“Portugal é pequeno.” Startups apelam à união do ecossistema nacional
Na conferência do ECO sobre startups e empreendedorismo, responsáveis de quatro empresas portuguesas apelaram a mais união. Porque "não faz sentido ter vários ecossistemas".
O ecossistema empreendedor português deveria ser mais unificado, pelo menos na ótica de quatro startups que já carimbam o panorama nacional. O ECO promoveu esta sexta-feira a conferência Start Tech – Empreendedorismo e Tecnologia, mas a conversa acabou por tomar um rumo mais alargado, passando pela força de trabalho e pela humanização do serviço prestado aos clientes — afinal, não pode ser só tecnologia.
“É uma falta de foco brutal ter cada ecossistema com a sua agenda, ter cada um o seu trator”, alertou Hugo Oliveira, da Indie Campers, uma plataforma de aluguer de caravanas. Antes, Pedro Lucena, da Yoochai, uma plataforma de pop-up e de retalho, deixava a sugestão de se unificar ramos como a Startup Lisboa, Startup Porto ou Startup Braga e passar tudo a atuar sob a chancela da Startup Portugal, dada a pequena dimensão do país face a outros mercados. Na plateia, João Borga, da Startup Portugal, escutou e registou as sugestões.
“A nossa noção de distância, não quero dizer que é errada, mas é interessante. Noutros países há pessoas a fazerem 300 quilómetros para irem trabalhar. Acho que deveria haver maior integração entre Porto e Lisboa. Ligar Portugal numa unidade, porque Portugal é pequeno, e não faz sentido ter vários ecossistemas”, defendeu Miguel Loureiro, da Uniplaces, a empresa de aluguer de quartos a estudantes.
A Uniplaces é, muitas vezes, dada como exemplo nacional, mas Miguel Loureiro alertou também que, “numa perspetiva de investimento, o complicado para uma VC [venture capital, capital de risco] é entender” os empreendedores que escolhem gerir as operações a partir de território nacional. “Dizer que queremos ter a sede cá em Portugal, para eles, é um bocado complicado. O problema é a burocracia. Não sei se Londres é mais fácil, mas eles já têm o processo todo montado”, referiu.
“Presença offline” é importante
As startups representadas no evento do ECO têm a tecnologia como denominador comum. No entanto, para Joana Lemos, da Freakloset, uma nova plataforma digital de personalização de calçado, destacou que “as pessoas precisam de tocar, ver que a pele é boa e que [o calçado] serve”. Ou seja, a tecnologia desempenha um papel de relevo, mas para criação de brand awareness, “é preciso te presença offline“, “até as pessoas se habituarem a ver a marca”.
Hugo Oliveira, da Indie Campers, falou no mesmo sentido: “Apesar de sermos uma empresa que nos assumimos digital, o nosso foco continua nas pessoas. Queremos que as pessoas nos telefonem. A tecnologia vai a par do serviço ao cliente. Não usamos a tecnologia para nos afastarmos do cliente. A tecnologia serve para acompanhar o cliente na sua experiência connosco. O digital é importante, mas não serve de nada se não houver um lado humano.”
O digital é importante, mas não serve de nada se não houver um lado humano.
Procura de profissionais supera muito a oferta
Outro tema bem presente no primeiro painel da conferência Start Tech foi a questão da falta de mão-de-obra no setor das tecnologias da informação. “Portugal tem engenheiros muito bons. É muito fácil encontrar engenheiros que não trabalham por dinheiro. É muito fácil encontrar profissionais que entram numa empresa para fazer algo e não para ter algo”, afirmou Miguel Loureiro.
O responsável da Uniplaces acrescentou ainda: “Existe amor à camisola e é um bocado diferente do que se vê noutros mercados. Portugal está muito forte nesse sentido, tem qualidade, mas não tem quantidade. Uma empresa tem de ser mesmo atrativa, tem de puxar, tem quase de se vender e não ser o próprio candidato a vender-se.”
Pedro Lucena aproveitou para defender que o que há, na realidade, é falta de disponibilidade dos próprios profissionais, uma vez que a procura supera bem a oferta. “O que sinto é que uma startup, no início de vida, não tem meios para contratar alguém tão bom quanto precisa, porque há outras pessoas a contratar — e bem, ainda que a preços inferiores aos de lá fora”, sinalizou o responsável da Yoochai. “A nossa concorrência são outras startups, empresas nacionais e internacionais”, sublinhou.
A dificuldade nem é só reter [profissionais]. Primeiro, é captar.
Já na Freakloset, ainda não se recruta engenheiros para a equipa, mas trabalha-se com freelancers, “com vários programadores”. “Até agora temos conseguido”, garantiu Joana Lemos, reforçando que o custo só aumenta muito caso haja a necessidade de se proceder a uma “implementação mais específica”. “Em condições normais, é mais acessível”, destacou. A Freakloset ainda não passou à fase de atração de investimento, ainda que já tenha tudo “alguns contactos”. “Estamos neste momento a financiar com o apoio da família e do Portugal 2020”, avançou.
Da parte da Indie Campers, a situação é semelhante. “Temos usado serviços subcontratados, mas agora o objetivo é criar uma equipa que tenha especialização em todas as áreas. É muito difícil, porque são profissionais que é difícil de encontrar. Têm ordenados bastante acima da média. Mas esse salário acima da média reflete que há uma procura bastante superior à oferta. Temos de explicar à pessoa porque é que aquele é o projeto é o projeto certo para ela”, referiu Hugo Oliveira.
“Os programadores falam uma linguagem própria entre eles, também é preciso dar-lhes condições para tal. A dificuldade nem é só reter. Primeiro, é captar. Apesar destes profissionais nos parecerem muito caros, aos olhos de outras grandes empresas até são baratos. Hoje, para alguns profissionais, começa a ser requisito ter dois ou três dias por semana em que se trabalha a partir de casa”, concluiu.
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