Like & Dislike: O advogado que não conhece a lei e o Tribunal que não a fiscaliza
Nesta polémica com o ministro Adjunto, falhou Siza Vieira que não pode invocar o desconhecimento da lei. Mas também falhou o Tribunal Constitucional que não fez o trabalho de fiscalização.
“Quem descobre é sempre a comunicação social e nunca o Tribunal Constitucional”. A frase é do diretor executivo da Associação Transparência e Integridade, esta manhã, no Fórum TSF.
Nesta polémica com Siza Vieira, que durante dois meses acumulou o cargo de ministro Adjunto com o de gerente de uma empresa imobiliária, “quem descobriu” foi uma jornalista do ECO que foi consultar a declaração de rendimentos. Bastou olhar para ela durante dois minutos para perceber que havia um caso de gritante violação à lei.
Não é caso único: ainda esta semana o Observador noticiou que o próprio primeiro-ministro comunicou ao TC fora do prazo legal a compra e a venda de uma casa da rua do Sol ao Rato. Ainda todos se lembram de histórias mais caricatas reveladas pela imprensa, como quando Basílio Horta declarou ao TC que tinha numa conta 5,6 mil euros, em vez dos 5,6 milhões que efetivamente tinha.
Mas porque é que o Constitucional não detetou o caso de Siza Vieira e outros parecidos? Provavelmente porque, como explicava esta manhã João Paulo Batalha, existem neste Tribunal apenas três magistrados para fiscalizar 17 mil pessoas, sendo que destas, “o Tribunal consegue verificar cerca de 1.700 num prazo de quatro anos [que dura uma legislatura], portanto só 10%”.
Estamos a falar de declarações escritas à mão, às vezes pelos próprios, às vezes com gatafunhos pelo meio do gestor de conta ou da secretária, e impossíveis de digitalizar e serem cruzadas com outras bases de dados para deteção de irregularidades.
O TC pode invocar, e com razão, falta de meios. Mas não sai bem na fotografia. Foi ontem “institucionalmente ultrapassado” pelo Ministério Público que resolveu fazer um comunicado onde sublinha que, “por sua iniciativa”, e não pela do Tribunal, requereu a “abertura de vista” para este caso que vai agora investigar. Joana Marques Vidal continua a mostrar trabalho e, quando faltam poucos meses para o fim do mandato, (que já se percebeu que pela vontade do Governo não será renovado) já deixa saudades.
Aqui chegados, qual será o desfecho deste processo? Se não houver história para contar para além daquilo que é hoje público, — tal como manda o ponto 3) do artigo Artigo 112.º da Lei Orgânica do Tribunal Constitucional, — o TC, “se considerar fundada a existência de dúvida sobre a ocorrência de uma situação de incompatibilidade, limitar-se-á a ordenar a sua cessação, fixando prazo para o efeito”.
Neste caso, a questão da ordenação já nem se coloca e não vamos precisar de recorrer ao ponto 4) do mesmo artigo que fala em “perda do mandato ou a demissão de titular de cargo político”. Isto, repito, com base na informação pública que temos hoje. Siza Viera, por sua iniciativa, já não é gerente da referida empresa imobiliária e, como atenuante, tem ainda a seu favor o facto de ter escarrapachado a informação de que era gerente na declaração de interesses que entregou no Tribunal Constitucional. O TC merece um Dislike porque não a fiscalizou e Siza Viera porque, sendo advogado, sabe que ninguém pode invocar o desconhecimento da lei para a violar.
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