OCDE quer entidade independente a supervisionar advogados, notários e solicitadores
A OCDE insiste na necessidade de diminuir as barreiras à entrada em profissões reguladas, nomeadamente no setor da Justiça, e sugere a criação de uma entidade supervisora independente.
A Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico (OCDE) recomenda a Portugal que crie uma entidade supervisora independente para os profissionais de justiça, como advogados, notários e solicitadores, uma área que diz ter “regulamentação restritiva”. Esta recomendação consta da análise que a OCDE faz à economia portuguesa no relatório “Going for Growth”.
Sugere-se a “criação de uma entidade supervisora independente para garantir que os regulamentos dos profissionais de justiça são do interesse público iria ajudar a implementar reformas para aumentar a eficiência”, escreve a OCDE no relatório divulgado esta quarta-feira, referindo-se a advogados, notários e solicitadores.
Esta recomendação surge na sequência da crítica feita pela organização de que a “baixa produtividade” de Portugal limita a capacidade de convergência no PIB per capita, identificando os mesmos obstáculos que já visava em relatórios anteriores: a regulamentação apertada em alguns setores de serviços, nomeadamente na área da justiça e dos transportes, que criam “barreiras à entrada e impedem o crescimento da produtividade”.
No caso dos profissionais da justiça, a sugestão é que se crie uma entidade supervisora independente para regular o setor, mas a OCDE não dá mais explicações sobre o que pretende mudar em concreto. No mesmo relatório, mais à frente, diz apenas, referindo-se a todas as profissões reguladas, que é preciso reduzir as barreiras de entrada e monitorizar as regras de entrada e o seu preço através de entidades profissionais de forma a “salvaguardar a concorrência”.
A ideia — que já tem sido referida em relatórios anteriores da OCDE — passa por uma liberalização das profissões autorreguladas. Ou seja: diminuir as barreiras de acesso à profissão de advogado, notário ou solicitador, que as respetivas ordens profissionais definem. No caso dos advogados, na prática, pode significar que a multidisciplinaridade passe a ser uma possibilidade nos grandes escritórios de advogados. O que em termos práticos significa que possa haver uma fusão entre auditoras e sociedades de advogados ou apenas a possibilidade de um consultor ou auditor poder ser sócio numa estrutura juntamente com advogados.
Uma hipótese que, aliás, já foi referida nas Grandes Opções do Plano (GOP) 2020-2023, que acompanharam o OE2020, entregue no Parlamento. “O Governo, para assegurar o direito à liberdade de escolha e acesso à profissão, constitucionalmente garantido, irá impedir práticas que limitem ou dificultem o acesso às profissões reguladas, em linha com as recomendações da OCDE e da Autoridade da Concorrência”, lia-se na altura nas GOP. A ideia, porém, foi na altura rejeitada pelo bastonário da Ordem dos Advogados. “Essa ideia é um total absurdo”, explicou Luís Menezes Leitão, em declarações ao ECO, no início do ano.
Já nos transportes, a recomendação da OCDE passa pela renegociação das atuais concessões dos portos para baixar os custos dos utilizadores dos portos portugueses e, assim, aumentar a “competitividade das exportações” português, especialmente para as empresas mais dependentes do transporte marítimo para vender os seus bens ao exterior. Uma recomendação que a organização tem vindo a repetir desde 2017.
PIB per capita nacional 37% abaixo dos países da OCDE com melhor desempenho
Esta é uma das lacunas que a OCDE identifica em Portugal e que limita a sua competitividade. No mesmo relatório, a Organização calcula que o PIB per capita português estava 37% abaixo do dos países com melhor desempenho, antes da pandemia. No caso da produtividade, a diferença é ligeiramente maior (-38%).
O relatório tem como foco a “recuperação vibrante” que a Organização espera ver assim que a pandemia estiver sob controlo, mas a OCDE aproveita também para fazer um ponto de situação pré-Covid ao estado das economias avançadas em diversos indicadores. No caso de Portugal, a imagem não é muito positiva no balanço dos últimos 20 anos.
Um desses indicadores usados pela Organização é o PIB per capita que, no caso de Portugal, tinha recuperado nos últimos anos, face à média da metade dos países da OCDE com maior PIB per capita. Contudo, apesar dessa melhoria, a diferença entre Portugal e esses países continuava a ser maior em 2019 em comparação com o que era na primeira década deste século.
O mesmo se aplica à produtividade que, ao contrário do PIB per capita, registou uma melhoria durante o período da anterior crise. Porém, caiu nos últimos anos e manteve-se abaixo dos valores do início do século quando comparada com os países da OCDE com maior produtividade, tal como mostra o gráfico do relatório.
A análise mostra ainda que, ao contrário do PIB per capita e produtividade, no mercado de trabalho a recuperação foi bem mais expressiva com a taxa de emprego a atingir a média da OCDE e em contínuo crescimento, antes da pandemia. Outros dados também mostram que a taxa de desemprego em Portugal passou a ser mais baixa do que a média da OCDE previamente à Covid-19.
Quanto à desigualdade, a economia portuguesa apresenta um coeficiente de Gini (indicador usado para atestar a desigualdade) ligeiramente superior à média das economias avançadas. Porém, está longe da desigualdade que se verifica nas economias emergentes. Em Portugal, os 20% mais pobres auferem 7,8% do rendimento total da população.
A OCDE analisa também os indicadores ambientais e, neste âmbito, Portugal figura melhor do que a média. As emissões anuais de toneladas de CO2 (dióxido de carbono) per capita em Portugal representam quase metade do valor médio da OCDE. Além isso, menos de um quarto da população português está exposta a níveis nocivos de poluição do ar.
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