Bancos portugueses atentos à desvalorização do petróleo e do kwanza em Angola
Maiores bancos portugueses em Angola estão atentos à desvalorização da moeda e à queda do petróleo, na sequência do processo de liberalização cambial, que permite converter os lucros em euros.
Os três maiores bancos portugueses com participações em Angola demonstraram-se atentos à desvalorização do kwanza e à queda do preço do petróleo, na sequência do processo de liberalização cambial, que permite converter os lucros em euros.
Na conferência de imprensa de apresentação dos resultados trimestrais da Caixa Geral de Depósitos (CGD), em 13 de maio, o presidente executivo do banco público português, Paulo Macedo louvou o processo de liberalização cambial, referindo que “os movimentos de capitais e o movimento estrangeiro não se consegue sem haver algum tipo de liberalização“, saudando ainda o “programa muito ambicioso de privatizações” de Luanda.
“Ninguém vai investir em Angola se não tiver garantias, para além das questões de segurança, e precisa também de saber que os valores investidos podem ser depois pagos, quer através de dividendos, quer através de repatriamento, e portanto esse passo parece-me que é indispensável”, disse Paulo Macedo, que reconheceu a “grande volatilidade devido à questão cambial”.
A operação da CGD em Angola, através do Banco Caixa Geral Angola (detido em 51% pela Partang, que é detida a 100% pela CGD) contribuiu em quatro milhões de euros para os lucros de 86,2 milhões de euros registados pelo banco público português no primeiro trimestre de 2020.
"Ninguém vai investir em Angola se não tiver garantias, para além das questões de segurança, e precisa também de saber que os valores investidos podem ser depois pagos, quer através de dividendos, quer através de repatriamento, e portanto esse passo parece-me que é indispensável.”
Também Miguel Maya, presidente executivo do BCP, na conferência de imprensa de apresentação dos resultados do banco, em 19 de maio, relevou que “têm vindo a ser implementadas medidas estruturais da maior relevância para a sustentabilidade da economia e para o funcionamento regular das instituições”.
A situação em Angola “está muito afetada pelo preço do petróleo, que está agora a recuperar qualquer coisa mas foi muito marcada”, e que os resultados da operação do BCP em Angola (participação de 22,5% no Banco Millennium Atlântico) “estão muito impactados por isso” (contribuição de 1,4 milhões de euros para os lucros de 35,3 milhões de euros trimestrais).
Assim, segundo Miguel Maya, o BCP está “a acompanhar aquilo que se está a acontecer e com muita regularidade”, mas com a “tranquilidade” de deter apenas 22,5% de um banco, sendo por isso “uma exposição mais limitada, ao contrário de Moçambique”, em que o BCP detém 66% do BIM.
"A situação em Angola “está muito afetada pelo preço do petróleo, que está agora a recuperar qualquer coisa mas foi muito marcada”. O BCP está “a acompanhar aquilo que se está a acontecer e com muita regularidade”, mas com “tranquilidade”.”
Já fonte oficial do BPI, que detém 48,1% do Banco de Fomento Angola, disse à Lusa que “a evolução da situação económica em Angola não envolve surpresas, quer no seu contexto estrutural, quer nos efeitos específicos da pandemia, que afetam a economia global e não podem deixar de se refletir também na realidade angolana”.
“O BFA é um banco forte e muito capitalizado, tem resistido bem à conjuntura adversa e está preparado para enfrentar as dificuldades que se antecipam”, disse a mesma fonte, acrescentando que “desde 2019 a participação do BPI no BFA passou a ser contabilizada como um investimento financeiro”, e que o banco português não participa na gestão do BFA desde 2017.
O BPI, que registou um lucro de 6,6 milhões de euros no primeiro trimestre de 2020 (com uma contribuição negativa de 1,2 milhões de euros do BFA), afirmou ainda que quanto à recomendação do Banco Central Europeu para redução da sua participação no BFA, “não existem desenvolvimentos nessa situação”.
"A evolução da situação económica em Angola não envolve surpresas, quer no seu contexto estrutural, quer nos efeitos específicos da pandemia, que afetam a economia global e não podem deixar de se refletir também na realidade angolana.”
Analistas do setor contactados pela Lusa mostram-se preocupados com a situação económica de Angola, nomeadamente pelo preço do petróleo, e com as perspetivas cambiais e o impacto que isso tem nos bancos portugueses com operações ou ligações ao país.
Segundo Nuno Caetano, da Infinox, a desvalorização do kwanza tem um efeito negativo nos bancos portugueses e mesmo aqueles que consigam melhorar os resultados da operações no país podem ser penalizados na consolidação de contas pela desvalorização da moeda angolana. “Obviamente que é preocupante para os bancos que têm operações em Angola”, afirmou.
Um dos impactos é na dívida que os bancos contratam em dólares ou em euros e que a desvalorização cambial do Kwanza afeta, além de que os mecanismos de proteção cambial se tornam difíceis face ao contexto de volatilidade da moeda. “Acredito que a nível local se tente fazer alguma pressão para que o Governo ou o banco central crie estabilidade”, afirmou.
Já questionado sobre a eventualidade de os bancos tentarem reduzir as operações em Angola, neste contexto, Nuno Caetano admitiu que até pelas imparidades crescentes que os bancos vão ter de criar face à crise desencadeada pela covid-19 alguns bancos poderão decidir alienar participações no exterior e no caso de Angola a divisa pode ser uma condicionante específica que contribua para essa decisão.
Por seu lado, Filipe Garcia, da IMF – Informação de Mercados Financeiros, considera que o principal fator a condicionar as operações dos bancos portugueses em Angola são as perspetivas económicas do país. E se as perspetivas já não eram favoráveis antes de março, estas agravaram-se com a crise desencadeada pela covid-19, que paralisou a atividade económica e penalizou ainda mais os preços do petróleo. Já o câmbio oficial desvalorizou cerca de 20% este ano.
Contudo, considerou, o fator mais estruturante é o preço do petróleo, que condiciona a evolução económica do país. “O que me parece ser mais preocupante para os bancos com ligações e operações em Angola são as perspetivas económicas a médio e longo prazo. Sem preços do petróleo pelo menos ao dobro dos níveis atuas será difícil ver a economia a reacelerar”, afirmou.
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