Tabelas de IVA de Gaspar ajudam a explicar surpresa nas receitas de Centeno, diz Conselho das Finanças Públicas
Centeno tem contado com receitas inesperadas para baixar o défice. Uma das surpresas vem das receitas fiscais que estão a crescer mais do que o consumo. O CFP ajuda a desvendar o mistério.
Há três anos seguidos que Mário Centeno conta com receitas fiscais inesperadas que são uma ajuda preciosa na altura de baixar o défice. Este fenómeno tem intrigado economistas e especialistas em finanças públicas. Mas o mistério pode estar a caminho de ser resolvido. O Conselho das Finanças Públicas (CFP) estudou o assunto e concluiu que a alteração às tabelas de IVA feita em 2012 por Vítor Gaspar e o aumento do peso do turismo podem estar a beneficiar as receitas fiscais.
Em 2018, dois terços da redução do défice estrutural resultou da diminuição do encargos com juros e o restante um terço é justificado pelo “efeito positivo de receitas inesperadas (revenue windfalls), à semelhança dos dois anos anteriores”, diz a instituição liderada por Nazaré Cabral no relatório sobre a Evolução Orçamental das Administrações Públicas em 2018.
Por receitas inesperadas, o CFP entende o aumento dos dividendos do Banco de Portugal e “os ganhos de receita fiscal que resultam da evolução de alguns impostos acima do crescimento da sua base macroeconómica”.
Numa análise mais detalhada a este último aspeto, o CFP foi ver o que pode ajudar a explicar que a receita de IVA cresça mais do que o consumo privado. Olhando para uma série longa da receita de IVA, o CFP indica que está provado que em períodos de expansão e em fases de recessão, os particulares alteram os seus padrões de consumo.
Em que sentido? “Em fases de crescimento os agentes económicos passariam a adquirir uma proporção cada vez maior de bens taxados à taxa normal [de 23%], ao passo que, em momentos de arrefecimento da economia, os consumidores tenderiam a direcionar uma maior fatia do seu rendimento para a aquisição de bens essenciais, sujeitos a uma taxa reduzida [6%]”, explica a instituição, lembrando que esta conclusão resulta de estudos já feitos antes.
Mas, no momento atual, podem existir outros fatores que ajudam a potenciar aqueles, em que um deles resulta de uma medida de política fiscal adotada em 2012 pelo então ministro das Finanças, Vítor Gaspar. “A alteração das tabelas de IVA ocorrida em 2012, que reduziu o número de bens abrangidos pela taxa intermédia, bem como o aumento do peso da atividade turística na economia, poderão ter elevado o consumo de bens sobre os quais se aplica a taxa normal de IVA, fazendo com que mudanças dos padrões de consumo ao longo do ciclo económico sejam atualmente mais pronunciadas”, admite o CFP. Estas novas conclusões representam um risco para a gestão orçamental, avisa a instituição.
Centeno brilha na UE, mas consolidação abrandou em 2018
O relatório do CFP concluiu ainda que apesar de Portugal estar a cumprir a maior parte das regras europeias para as contas públicas — com exceção da regra do crescimento da despesa pública primária expurgada de medidas temporárias —, a conjuntura económica, os juros e as surpresas na receita estão a explicar os avanços em indicadores como o défice nominal, o défice estrutural e o défice quando descontadas apenas as medidas one-offs.
Este resultado, apesar de continuar a apontar para uma melhoria dos indicadores estruturais, sugere que o progresso de consolidação orçamental tenha desacelerado em 2018.
Esta análise leva o CFP a concluir que há um “abrandamento do processo de consolidação orçamental”. “A variação do saldo primário estrutural (saldo estrutural excluindo a despesa com juros) conjuntamente com a variação do hiato do produto [que mede a diferença entre o produto potencial e o efetivo] permitem aferir a natureza restritiva ou expansionista da política orçamental discricionária. Em 2018, a variação positiva do saldo primário estrutural (0,2 p.p. do PIB) realizada no contexto de melhoria da conjuntura económica (variação positiva do hiato do produto em 0,4 p.p. do PIB potencial) foi inferior em mais de metade à estimada para 2017 (0,5 p.p. do PIB)”, detalha o CFP. “Este resultado, apesar de continuar a apontar para uma melhoria dos indicadores estruturais, sugere que o progresso de consolidação orçamental tenha desacelerado em 2018”.
O relatório contém ainda informação mais detalhada sobre as cativações feitas no ano passado. O ministro das Finanças fechou o Orçamento do Estado de 2018 com cativações efetivas no valor de 486 milhões de euros, o que compara com uma previsão inicial de poupança com cativações de 590 milhões de euros.
“Em termos absolutos, os cativos finais em 2018 ficaram ligeiramente abaixo da média de 523 milhões de euros registada nos anos de 2014, 2015 e 2017 e bastante abaixo dos 1.005 milhões de euros registados em 2016”, diz o CFP.
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