Subutilização do trabalho voltou a subir. Porquê?

Em fevereiro, a população desempregada encolheu, mas a subutilização do trabalho voltou a aumentar, com mais portugueses a "desistirem" de procurar um novo emprego.

A população desempregada emagreceu em pleno confinamento, mas a subutilização do trabalho voltou a aumentar. Os economistas ouvidos pelo ECO sublinham que tal se explica, sobretudo, pelo aumento do número de portugueses que “desistiram” de procurar trabalho, quer por causa dos entraves colocados a essa tarefa pelas restrições impostas para conter a pandemia, quer por reconhecerem que os empregadores estão pouco abertos a novas contratações.

De acordo com a nota divulga, esta segunda-feira, pelo Instituto Nacional de Estatística, em fevereiro, a população desempregada diminui 0,3% face ao mês anterior, enquanto a subutilização do trabalho agravou-se em 0,9% em relação a janeiro do ano passado.

No segundo mês de 2021, havia, assim, 344,2 mil pessoas desempregadas, menos mil que no mês precedente, e 733,5 mil pessoas em subutilização do trabalho, mais 6,7 mil do que no início do ano. Tudo somado, a taxa de desemprego manteve-se estável nos 6,9%, enquanto a taxa de subutilização do trabalho subiu 0,1 pontos percentuais para 13,9%.

Subutilização do trabalho subiu pelo segundo mês consecutivo

Fonte: INE

É importante notar que o conceito de subutilização do trabalho abarca a população desempregada — daí que a evolução desse indicador seja relevante para a leitura dos dados –, mas não só. Inclui também o subemprego dos trabalhadores a tempo parcial, os inativos à procura de emprego mas não disponíveis e os inativos disponíveis mas que não procuram emprego.

E ao contrário do que aconteceu na população desempregada, fevereiro foi sinónimo de crescimento para estes três grupos, o que explica, salientam os economistas ouvidos pelo ECO, o agravamento da subutilização do trabalho, indicador que abrange as “formas de as pessoas se colocarem fora do trabalho do trabalho” que não são incluídas na taxa de desemprego, mas não deixam de “ser o que queremos retratar pelo desemprego”, sublinha José Reis, da Universidade de Coimbra.

Número de inativos voltou a subir em fevereiro

Fonte: INE

Segundo a estimativa do INE, em termos absolutos, o grupo dos inativos disponíveis, mas que não procuram emprego foi o que mais cresceu, no segundo mês do ano, face a janeiro. Em janeiro, havia 211,8 mil pessoas nessa situação. A essas juntaram-se, em fevereiro, 3,5 mil (uma subida de 1,65%), totalizando 215,3 mil pessoas sem emprego, disponíveis para trabalhar, mas que não procuram emprego, ou pelo menos, não cumprem os critérios de procura ativa definidos para fins estatísticos.

Já em termos relativos, foi o grupo dos inativos à procura de emprego, mas não disponíveis o que mais engordou. Em causa esteve um salto de quase 9%, de 30,1 mil pessoas nessa situação, para 32,8 mil pessoas.

Em conversa com o ECO, o economista José Reis explica que estão em causa pessoas que se “deram por derrotadas” face à dificuldade na procura de emprego, isto é, que desistiram de voltar ao ativo sobretudo por causa do próprio mercado, uma vez que Portugal tem hoje muitas “empresas em subatividade” e que, além disso, não estão a “fazer coisas novas”, o que pode inibir as contratações.

Já outro especialista no mercado laboral ouvido pelo ECO, que não quis ser citado, defende que a subutilização do trabalho continua a aumentar porque, face à crise pandémica, “as pessoas não investem tanto na procura de emprego”, nomeadamente por causa do confinamento e das restrições à mobilidade.

No que diz respeito ao subemprego, o aumento foi menos significativo do que aquele registado relativamente aos inativos. Em fevereiro, mais 1,5 mil pessoas encontraram-se nessa situação, o que equivale a um salto de 1,07%. No total, havia 141,2 portugueses em subemprego, no segundo mês de 2021.

A subida da subutilização do emprego tem sido, de resto, uma tendência ao longo da crise pandémica, “escondendo” em certos momentos o impacto da Covid-19 no mercado de trabalho. Isso mesmo explicava, no início do ano, João Cerejeira, da Universidade do Minho, ao ECO. O economista sublinhava que a diminuição da taxa de desemprego registada nos últimos meses de 2021 estava ligada ao aumento da inatividade, ou seja, como menos pessoas estavam à procura de emprego, encolheu o universo de portugueses que podiam ser considerados desempregados.

José Reis salienta, na mesma linha, que os critérios por detrás da taxa de desemprego são “muito estritos” e, por se basearem na procura ativa, deixam de fora muitas pessoas. O economista lembra que o indicador da subutilização do trabalho atingiu máximos no período de austeridade, ocasião “em que a economia portuguesa estava mais desfeita”. Ainda que a situação agora seja diferente, frisa, as dificuldades em arranjar emprego têm resultado também num aumento do indicador em questão.

A nota estatística divulgada, esta segunda-feira, pelo INE, indica, por outro lado, que a população inativa caiu 0,3% em fevereiro, face ao mês a anterior, mas os economistas ouvidos pelo ECO salientam que esse indicador não diz respeito apenas aos inativos que são tidos em conta para a subutilização do trabalho. Abarca também, por exemplo, reformados, estudantes e domésticas. Tal significa que essa quebra não pesa necessariamente sobre a subutilização do trabalho, já que os dados mais finos mostram que foram justamente os inativos os que mais levaram esse indicador voltar a subir.

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