Incerteza vai manter-se até se perceber solução para guerra na Ucrânia, diz AICEP
Luís Castro Henriques sublinha que o "clima de incerteza é algo que já vem de trás": a própria pandemia de Covid-19 "gerou alguma disrupção, sobretudo a nível das cadeias de abastecimento".
O presidente da Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP) considera, em entrevista à Lusa, que o clima de incerteza vai manter-se até se perceber qual a solução no leste da Europa. “Acho que a incerteza, enquanto […] não se perceber bem qual é que é a solução que vamos ter no leste da Europa, ir-se-á manter e isso não é positivo. Até quando? Não sei“, afirma Luís Castro Henriques.
Por isso, “é importante monitorizar o que é que afeta diretamente só Portugal“, mas, “por enquanto, o que eu vejo são fatores que estão a afetar transversalmente toda a Europa”, aponta, referindo que com isto não quer dizer que esteja menos preocupado com o tema. “Numa perspetiva de exportações, que é sempre um jogo relativo, estou a acompanhar esse algo que seja diferenciador em relação a Portugal e, neste momento, felizmente, ainda não” existe, destaca.
Luís Castro Henriques sublinha que o “clima de incerteza é algo que já vem de trás“, aliás, a própria pandemia de Covid-19 “gerou alguma disrupção, sobretudo a nível das cadeias de abastecimento”. Ou seja, “ainda continuamos a ter dificuldades de contentores chegarem a determinados sítios”, mas “está mais regularizado”, embora em alguns pontos do mundo continuem a ter “algumas dificuldades”, admite.
A somar à disrupção, “há coisa de nove meses, seis meses, começou o problema com os preços de energia e agora, mais recentemente, aí sim, mais indexada à guerra, os temas das matérias-primas, sobretudo a agroalimentar”, elenca Luís Castro Henriques.
As empresas portuguesas “já destacam isso há vários meses”, nomeadamente quando os preços da energia “começaram a ter movimentações de dois dígitos”, o que levantou preocupações e “é absolutamente natural”, já que “em alguns setores a energia representa um fator muito, muito relevante do custo total de produção”, sublinha o gestor. Agora, estes setores têm de gerir a sua produção numa perspetiva de “muito mais curto prazo” do que faziam anteriormente.
Nesse sentido, esta “é uma preocupação que a nós nos preocupa”, mas “também é preciso pôr isto numa perspetiva para todos e essa é um bocadinho a mensagem que eu passo e que recebo também das empresas, que é: este é um problema transversal para todas as empresas na Europa, estamos todos no mesmo barco”, enfatiza Luís Castro Henriques.
“Enquanto o problema for simétrico para todos, os ganhos de competitividade que as empresas portuguesas já tinham vão-se manter e isso tem-se visto nas exportações deste primeiro trimestre“, que registaram variações maiores, porque “estamos a ter variações maiores de preço do que estávamos a ter antes, portanto, não só variações de quantidade”, argumenta.
No entanto, “quer queiramos quer não, este clima de incerteza é um clima de maior preocupação do que era claramente há um ano“, admite.
Questionado sobre o interesse no mercado português, Luís Castro Henriques diz que ele se mantém, recordando que “2021 foi um ano absolutamente recorde, tanto em termos de contratualização, como em termos de novos clientes”. Ou seja, “batemos os dois recordes, o que é sempre bom”, salienta.
“E o que nós sentimos é que nos primeiros seis meses do ano, na área de serviços – aliás, para dar uma ideia em termos de procura – estamos 60% acima“, sublinha, alertando, porém, que é preciso ter “cuidado” porque a “procura nem sempre se converte em negócio”. Porém, considera ser “razoável” ter “uma expectativa positiva em relação ao ano na área dos serviços”.
No que respeita à indústria, “também estamos a ter muita procura, mas […] estamos em ano de transição de quadros e, portanto, todos estes na área da indústria normalmente convertem-se em contratos de investimento”, prossegue Luís Castro Henriques, salientando que o número depende do enquadramento dos avisos aos incentivos.
“Sentimos que de facto a procura mantém-se, o interesse mantém-se e à medida que vamos divulgando as oportunidades em Portugal e os casos de sucesso em Portugal, verdade seja dita, a procura cresce“, sublinha o presidente da AICEP, que defende que a escolha do país como destino de investimento é multifatorial.
Questionado sobre que lição tirou da pandemia de Covid-19, Luís Castro Henriques disse que foram “várias”, mas destacou três.
“Primeiro, eu acho que, quando nós olhamos para o mundo global, temos de perceber que as coisas podem mudar muito rapidamente, mas mesmo mudando muito rapidamente há macrotendências que no fundo só são aceleradas, não temos aqui grandes reversões se fomos a ver em termos de comércio global”, explica. Portanto, “a primeira lição é esta: as coisas podem mudar muito rapidamente”, aponta.
O segundo aspeto “é que nós passámos a ter uma preocupação – a AICEP é uma agência que tem 50 delegações pelo mundo fora – e, portanto, toda a gestão que tivemos com a nossa rede, com as pessoas cá, muda muito a ordem de prioridades e de preocupações dos gestores, e eu creio que durante a pandemia isso foi fundamental”. Durante a pandemia a AICEP “nunca parou um dia, nunca fechámos a porta um dia, continuámos a responder às empresas todos os dias”, assevera, apesar de ter mudado, “como toda a gente, para teletrabalho de uma semana para a outra”.
Uma terceira dimensão, “mais de longo prazo”, a qual a pandemia veio a expor um problema que já se antecipava há alguns anos “e que é muito engraçado perceber que os serviços anteciparam isso antes da indústria”, que diz respeito à “necessidade de as cadeias de valor, para além de serem competitivas, também assegurarem o abastecimento“.
Isto implica ter, sobretudo na indústria, “redundância”, ou seja, ter a capacidade, caso haja algo “tão disruptivo como uma pandemia”, de poder dar “resposta com outras áreas ou fábricas ou centros […] que estão fora da pandemia ou estão em ciclos diferentes da pandemia“, explica.
“E isso, a meu ver, vai implicar uma nova perceção em muitas decisões de investimento e vai também implicar uma nova perceção, por exemplo, em rentabilidades de alguns investimentos” e essa “é uma realidade que eu creio que vai plasmar claramente a próxima década”, remata.
Quanto ao seu maior desafio de momento, Luís Castro Henriques aponta angariar o máximo de investimento e fomentar as exportações.
Hannover Messe “é o maior investimento da última década da AICEP” em promoção
A feira Hannover Messe’22 “é o maior investimento da última década da AICEP numa ação de promoção”, afirma, em entrevista à Lusa, o presidente da agência, adiantando que, em termos globais, ronda os quatro milhões de euros. A Hannover Messe’22 decorre na Alemanha, entre 30 de maio e 2 de junho, e será inaugurada pelo chanceler alemão, Olaf Scholz, e o primeiro-ministro português, António Costa.
“Este é o maior investimento da última década da AICEP [Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal] numa ação de promoção“, afirma Luís Castro Henriques, apontando que há “cerca de três milhões de euros de promoção direta na feira”, “através de um pavilhão central”, onde Portugal terá uma zona de conferências “em permanência e uma exposição muito, muito grande, não só de bons produtos, inovadores e tecnológicos portugueses, mas também de boas parcerias entre empresas portuguesas e empresas alemãs”, como também de empresas alemãs com o setor universitário português.
Também “teremos um conjunto de pavilhões satélites espalhados pela feira e, portanto, uma presença, eu diria, por todo o lado”, descreve o presidente da AICEP.
Além disso, “temos também o apoio, aí indireto,” à presença de pequenas e médias empresas (PME) na feira, “em que serão utilizados cerca de mais 1,2 milhões de euros“, detalha o responsável.
Portanto, em números globais, “estamos falar de um investimento de quatro milhões de euros do Estado português”, sintetiza.
Trata-se de “um número muito significativo e em que nós esperamos que o retorno seja na magnitude das centenas de milhões de euros de aumento de exportações, seja depois por via direta, através de compra direta a empresas portuguesas, seja através também de investimento alemão, que é de natureza exportadora, como temos visto nos últimos anos e, portanto, que irá para reexportar a partir de Portugal”, salientou Luís Castro Henriques.
Quanto às expectativas, estas “são muito positivas”, remata, destacando que o facto de Portugal ser “país parceiro deriva de uma escolha do Estado alemão e, portanto, há aqui uma lógica clara do próprio Estado alemão indicar à sua indústria que Portugal é um destino bom para produção industrial, para parcerias e para investimento” e “só isso já é muito positivo”.
Depois, a AICEP “acredita já há vários anos e, aliás, quando se começou esta negociação, estamos plenamente conscientes que as nossas empresas desses setores – estamos a falar de engenharia de precisão, metalomecânica, maquinaria, energia, automação, soluções digitais para a indústria – Portugal tem, de facto, ofertas que são surpreendentes”.
A Hannover Messe’22 é, por isso, “a feira ideal para nós podermos mudar a perceção (…) da indústria intermédia alemã”, isto porque “hoje em dia temos 550 empresas alemãs a operar em Portugal, se formos a ver, todas as grandes empresas alemãs já operam ou produzem ou têm centros de desenvolvimento de software“, ou seja, “já estão cá”.
Portanto, “o que nós queremos é mudar a perceção exatamente das outras que ainda não conhecem” e daí a expressão “com que Portugal vai para a Hannover Messe’22 – ‘Portugal make sense’ [Portugal faz sentido]”, explica. “Estamos completamente conscientes e confiantes que a nossa indústria está preparada para estar na melhor feira do mundo, que tem soluções competitivas para surpreender” no evento “e que consegue ter uma abordagem competitiva para lidar com pares e parceiros alemães”, reforça Luís Castro Henriques.
Aliás, “não há oportunidade de notoriedade maior a nível industrial, seja para a metalomecânica, seja para a maquinaria de precisão, seja para soluções digitais para indústria, seja para software de gestão de indústria integrado na indústria 4.0, seja para novas soluções de energia do que a feira de Hannover“, insiste. A isso acresce que “Portugal ser país parceiro é claramente uma aposta gigante aqui da AICEP e eu estou muito contente com essa aposta”, sublinha o presidente da agência.
Numa altura em que o mundo se encontra a sair da pandemia, “a nossa expectativa é que a larguíssima maioria dos visitantes este ano continuem a ser alemães e europeus (…)”, pelo que o foco “é claramente a Alemanha e depois, obviamente, o resto dos países europeus”, prossegue.
A Hannover Messe divulga “tudo o que acontece na feira a nível global, da China aos Estados Unidos e, portanto, nós também esperamos capitalizar com isso, mas se nos perguntar qual é que o nosso objetivo primordial, é claramente trabalhar a indústria alemã”, sublinha.
Luís Castro Henriques adianta que há um ciclo de conferências “muito, muito grande” na feira. “O pavilhão, a seguir aos eventos institucionais de segunda-feira, vai estar permanentemente a ter seminários onde iremos destacar parcerias já feitas de sucesso”, bem como o acesso ao talento português, as soluções inovadoras desenvolvidas em Portugal, seja em parceria com as empresas alemãs, seja de raiz por empresas portuguesas, “tudo sempre em grande parceria com o sistema universitário”, conta
“Teremos uma série de entidades do sistema universitário, de pesquisa e investigação” que estarão representadas na feira, “creio que a própria escala da nossa presença, toda a atuação, vai de facto conseguir encher a feira de Hannover, o que é um grande desafio”, considera Luís Castro Henriques.
Além da parte de promoção e notoriedade, a feira de Hannover tem também uma componente política.
Luís Castro Henriques recorda que tudo partiu de “um convite do Estado alemão que, na prática, é um reconhecimento da qualidade da indústria portuguesa”.
Mas, salienta, “é também o reconhecimento do bom entendimento de Portugal como parceiro, obviamente país-membro da União Europeia, portanto estamos todos o mesmo mercado, mas não tenhamos a mínima dúvida: é uma sinalização clara para a indústria alemã de que Portugal é um bom destino para investimento, para parcerias, para desenvolvimento de novas soluções e, portanto, como é óbvio, também tem uma componente política grande”.
Aliás, “no primeiro dia da feira, a primeira visita do chanceler alemão será ao pavilhão de Portugal, onde terá um pequeno seminário e onde iremos apresentar exatamente o porquê Portugal e porque é que Portugal faz sentido”, exemplifica o presidente da AICEP.
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