Marcelo promulga lei das Ordens Profissionais até 20 de março
Após o TC considerar que a lei das Ordens Profissionais é constitucional, o diploma passa para as mãos do PR. Marcelo tem 20 dias, desde o momento que tenha recebido o acórdão, para promulgar.
O Tribunal Constitucional (TC) já deu o seu veredicto e considerou que a lei das Associações Públicas Profissionais é constitucional. Agora o diploma passa para as mãos do Presidente da República. Marcelo Rebelo de Sousa tem até 20 de março desde que receba o acórdão do TC, para promulgar o diploma, como já garantiu que o faz. Na segunda-feira, logo após a divulgação pública dessa mesma decisão, o Chefe de Estado foi notificado da mesma.
Segundo o artigo 136.º da Constituição da República Portuguesa, “no prazo de vinte dias contados da receção de qualquer decreto da Assembleia da República para ser promulgado como lei, ou da publicação da decisão do Tribunal Constitucional que não se pronuncie pela inconstitucionalidade de norma dele constante, deve o Presidente da República promulgá-lo ou exercer o direito de veto, solicitando nova apreciação do diploma em mensagem fundamentada”.
Certo é que o chefe de Estado vai promulgar o diploma das ordens profissionais, uma vez que já tornou pública a sua decisão e sublinhou que o faria “imediatamente”. Marcelo Rebelo de Sousa referiu que o seu pedido de fiscalização prévio de constitucionalidade se deveu à mesma razão de sempre: “certeza e segurança”. “Havia 18 ou 19 ordens profissionais que entendiam que o diploma era muito inconstitucional, o Governo entendia o contrário, tal como a maioria da Assembleia da República, nada como o TC clarificar isso”, disse.
Na segunda-feira, dia 27 de fevereiro, o Tribunal Constitucional pronunciou-se pela constitucionalidade sobre a Lei das Ordens Profissionais, que altera o regime jurídico das associações públicas profissionais. Esta decisão foi tomada por unanimidade e por o TC “não considerar desrespeitados” quaisquer princípios ou normas constitucionais. O pedido de fiscalização preventiva tinha sido feito por Marcelo Rebelo de Sousa no dia 1 de fevereiro.
“O Plenário do Tribunal Constitucional pronunciou-se na sessão sobre o pedido de fiscalização preventiva do Presidente da República, que pretende reforçar a salvaguarda do interesse público, a autonomia e a independência da regulação e a promoção do acesso a certas atividades profissionais, introduzindo alterações em diversas normas da Lei n.º 2013, de 10 de janeiro. O Presidente da República fundou o seu pedido na possibilidade de algumas das alterações sofrerem do vício de inconstitucionalidade material, por ofenderem os princípios da igualdade e proporcionalidade, a garantia do exercício de direitos políticos e o princípio da autorregulação das ordens profissionais”, sublinhou o TC em comunicado.
Para o Presidente da República, o decreto da Assembleia da República (AR) suscitava dúvidas relativamente ao “respeito de princípios como os da igualdade e da proporcionalidade, da garantia de exercício de certos direitos, da autorregulação e democraticidade das associações profissionais, todos previstos na Constituição da República Portuguesa”. Desta forma, decidiu pedir a fiscalização ao TC.
A nova lei das Ordens Profissionais vai alterar questões como as condições de acesso às respetivas profissões, introduzir estágios profissionais remunerados e criar uma entidade externa para fiscalizar os profissionais. No texto final foram introduzidas alterações como precisões sobre as taxas cobradas durante o estágio e a possibilidade de serem reduzidas. A duração dos estágios fixou-se em 12 meses, podendo ser maior em casos excecionais. Outra das alterações foi a aprovação da existência de um órgão disciplinar, que não estava previsto na anterior lei-quadro, que prevê a fiscalização sobre a atuação dos membros das ordens profissionais, composto por elementos externos às profissões respetivas. Outra das questões polémicas é a introdução das sociedades multidisciplinares.
Quase todas as Ordens Profissionais se mostraram contra esta proposta que nasceu do PS e do PAN. Segundo dados do Conselho Nacional das Ordens Profissionais (CNOP), existem atualmente em Portugal 20 ordens profissionais, tendo as duas últimas sido criadas em 2019, a Ordem dos Fisioterapeutas e a Ordem das Assistentes Sociais. Estas ordens regulam a atividade de mais de 430 mil profissionais.
Ordens começam a reagir
Uma das ordens que já reagiu à decisão do TC foi a Ordem dos Advogados (OA) que discordou da decisão. A OA referiu ainda que irá analisar a decisão e avaliar quais as melhores medidas a adotar.
“A OA não deixa de manifestar desde já a sua discordância em relação ao referido acórdão do Tribunal Constitucional, na medida em que é nosso entendimento que este diploma legal é atentatório do Estado de Direito, da autorregulação das associações públicas profissionais, bem como da defesa do interesse público”, referem numa publicação do Facebook.
Já bastonário da Ordem dos Médicos (OM), Miguel Guimarães, defendeu que o CNOP deve encontrar “outras alternativas” para contestar a nova lei das ordens profissionais. “Vamos manter, obviamente, esta união, vamos caminhar juntos nessa situação e vamos ter de encontrar outras alternativas para contestar a legislação” que altera a regulação das ordens profissionais, adiantou à agência Lusa o bastonário Miguel Guimarães.
A Ordem dos Médicos “estará atenta” a esta situação, assegurou Miguel Guimarães, ao adiantar que o presidente do CNOP, António Mendonça, “irá seguramente fazer uma reunião brevemente” para decidir os “passos seguintes” sobre esta matéria. “Não vamos obviamente desistir, independentemente da posição que foi tornada pública pelo Tribunal Constitucional”, assegurou o bastonário dos médicos, para quem com a nova lei, ao nível da autorregulação, as “ordens perdem a essência daquilo para que foram criadas”.
A Ordem dos Notários (ON) também anunciou que vai iniciar o processo interno de alteração dos Estatutos. Jorge Batista da Silva, bastonário da ON, sublinha que quer garantir a “defesa do interesse público, intrínseco à função de notário, cuja natureza pública não deve ser colocada em causa”.
“Conhecida a decisão do TC sobre o pedido de fiscalização da constitucionalidade de algumas normas constantes do decreto da AR que altera a legislação relativa às associações profissionais, os notários portugueses darão início a um processo interno de discussão e aprovação de uma proposta de alteração aos estatutos da Ordem dos Notários que seja conforme às alterações à Lei das Associações Públicas Profissionais”, referiram em comunicado.
A Ordem dos Notários sublinha que estão disponíveis para trabalhar com o Governo e com a AR “num novo diploma regulatório que permita a prestação de mais e melhores serviços a cidadãos e empresas” e que garanta “a defesa do interesse público, intrínseco à função de notário, cuja natureza pública não deve ser colocada em causa”, disse Jorge Batista da Silva.
O pontapé de saída desta lei
O projeto de lei relativo às ordens profissionais foi aprovado em votação final global pelo Parlamento no dia 22 de dezembro de 2022, com votos favoráveis de PS, Iniciativa Liberal e PAN, votos contra de PSD, Chega e PCP e abstenções de BE e Livre. Esta aprovação gerou muitas críticas quer por parte dos partidos políticos, como o PSD e PCP, quer pela Ordem dos Advogados.
Apesar deste diploma ter sido aprovado devido à maioria parlamentar PS de António Costa, esta lei surge na sequência de inúmeros alertas da Comissão Europeia e da OCDE. Estes organismos consideravam que em Portugal existiam demasiadas restrições no acesso às atividades profissionais, prejudiciais à atividade económica do país.
Alertas que se intensificaram com o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), que trouxe de novo a questão da desregulamentação das ordens profissionais, incluindo a sua fiscalização por entidades exteriores, também em matéria disciplinar, e o fim do acesso reservado da atividade a profissionais inscritos nas mesmas, como médicos, advogados, engenheiros, economistas, psicólogos, contabilistas, nutricionistas ou arquitetos.
Desta forma, Portugal comprometeu-se junto de Bruxelas que a lei relativa às profissões regulamentadas entraria em vigor até ao quarto trimestre de 2023. É um dos marcos que Portugal tem de cumprir para ter acesso ao terceiro cheque do PRR de 2,4 mil milhões de euros.
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