Anulação da decisão arbitral, que favorece a CML, põe em causa a confiança na arbitragem?
A CML já não é obrigada a pagar, segundo o Tribunal Central Administrativo do Sul que anulou a decisão arbitral. Mas será que esta decisão abala a confiança das empresas na arbitragem?
Quase 140 milhões de euros. Foi este o valor de indemnização que a Câmara Municipal de Lisboa (CML) ficou livre de pagar segundo a decisão do Tribunal Central Administrativo do Sul que anulou a decisão arbitral. O processo em causa diz respeito ao negócio feito com a Bragaparques e que envolve os terrenos do Parque Mayer e da antiga Feira Popular.
Segundo o que o ECO apurou, esse valor de indemnização já estava calculado em apenas 138 milhões de euros, uma vez que a autarquia já tinha aceitado devolver logo no início do processo uma compensação pelo Parque Mayer no valor de 100 milhões de euros. E não os 238 milhões referidos na terça-feira. Ou seja, com a anulação do contrato entre a Bragaparques e a CML, esta última devolveu 100 milhões de euros, ficando em causa apenas 138 milhões de euros na decisão tomada pelo Tribunal Arbitral.
À Advocatus, José Miguel Júdice considera uma “absurdo” que esta decisão ponha em causa a confiança das empresas que recorrem à arbitragem.
“Seria absurdo. É como abandonar o sistema judicial porque decisões são anuladas pelos tribunais superiores“, refere.
Para o ex-sócio e fundador da sociedade de advogados PLMJ, o sistema arbitral, como o sistema judicial, permite a revisão de decisões. “Se estamos perante uma decisão “ultra petita” (ou seja o tribunal terá decidido para além do seu mandato definido pelos pedidos) mesmo sem recurso a decisão poderia ser anulada. Por vezes acontece o contrário: numa arbitragem em que fui nomeado co-árbitro pela parte pública e em que também havia recurso, foi tomada decisão menos favorável ao Estado do que a decisão unânime do tribunal arbitral”, acrescenta.
Paula Velez, advogada na PRA, concorda que “a decisão, ora, tomada, pelo Tribunal Central Administrativo do Sul é demonstrativa do normal funcionamento da justiça, não colocando, em nossa opinião, em causa a arbitragem enquanto meio de resolução alternativa de litígios”, explica em declarações à Advocatus.
Explicando que “à exceção de situações que não cumprem os requisitos legais, as decisões proferidas por um órgão decisor [neste caso o tribunal arbitral] são suscetíveis de recurso para uma instância superior, mormente um Tribunal [neste caso o tribunal administrativo do Sul]. Este é, de resto, um dos corolários do princípio constitucional da tutela jurisdicional efetiva”. conclui a advogada.
Apesar da decisão do Tribunal Central as partes podem voltar a recorrer e usar o mesmo meio de resolução de litígios se assim o entenderem. Entre as alternativas está também a negociação privada e o recurso o Supremo Tribunal Administrativo.
Em causa estava o negócio de troca de terrenos da autarquia na Feira Popular com os imóveis do Parque Mayer detidos pela Bragaparques e das respetivas operações urbanísticas promovidas pela autarquia.
Com esta decisão — num processo conduzido pelos advogados Nuno Ferreira Lousa e Ricardo Guimarães, sócio da Linklaters do lado da Câmara e de Raposo Subtil do lado da Bragaparques –, a CML pode, agora, canalizar esse montante para outras iniciativas, sobretudo num ano de pandemia. De acordo com Fernando Medina, será mesmo isso que vai acontecer: vai arrancar a terceira fase do programa de apoios a fundo perdido às empresas da cidade.
Porém, já a Bragaparques afirmou esta terça-feira que o acórdão do Tribunal Administrativo “não isenta o município do pagamento”, mas ordena a repetição do julgamento.
“A ‘P. Mayer SA’ [empresa da Bragaparques responsável pelo Parque Mayer] vem por este meio desmentir as notícias que estão a ser veiculadas pela comunicação social de que foi anulada a indemnização de 240 milhões de euros a pagar pelo município de Lisboa e de que da mesma não existe possibilidade de recurso”, afirmou, num comunicado, a empresa.
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