Exclusivo Costa Silva 2.0? Legislatura começa agora na Economia
Com um OE e fundos para executar e novos rostos nas secretarias de Estado, Banco de Fomento ou CMVM, empresários confiam que Costa Silva vai acelerar o passo e trazer “sentido de urgência" à economia.
“Eu, abaixo-assinado, afirmo solenemente, pela minha honra, que cumprirei com lealdade as funções que me são confiadas”. Foi a 30 de março que António José da Costa Silva tomou posse como ministro da Economia e do Mar. Oito meses depois, o “pai do PRR” que António Costa escolheu para suceder a Pedro Siza Vieira, num contexto de maioria absoluta, tem uma segunda oportunidade para causar uma primeira boa impressão, no fundo, para recomeçar a legislatura. Com a entrada de novos protagonistas, os fundos comunitários por executar e as medidas orçamentais que subscreveu, os empresários e gestores contactados pelo ECO acreditam num novo fôlego e pedem “sentido de urgência” para colocar a economia a crescer.
O ministro da Economia tem, desde logo, uma nova equipa no Palácio da Horta Seca. E desta vez escolhida pelo próprio. Ao sair vitorioso de um confronto que transpirou para a praça pública, provocado por divergências internas com João Neves e com Rita Marques — secretários de Estado que tinham transitado da última legislatura e que acabaram demitidos na semana passada –, Costa Silva foi recrutar um novo secretário de Estado da Economia (Pedro Cilínio) ao IAPMEI, organismo que continua num limbo diretivo — o presidente, Francisco Sá, está em regime de substituição desde fevereiro de 2021 –, enquanto a pasta do Turismo, Comércio e Serviços foi assumida pelo até agora deputado socialista Nuno Fazenda.
Pedro Siza Vieira, que tinha ido buscá-los para o Executivo, elogia os agora dispensados por terem estado “atentos às empresas e ligados ao mundo real”, mas admite que “o que funciona bem numa equipa não tem necessariamente de funcionar quando [ela] se altera”, apontando diferentes “hábitos de trabalho, modos de abordagem e formas de relacionamento”. E confirma que não tinha sido Costa Silva a escolhê-la. “[Há] vantagem em ser ele a escolher a composição da sua equipa e em haver uma relação original entre um ministro e os seus secretários de Estado. É uma recomposição que, se calhar, faz sentido”, afirmou no programa Bloco Central, da TSF.
A nossa expectativa é que o sentido de urgência para a mudança da nossa economia possa ganhar espaço nos centros de decisão.
“A nossa expectativa é que com o PRR, a conclusão do PT2020 e a concretização do PT2030, e com as mudanças recentemente ocorridas em importantes organismos públicos e regulatórios – nomeadamente no Ministério da Economia, no Banco Português de Fomento, mas também na CMVM –, o sentido de urgência para a mudança da nossa economia possa ganhar espaço nos centros de decisão”, diz ao ECO o secretário-geral da Associação Business Roundtable Portugal. Pedro Ginjeira do Nascimento, porta-voz desta entidade que junta os 42 maiores grupos empresariais portugueses, prevê que 2023 será “desafiante” para a economia nacional, pelo que “torna-se ainda mais urgente não continuar a atrasar o crescimento do país”.
António Saraiva, presidente da CIP, espera igualmente que “a nova equipa que agora entra no Ministério da Economia concretize os planos anunciados e dê sequência e mais velocidade ao trabalho que estava a ser feito”. O mesmo deve acontecer, sublinha, com a nova liderança do Banco de Fomento, assegurada por Maria Celeste Hagatong (chairwoman) e Ana Carvalho (CEO): “Todos queremos que, desta vez, as decisões tomadas sejam executadas e o dinheiro possa chegar às empresas”, avisa o patrão dos patrões, em declarações ao ECO. Além disso, “o PRR e o Portugal 2030 têm também de chegar finalmente à economia real” e “uma boa execução do OE para 2023 é chave” para evitar que a economia portuguesa entre em recessão.
"Contamos que a nova equipa que agora entra no Ministério da Economia concretize os planos anunciados e dê sequência e mais velocidade ao trabalho que estava a ser feito. O mesmo acontece com a nova liderança do Banco de Fomento – todos queremos que desta vez as decisões tomadas sejam executadas e o dinheiro possa chegar às empresas.”
Apesar de não ter conseguido incluir na proposta orçamental a descida transversal do IRC que chegou a ser negociada com os patrões, o OE2023 traz várias medidas para as empresas, que o Executivo deve começar a aplicar a partir de 1 de janeiro. É o caso do benefício fiscal à subida dos salários, do novo incentivo à capitalização das empresas (ICE), da subida da majoração no regime fiscal de apoio ao investimento (RFAI), do incentivo fiscal à fusão de empresas ou do alargamento do reporte dos prejuízos fiscais, embora mais limitado após uma alteração do PS na especialidade.
Outra missão para Costa Silva, versão 2.0, é fazer com que mais de metade do pacote de apoio às empresas saia efetivamente do papel. É que o Governo anunciou há quase três meses um pacote de 1.400 milhões para as empresas, que visava ajudá-las a enfrentar o aumento dos preços da energia e dos custos de produção, mas algumas das medidas mais emblemáticas ainda não estão no terreno: a linha de crédito de 600 milhões de euros, as duas novas modalidades de apoio no gás natural em que o limite máximo de apoio pode ascender a dois ou cinco milhões de euros – ainda aguardam luz verde de Bruxelas – ou o programa de formação de 100 milhões, alternativo ao lay-off simplificado.
Os novos secretários de Estado não são, de todo, estranhos às áreas onde vão exercer o mandato, e foram escolhidos pelo próprio ministro. Não haverá desculpas para não serem tomadas as medidas necessárias à recuperação da competitividade da economia nacional.
Ainda assim, Francisco Almada Lobo, CEO da Critical Manufacturing, declara ao ECO que “serão necessárias mais do que as medidas pontuais que têm sido tomadas para combate aos efeitos da inflação, ou dos [fundos do] PRR que em grande parte têm ido parar ao setor público”, defendendo “medidas estruturais e [que] permitam aliviar as dificuldades do lado da oferta, sejam elas de competitividade ou simplificação fiscal, laboral e burocrática”. E para este período difícil, sublinha, “a equipa da Economia tem de ser coesa”.
“Independentemente do que foi considerado um bom desempenho dos secretários de Estado cessantes, em especial por terem sido exercidos num período tão difícil, tem de haver um alinhamento total de posições com o ministro que os tutela. Os novos secretários de Estado não são, de todo, estranhos às áreas onde vão exercer o mandato, e foram escolhidos pelo próprio ministro. Não haverá desculpas para não serem tomadas as medidas necessárias à recuperação da competitividade da economia nacional”, resume o líder da fabricante de produtos de software de gestão da produção, automação e analítica, que emprega mais de 300 pessoas na Maia e é detida pela gigante de Singapura ASM.
Após a renovação da equipa é fundamental centrar o foco do Governo e, em particular, do Ministério de economia, no desenvolvimento de projetos estruturantes que alavanquem a economia portuguesa.
Victor Marinheiro, diretor-geral da Molaflex, histórica fabricante de colchões de Santa Maria da Feira, concorda que “após a renovação da equipa é fundamental centrar o foco do Governo e, em particular, do Ministério de Economia, no desenvolvimento de projetos estruturantes que alavanquem a economia portuguesa, centrada nas energias limpas, em exportações de valor acrescentado e ainda no desenvolvimento das competências tecnológicas do país”.
“O que gostaria de ver era estabilidade, quer no Governo, quer nas instituições, e um grande foco no crescimento, que é o que mais falta faz à economia portuguesa. Também gostaria de ver uma reforma fiscal orientado à atração do investimento, nacional e internacional, particularmente na redução do IVA para a construção nova e do IRC para as empresas”, contrapõe Carlos Vasconcellos, founding partner da Albatross-Quantico, holding com participações centradas no imobiliário, como o projeto nos terrenos do antigo estádio das Antas.
Ora, parte significativa dos instrumentos que podem alavancar a transformação económica e este ímpeto reformista — como os apoios à capitalização que têm estado bloqueados –, dependem da nova chefia do Banco de Fomento, que António Costa Silva foi contratar à COSEC para suceder a Beatriz Freitas, outra escolha do seu antecessor. No discurso da tomada de posse, realizada na Porto Business School e que contou com a presença do primeiro-ministro e do ministro da Economia, a antiga administradora do BPI, Celeste Hagatong, deixou seis orientações claras.
- O grande desafio a curto prazo será “responder com sucesso e eficiência à estruturação e distribuição dos instrumentos de apoio à economia, nomeadamente os decorrentes do PRR e do InvestEU”, exigentes em termos de prazos de implementação.
- Continuar a identificar e colmatar as falhas que se verificam no mercado financeiro para dar resposta adequada às empresas.
- Dar prioridade à transferência para o banco da totalidade das atribuições da Agência de Crédito à Exportação, atualmente desenvolvidas em parte pela COSEC. Isto porque “interessa promover” a atividade de seguros de crédito à exportação para países de risco.
- Revisão de todos os procedimentos internos para aumentar a eficiência com que os apoios chegam às empresas, “em especial nos novos produtos a lançar”.
- Colocar o Banco de Fomento no século XXI em termos tecnológicos, o que “obrigará a investimentos significativos a curto prazo nesta área”.
- “Desenvolver os melhores esforços” para que os empréstimos já contratados com o Grupo BEI, com prazos significativamente longos, possam ser canalizados “o mais rapidamente possível” para apoiar empresas.
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