programas orçamentais onde se verifica um aumento das retenções.
Do bolo de 2,05 mil milhões de euros de cativações ministeriais sobressaem logo à cabeça os programas da Educação, Administração Interna, Finanças e Encargos Gerais do Estado como aqueles em que se verifica um aumento exponencial das verbas agora postas de parte na comparação com o orçamentado para este ano.
As poupanças com revisão da despesa
O Governo estima poupar 1.201,8 milhões de euros com a identificação ineficiente e ineficaz e a ponderação de opções de poupança na Administração Pública, na saúde e nas finanças. O valor resulta do alargamento do exercício a 9% da despesa pública elegível, correspondendo a 10 mil milhões de euros.
Como o ECO explicou aqui, a revisão da despesa é um exercício orçamental, no qual se analisa de forma detalhada e sistemática a despesa base do Estado, com o objetivo de gerir o nível agregado de despesas, identificar medidas de poupança ou de reafetação de verbas, criando margem orçamental, e melhorar a eficácia dos programas e das políticas.
A orçamentação por programas
O OE2026 introduziu avanços na execução da Lei de Enquadramento Orçamental, entre os quais uma maior abrangência da orçamentação por programas, inscrevendo objetivos, indicadores e metas com o objetivo de uma maior monitorização nos próximos anos. Esta é uma das principais marcas deste Orçamento do Estado, que deixa também cair os denominados “cavaleiros orçamentais” após anos de apelos das instituições económicas, transformando o documento naquilo que deve ser: uma previsão de receita e de tetos de despesa.
Uma transformação que o CFP elogiou. “A proposta de lei do OE para 2026 implica, deste ponto de vista, uma mudança importante que o CFP não pode deixar de enaltecer“, assinala, antes de acrescentar esperar que “seja um passo decisivo para a construção de um sistema orçamental mais maduro, que almeje uma maior racionalidade das decisões orçamentais”.
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