Certificados de Aforro e do Tesouro rendem mais de 24 milhões por ano aos Correios
Nos últimos cinco anos, o Estado pagou mais de 144 milhões de euros aos CTT para vender Certificados de Aforro e do Tesouro. Só este ano, a fatura ascende a mais de 23 milhões de euros.
Os Certificados de Aforro e os Certificados do Tesouro Poupança e Crescimento (CTPC) não são produtos menores nas contas dos Correios. Desde 2018 que os Correios faturaram cerca de 144 milhões de euros, ou 24 milhões de euros por ano, a vender Certificados de Aforro e Certificados do Tesouro nas suas lojas.
Segundo os relatórios e contas dos CTT – Correios de Portugal, entre 2018 e o primeiro trimestre deste ano, os Correios, atuando como intermediários, ajudaram o Estado a financiar-se em mais de 30 mil milhões de euros junto dos pequenos investidores, através destes títulos de dívida.
Até ao início de 2022, a procura por Certificados de Aforro e Certificados do Tesouro foi influenciada negativamente por um ambiente de taxa de juro negativas, que tornava estes produtos pouco apelativos. Mas, mesmo assim, houve um crescimento paulatino da procura. Porém, nada se compara à dinâmica registada este ano, com a ocorrência de uma autêntica corrida dos pequenos investidores aos Certificados de Aforro.
Segundo os resultados consolidados dos CTT do primeiro trimestre, os Correios contabilizaram mais de 7,5 mil milhões de euros de subscrições entre janeiro e março, que compara com 8,1 mil milhões de euros subscritos durante todo o ano de 2022. “Estes resultados derivam de uma nova conjuntura de taxas de juro que posiciona melhor a dívida pública enquanto alternativa de investimento”, lê-se no comunicado dos CTT.
Apesar das contas dos CTT não separarem as subscrições e as comissões recebidas por tipo de títulos de dívida, é notório o peso dos Certificados de Aforro nestas contas quando analisados com os dados do IGCP: segundo o boletim de maio, entre janeiro e março foram subscritos 9,4 mil milhões de euros de Certificados de Aforro e apenas 33 milhões de euros de CTPC.
Estado quer baixar comissões sobre Certificados de Aforro
As lojas dos Correios são de longe o principal local que os aforradores procura para subscrever Certificados de Aforro e Certificados do Tesouro. Apesar de poderem ser subscritos online, através da plataforma AforroNet, e num dos seis Espaços do Cidadão da AMA, os aforradores ainda preferem deslocar-se aos Correios para aplicarem as suas poupanças.
De acordo com cálculos do ECO, com base nos dados dos CTT e do IGCP, mais de 80% do volume de subscrições de Certificados de Aforro e Certificados do Tesouro dos últimos cinco anos foram realizados nas lojas dos CTT. É quase como se os Correios tivessem o monopólio de títulos de dívida do retalho.
“É sempre do melhor interesse do Estado português trabalhar num enquadramento concorrencial”, referiu Miguel Martín, presidente do IGCP, na audição da Comissão de Orçamento e Finanças de 8 de fevereiro deste ano, sublinhando que “não podemos dizer que, hoje em dia, exista verdadeiramente.”
O cálculo da comissão que o Estado paga aos Correios pela comercialização de Certificados de Aforro e Certificados do Tesouro não foi sempre igual. No relatório e contas de 2019 dos CTT é referido que a remuneração paga pelo IGCP aos CTT “irá diminuir em 2020, variando consoante o volume de vendas.”
Através da concorrência [podemos] controlar melhor os custos anuais que pagamos aos CTT pela distribuição dos Certificados de Aforro.
Se até então era aplicada uma comissão fixa, independentemente do volume de subscrições, desde 2020 que foi aplicada uma estrutura de comissionamento repartida, tendo como fasquia um montante de subscrição de 3 mil milhões de euros:
- 0,585% sobre o montante colocado para valores de subscrição bruta que totalizem, em cada ano de contrato, até 3 mil milhões de euros;
- 0,260% sobre o montante colocado para valores de subscrição bruta que excedam, em cada de contrato, os 3 mil milhões de euros.
Esta mudança não foi particularmente negativa para os CTT. Em 2020, por exemplo, apesar do volume de subscrições ter baixado 2%, o montante amealhado em comissões com estes títulos de dívida aumentou 8,3% face a 2019.
Com a suspensão da Série E e a criação da Série F de Certificados de Aforro a 2 de junho, o Governo alargou os canais de distribuição dos produtos de dívida. Além dos Correios, da plataforma AforroNet e da rede de Espaços do Cidadão, o Governo permite agora que também os bancos comercializem os títulos de dívida para o retalho.
Em comunicado, o Governo explica que esta medida “visa a melhoria da acessibilidade dos produtos de aforro a todos os cidadãos bem como a melhoria da experiência-cliente dos aforradores na subscrição e gestão destes produtos.” No entanto, o Governo espera também que, com mais concorrência, possa reduzir as comissões pagas atualmente pela comercialização dos produtos aos Correios, tal como confirmou Miguel Martín na audição parlamentar de 8 de fevereiro.
“Através da concorrência [podemos] controlar melhor os custos anuais que pagamos aos CTT pela distribuição dos Certificados de Aforro”, referiu o presidente do IGCP no Parlamento. O mesmo desejo foi partilhado recentemente pelas Finanças.
Apesar deste desejo, é difícil antever uma mudança substancial no modelo atual de comercialização dos Certificados de Aforro e Certificados do Tesouro. Além de o próprio IGCP reconhecer que o alargamento da base de comercialização dos títulos de dívida pública para o retalho é ainda “um processo que o IGCP está a iniciar”, também não há muito interesse da banca em vender títulos de dívida pública para o retalho, como reconheceu recentemente o Ministério das Finanças.
Essa falta de interesse por parte dos bancos é percebível. Os Certificados de Aforro e os Certificados do Tesouro são produtos diretamente concorrenciais aos depósitos, e isso ficou bem evidente este início do ano: se entre janeiro e março os bancos perderam mais de 7,7 mil milhões de euros de depósitos, o Estado financiou-se em mais de 9 mil milhões de euros em Certificados de Aforro.
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