EUA fora do Acordo de Paris: Chefes de Estado indignados e monumentos pintados de verde
Uma decisão "calamitosa" e "contrária à inteligência humana": desde líderes de empresas até autarcas, ninguém ficou indiferente à saída dos EUA do Acordo de Paris.
Donald Trump oficializou a decisão e as reações não tardaram a chegar. A saída dos Estados Unidos do Acordo de Paris para o combate às alterações climáticas, juntando-se à Síria e ao Nicarágua no muito reduzido grupo de países que não se comprometem a reduzir as suas emissões de gases de efeito de estufa nas próximas décadas, revoltou chefes de Estado, dirigentes de empresas, a comunidade científica, e resultou mesmo em monumentos um pouco por todo o mundo iluminados de verde como forma de revolta, da Cidade do México a Paris.
Barack Obama foi um dos primeiros a reagir, com um comunicado quase inédito no qual acusou o seu sucessor Donald Trump de “rejeitar o futuro” ao retirar os EUA do Acordo de Paris, de combate ao aquecimento global. Obama, que teve um papel essencial na negociação do Acordo em 2015, disse que o Governo de Trump se juntou a “um pequeno grupo de nações que rejeitam o futuro”, ao decidir sair do pacto climático subscrito em Paris. Obama acrescentou que tinha a esperança de que as cidades, os Estados e os empresários dos EUA iriam preencher o vazio, ao assumirem a liderança na proteção do clima.
Emmanuel Macron, o recém-eleito presidente francês, reagiu com um vídeo com a duração de três minutos, colocado na sua página no Twitter, em que começa por dizer que as alterações climáticas “já estão a mudar o nosso dia-a-dia” e que “todas as pessoas vão ser afetadas”. “Se não fizermos nada, as nossas crianças vão conhecer um mundo de migrações, de guerras e de escassez. Um mundo perigoso”. O vídeo, em que Emmanuel Macron aparece a falar inglês, termina com o presidente a dizer que “todos nós partilhamos a mesma responsabilidade. Tornar o nosso planeta grande outra vez”.
Tweet from @EmmanuelMacron
Também o primeiro-ministro francês classificou como “calamitosa” a retirada dos Estados Unidos do acordo sobre as alterações climáticas mas mostrou-se convencido de que muitas cidades norte-americanas vão manter ações contra o aquecimento global. “Há um grande número de autarcas dos Estados Unidos que vão continuar a querer a trabalhar connosco” disse hoje Édouard Philippe numa entrevista à estação de rádio RTL. Laurent Fabius, ex-ministro dos Negócios Estrangeiros francês que negociou o Acordo de Paris disse que a retirada dos Estados Unidos é um “grande erro” e uma “falta de vergonha”, numa entrevista ao canal France 2.
Já o governo espanhol, pela voz da ministra da Agricultura, Pesca, Alimentação e Ambiente, defendeu que o Acordo de Paris “não tem volta atrás nem é renegociável”. “A União Europeia vai continuar a liderar [a luta contra as Alterações Climáticas] a nível mundial e Espanha vai estar nesta liderança, abrangendo todas as áreas, a redução de emissões e a ajuda técnica e financeira aos países em vias de desenvolvimento para que possam implementar os compromissos, e o reforço de alianças com parceiros, empresas e com a sociedade no geral”, afirmou Isabel García Tejerina, em conferência de imprensa após reunião do Conselho de Ministros espanhol.
Os chefes de Estado de França, Alemanha e Itália emitiram mesmo um comunicado conjunto acerca da decisão: “Consideramos que o impulso gerado em Paris em dezembro de 2015 é irreversível, e acreditamos firmemente que o Acordo de Paris não pode ser renegociado porque é um instrumento vital para o nosso planeta, as nossas sociedades e as nossas economias”.
O Governo do Japão classificou de “lamentável” o anúncio do Presidente dos Estados Unidos, com o ministro do Ambiente, Koichi Yamamoto, a mostrar-se “dececionado” e “chateado” com o anúncio do Presidente norte-americano. Yamamoto classificou-o de “contrário à inteligência da humanidade”, em conferência de imprensa.
A Rússia também já se pronunciou, referindo que não voltará atrás na sua participação no Acordo de Paris. “Já tomámos a decisão de participar, e não mudaremos de ideias”, disse o vice-primeiro-ministro russo Arkadi Dvorkovitch, citado pela agência noticiosa russa RIA. A China, outra das grandes potências e principais poluidoras, também se chegou à frente. À Agence France Presse, a porta-voz da diplomacia chinesa Hua Chunying disse: “Trata-se de uma responsabilidade que a China toma como grande país responsável, mas responde também às necessidades de desenvolvimento do país”, acrescentando que Pequim se compromete a cumprir as suas obrigações.
Também António Guterres, secretário-geral da ONU, defendeu hoje que a luta contra o aquecimento global não pode parar e apelou aos países para continuarem envolvidos no Acordo de Paris. “As alterações climáticas são inegáveis e uma das maiores ameaças para o mundo atualmente e para o futuro do nosso planeta. Não podemos parar a ação no que diz respeito ao clima e apelo aos países do mundo inteiro que mantenham o foco, que continuem empenhados nos acordos de Paris para benefício de todos nós”, afirmou o secretário-geral da ONU à margem do Fórum Internacional de São Petersburgo, na Rússia.
Dirigentes de empresas não ficam indiferentes
Os CEOs de várias empresas, em especial da área da tecnologia, reagiram rapidamente ao anúncio. Desde Elon Musk, dirigente da Tesla Motors e da Space X, que já tinha ameaçado sair do conselho de Trump se este saísse do acordo de Paris, até Tim Cook, da Apple, passando por Mark Zuckerberg, a revolta não se fez esperar.
Sundar Pichai, CEO da Google, escreveu no Twitter: “Desiludido com esta decisão, a Google vai continuar a trabalhar por um futuro mais limpo e mais próspero para todos”.
Tweet from @sundarpichai
O CEO da Apple, Tim Cook, fez uma declaração pública mas também enviou um email interno aos empregados da empresa, a que o Financial Times teve acesso, em que escreve: “Falei com o Presidente Trump na terça-feira e tentei persuadi-lo de que mantivesse os Estados Unidos no acordo. Mas não foi suficiente. Quero assegurar-vos de que os desenvolvimentos de hoje não terão qualquer impacto nos esforços da Apple para proteger o meio ambiente”.
O fundador do Facebook, Mark Zuckerberg, foi um dos que escreveu que “parar as alterações climáticas é algo que só podemos fazer enquanto comunidade global, agindo antes que seja tarde de mais”, uma declaração próxima da da Microsoft: “Vivemos num pequeno planeta, e todas as nações têm de trabalhar juntas para o proteger”.
Monumentos pintados de verde em revolta
Edifícios nos Estados Unidos e em vários outros países ficaram acesos com luz verde na quinta-feira à noite em reação à decisão da Casa Branca. Em Nova Iorque, o Governador Andrew Cuomo foi citado num comunicado: “A decisão irresponsável da Casa Branca de sair do Acordo de Paris vai ter repercussões devastadoras não só para os Estados Unidos mas para o nosso planeta”.
Tweet from @NYGovCuomo
Até em Washington, a alguns metros da Casa Branca, se iluminou o Wilson Building, um edifício público, com palavras duras da autarca da capital norte-americana. A Cidade do México, Montréal, no Canadá, e Paris, também se juntaram a esta demonstração de solidariedade.
Portugal também já condenou “decisão grave”
O Presidente da República portuguesa defendeu hoje, referindo-se ao homólogo norte-americano Donald Trump, que as alterações climáticas são uma evidência que “se vai impor”, mesmo que haja alguém que “se considere importantíssimo no mundo que negue isso”. Marcelo Rebelo de Sousa, que falava na ilha das Flores, nos Açores, defendeu ainda que a Europa deve unir-se e “continuar a ser uma campeã desta causa”.
“É uma evidência tão óbvia a necessidade de olhar para as alterações climáticas que bem pode haver quem se considere importantíssimo no mundo que negue isso que não altera a realidade. A realidade é o que é. E vai ser o que é, e não para por causa de uma posição isolada, por muito importante que se considere“, declarou.
O ministro do Ambiente, João Matos Fernandes, considerou “uma decisão grave” a saída dos Estados Unidos do acordo climático de Paris, sublinhando que o aquecimento global “é uma questão que nenhum país pode resolver sozinho”. Em declarações à Lusa, o ministro disse que a decisão anunciada pelo Presidente norte-americano, Donald Trump, é negativa para os próprios Estados Unidos, porque “não existe espaço no mundo, mesmo numa economia de grande dimensão como a americana, para imaginar que essa mesma economia pode crescer baseada no carvão”.
(notícia atualizada às 14:31)
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