Comida com insetos? Já chegou aos animais, mas empresas querem chegar aos humanos
O próximo passo na alimentação é inserir insetos? Algumas empresas portuguesas consideram que sim e focam-se nesta nova forma de alimentação, mas antes de chegarem aos humanos, chegam aos animais.
Aos poucos e poucos a nossa alimentação vai mudando e tendências vão-se criando. O próximo passo? A inserção de insetos na nossa comida – seja direta ou indiretamente – mas até lá chegarmos ainda há um longo caminho a percorrer, quer a nível legal, quer a nível cultural. Algumas empresas portuguesas já se começaram a focar nesta nova forma de alimentação, mas antes de chegarem aos humanos, chegam aos animais.
A legislação e burocracia envolvente impedem as empresas de chegarem aos humanos. Mas nada está perdido, podem vender comida com insetos para a alimentação animal. É o que faz a GotanBug e quer fazer a Entogreen.
A ideia original da GotanBug também era seguir o caminho dos insetos na alimentação humana, e é esse o foco da empresa, contudo “dado o contexto legal atual na Europa e por uma questão de sustentabilidade económica da própria empresa” tiveram de se ficar pela alimentação animal, conta ao ECO Óscar Silva, CEO e fundador da marca. Agora têm o negócio com lojas de animais, para animais exóticos e estão a entrar no ramo das rações para cães e gatos.
É, claramente um nicho de mercado, e a marca tem de momento um volume de negócio que “anda à volta dos 20 mil euros por ano”. Face ao ano passado estão a ter um enorme crescimento pois só em 2021 entraram de forma efetiva no mercado dos animais de estimação e lojas de animas. E Óscar acredita que ainda vão crescer mais este ano pois estão a estabelecer parcerias com várias empresas que fazem rações. Ainda assim, encontram-se num equilíbrio “entre ir desenvolvendo uma indústria e uma fábrica [para produção] e ter produtos para vender”.
Já a Entogreen encontra-se ainda só na primeira fase: criação da fábrica que “ficará concluída em meados do próximo ano”. Nesta marca, o foco será a venda business to business. Contudo, por enquanto encontram-se apenas a construir a fábrica.
Mas esta construção é apenas uma forma de preparação para quando chegar o “Dia D” terem tudo pronto para vender, como explica o CEO e fundador, Rui Nunes. Aliás, visto ser produtos para alimentação animal, estamos a falar de muitas toneladas, ou seja, o que existe de momento é “preparação empresarial”. Resumindo, “é uma empresa que até agora só gastou na produção da sua unidade fabril” e ainda não vendeu.
Para a fábrica a Entogreen teve o apoio do Estado, através do programa Compete 2020, “por outro lado também houve investimento por parte do Banco de Fomento, investimentos privados e os capitais próprios”.
As vendas deverão então começar em 2022, quando a fábrica estiver pronta. Até lá, têm uma pequena produção que usam para fazer os testes necessários. E numa, fase inicial, Rui Nunes admite que os preços não vão ser os mais desejáveis, “só produzindo mais e em maior quantidade é que o preço consegue baixar, portanto temos aqui uma cadeia de valor ainda por criar”.
Mas tanto Rui Nunes como Óscar Silva desejam uma coisa: ver normalizado, nos humanos, este tipo de alimentação em Portugal.
Comer insetos? Dois mil milhões de pessoas já o fazem pelo mundo fora
Já depois da Entogreen, nasceu a Thunder Foods com outro público em mente: nós, humanos. Mas Rui Nunes lembra – e sublinha – que “uma coisa é falarmos de insetos para alimentar animais, outra coisa é para alimentar humanos“. Tudo é diferente: desde o inseto em si à tecnologia usada no processo.
Posto isto, a Thunder Foods, tal como a Entogreen, ainda está em fase de preparação, “é claramente uma startup ainda”, caracteriza o responsável. Mas querem estar preparados para quando houver “carta branca”, quer a nível legal, quer a nível cultural. Isto porque ainda não é possível vender insetos na alimentação humana em Portugal.
Óscar Silva, que tem o sonho de começar a vender para humanos na GotanBug, não considera o entrave legal o mais complicado, mas sim o “desprezo que há pelo setor por parte do Governo e outras entidades legais que deveriam promover esta atividade, mas ficam sempre de arrasto ao que os outros países fazem primeiro”.
"Uma coisa é falarmos de insetos para alimentar animais, outra coisa é para alimentar humanos.”
Também o membro da direção da Thunder Foods sente que a parte legal, mais cedo ou mais tarde, será ultrapassada. “O maior entrave continua a ser a nossa parte cultural“, diz, acrescentando que “os insetos já fizeram parte da nossa alimentação no passado, basta irmos a Bíblia”.
E não só no passado, como lembra o fundador da GotanBug: “A questão de comer insetos não é novo no mundo, 2 mil milhões de pessoas comem insetos, é mesmo uma questão cultural”. E podemos habituar-nos? Segundo Óscar sim, tal como fizemos com o sushi ou até com o café expresso, dois exemplos dados pelo próprio que acredita, vivamente, que “os insetos vão entrar na cultura em Portugal”.
Além do mais, Óscar sublinha que, independentemente da aceitação por parte dos humanos, “há uma questão que é incontornável: a mudança de paradigma alimentar no mundo tem de mudar por questões de sustentabilidade e ecológicas e esta mudança tem de passar por algum lugar”, sendo os insetos uma das possíveis soluções. “Cabe-nos agora desenvolver estratégias de aproximação ao público.”
Posto isto, ambas as empresas preparam-se para o que aí vem. Ambas fazem degustações e provas – pedindo, obviamente, autorização às entidades legais portuguesas – pois é o único modo de chegar ao público por enquanto.
Na Thunder Foods, na última degustação feita na Feira Nacional de Agricultura levaram dois produtos em parceria com duas marcas portuguesas: paté de azeitona com tenebrio molitor (mais conhecido como bicho da farinha) e um pão com 10% de presença do mesmo inseto – o único aprovado na Europa. Mas o objetivo final é produzirem apenas a farinha de inseto e, depois, os seus parceiros criam os seus produtos a partir daí.
Para já, a Thunder Foods não pode iniciar o negócio e a GotanBug tem mesmo de se contentar com a parte animal da empresa. Há ainda um longo caminho a percorrer antes deste tipo de alimentação chegar aos humanos, mas ambos os responsáveis acreditam que não há dúvida: é o futuro!
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