Venda do Novo Banco falhou porque FdR não podia aceitar proposta com “risco ilimitado”
José Ramalho, ex-administrador e ex-presidente do Fundo de Resolução, explicou que primeira tentativa de venda falhou porque investidores impunham "risco ilimitado" ao fundo.
As audições do inquérito ao Novo Banco entraram na segunda fase. Depois da fase de resolução, os deputados procuram agora apurar o que falhou na primeira tentativa de venda do banco. Por que razão falhou? “Havia um grande grau de incerteza, que foi a razão principal para terminar com o processo”, referiu José Ramalho, ex-administrador do Fundo de Resolução, que não queria assumir um “risco ilimitado” se tivesse aceitado alguma das propostas que estavam em cima da mesa na altura.
De acordo com José Ramalho, o Fundo de Resolução chegou a negociar com três candidatos, mas os processos “nunca chegaram ao fim”, a tal “razão prática” para o primeiro processo de venda ter falhado.
Ainda assim, todas as ofertas continham cláusulas que representavam um “risco enorme” nos ativos e no capital do banco para o Fundo de Resolução. José Ramalho, sem divulgar detalhes das ofertas devido aos acordos de confidencialidade, explicou genericamente que os investidores queriam que o Fundo de Resolução fosse responsável pelas perdas com uma “grande carteira de ativos” problemáticos e que injetasse dinheiro no banco sempre que necessário para cumprir os rácios.
“Era um salto no escuro”, disse o ex-administrador e presidente do Fundo de Resolução.
José Ramalho adiantou ainda que se tentou negociar com os chineses da Anbang, cuja proposta tinha “um preço interessante” e a ideia era impor limitações nas cláusulas contingentes. “No final de agosto [de 2015] enviámos uma proposta de memorando de entendimento com caps que para nós eram aceitáveis, na linha daquilo que tínhamos estado a negociar anteriormente. Simplesmente não responderam, desapareceram. Esse concorrente desapareceu”, disse.
Sobre esta proposta, João Paulo Correia questionou José Ramalho se os detalhes eram estes: injeção de quatro mil milhões, sendo que o Fundo de Resolução teria de se responsabilizar pelas perdas decorrentes de uma carteira de ativos no valor de 12 mil milhões e teria ainda de recapitalizar o banco caso surgissem necessidades em 18 meses. José Ramalho respondeu ao deputado mas com o microfone desligado por causa da confidencialidade da operação.
Segundo o ex-responsável, a incerteza que pairava sobe o Novo Banco levou ao cancelamento do processo. O objetivo era remover as dúvidas e, a partir daí, gerar maior interesse em torno da instituição.
“A principal incerteza que havia para todos os concorrentes era a génese do Novo Banco e as imparidades que estavam a aparecer e as necessidades de capital”. Nessa medida, o Banco de Portugal avançou no final de 2015 com a retransmissão de obrigações para o BES mau, impondo perdas para credores do banco.
“Achávamos que com isso o problema estava resolvido e podíamos desencadear um processo de venda desanuviado, sem dúvidas a pairar em torno do banco. Dessa forma tínhamos um banco suficientemente limpo, sem incerteza, para lançar o processo”, explicou.
O problema, prosseguiu José Ramalho, é que ao longo 2016, quando se pensava que os resultados do banco iam ser positivos, “surgiram mais imparidades” e as exigências de capital não diminuíam. A venda foi retomada e o banco alienado em outubro de 2017 ao fundo americano Lone Star, que aceitou injetar 1.000 milhões no Novo Banco por 75% do capital da instituição e mediante um acordo de capital contingente de 3,89 mil milhões. “Apesar de tudo, o salto no escuro já estava mais delimitado“, disse José Ramalho. “E aí já não havia alternativa: o banco ou era vendido ou era liquidado”.
Desde 2017, o Fundo de Resolução já injetou três mil milhões no banco, sendo que a instituição pediu na semana passada mais 600 milhões.
José Ramalho deu ainda a explicação ao “mistério” levantado por Mariana Mortágua sobre o salto nas exposições de crédito dos grandes devedores em seis meses, entre as análises da EY e da PwC. “O âmbito dos devedores era diferente. Havia um que avaliava exposições mais a nível individual e outro mais a nível de grupos económicos. O perímetro de cada grupo não era o mesmo”, explicou.
Já no final, José Ramalho disse que “as regras de ajuda de estado obrigam a soluções que podem ser prejudiciais e destruidoras de valor.”
(Notícia atualizada às 20h03)
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