Portuguesa BA Glass paga 380 milhões por aquisições no México e Reino Unido

Fabricante de embalagens de vidro atinge pico de vendas de 1.523 milhões e mais que duplica lucros num ano em que voltou às compras no estrangeiro, recuperou rentabilidade e parou linhas de produção.

A compra de uma participação maioritária (60%) na mexicana Vidrio Formas e de 100% da unidade de reciclagem de vidro da Recresco Limited no Reino Unido, as duas últimas aquisições fechadas pela BA Glass, custaram um total de 379,5 milhões de euros. No ano passado, o grupo português registou um novo recorde de vendas consolidadas de 1.523 milhões de euros em 70 países – 6,4% acima do exercício anterior, impulsionadas pelo “efeito preço no primeiro semestre” – e mais do que duplicou os lucros (+115,8%) para 380 milhões de euros.

No ano em que regressou em força às compras internacionais, a maior produtora portuguesa de embalagens de vidro e a quarta maior operadora deste setor a nível mundial garantiu uma posição de controlo que alarga a presença industrial a um novo país (México) e também a um novo continente (americano) a troco de 224,6 milhões de euros. O acordo fechado em novembro e que representa a estreia a produzir fora da Europa prevê ainda um mecanismo opcional que lhe permite “adquirir no futuro as ações não controladas”.

As condições do negócio relativo a esta empresa especializada em garrafas de tequila — fatura 125 milhões de euros e emprega 800 pessoas em dois centros de produção nos arredores da Cidade do México — são reportadas pela primeira vez no mais recente relatório e contas do grupo, consultado pelo ECO. Por outro lado, não são incluídos neste documento os valores envolvidos no acordo com a gigante Canpack para a transferência do negócio das embalagens de vidro na Polónia, por não ter sido concluído até 31 de dezembro.

Já a compra da totalidade da Recresco Limited, instalada no condado de Nottinghamshire e que no ano passado vendeu 80 milhões de euros, foi assinada em definitivo a 20 de dezembro ainda pela anterior CEO Sandra Santos, que em fevereiro deste ano foi substituída no cargo por Tiago Moreira da Silva. A multinacional sediada em Avintes (Vila Nova de Gaia) investiu 154,8 milhões de euros nesta unidade britânica com a qual prevê aumentar em 50% a atual capacidade de reciclagem de vidro, a rondar as 350 mil toneladas por ano.

Reportagem na Fábrica da BA Glass em Avintes - 17JAN24
Fábrica da BA Glass em Avintes, Vila Nova de GaiaRicardo Castelo/ECO

Fundada em 1912 como Barbosa & Almeida, Lda. pelos sócios Raul da Silva Barbosa e Domingos de Almeida, e controlada desde 2004 e em partes iguais pelas famílias Silva Domingues e de Carlos Moreira da Silva — uma divisão que aconteceu na sequência de um MBO ao capital da empresa que pertencia ao universo Sonae —, a BA soma agora 13 fábricas de vidro em oito países, além de cinco unidades de reciclagem. No final de 2023 dava emprego a 4.967 pessoas (vs. 4.012 em 2022) de 15 nacionalidades diferentes. Um em cada quatro trabalha em Portugal.

Além das três unidades industriais em território nacional (Avintes, Marinha Grande e Venda Nova), tem agora três na Polónia (Sieraków, Jedlice e Oszesze), duas em Espanha (León e Villafranca de los Barros), duas no México (Lerma), duas na Bulgária (Sofia e Plovdiv) e uma na Alemanha (Gardelegen), na Grécia (Atenas) e na Roménia (Bucareste). No ano passado produziu mais de 10 mil milhões de embalagens: 33% para comida, 26% para cerveja, 16% para vinho, 15% para refrigerantes e 10% para bebidas espirituosas.

Retoma na rentabilidade e paragem nas fábricas

Após dois anos (2021 e 2022) em que registou uma “queda expressiva na rentabilidade”, com as margens EBITDA a caírem 10,8 pontos percentuais (p.p.) e 12,7 p.p., respetivamente, face a 2020 — a crise energética elevou os custos industriais para “níveis inimagináveis” e até “colocou em perigo a sobrevivência” da empresa, relata –, parte dessas perdas acumuladas foram recuperadas no ano passado. O EBITDA atingiu 533,4 milhões de euros, com uma margem de 35%, 12,5 p.p. acima do ano anterior. Mas ainda abaixo (-0,2 p.p.) do ano que antecedeu o início do disparo nos preços da energia.

Ao nível dos resultados financeiros, por outro lado, a BA Glass reportou perdas de 22,2 milhões de euros, aprofundando o registo negativo de 14,9 milhões no ano anterior. Uma subida justificada “sobretudo com o aumento do custo de capital ocorrido durante 2023 em todos os países como medida de controlo da inflação” (33,2 milhões de euros). Ainda assim, compensados em parte ​​pelo impacto positivo na remuneração de depósitos, igualmente pelo aumento dos juros (4,3 milhões), por efeitos cambiais (6 milhões) e ainda pela reversão de uma provisão relativa à americana Anchor Glass, dois anos após ter vendido a participação de 25% que tinha comprado em 2016 à à private equity CVC.

Subida no lucro e redução na dívida

Fonte: Relatório e contas da BA Glass (2023)

No relatório e contas, o grupo nortenho descreve ainda como no ano passado houve um travão brusco na procura por parte dos clientes, que forçou-a mesmo a tomar a “difícil decisão” de parar parcialmente a produção para gerir os níveis de stocks. “As nossas operações em 2023 foram comprometidas pela necessidade de paralisar linhas de produção, uma medida inédita na história recente da BA, nem sequer tomada durante a pandemia. Esta decisão foi tomada no último trimestre do ano, com paragens executadas com precisão, permitindo a rápida retoma de algumas linhas”, expõe.

“Mesmo num ano exigente”, refere no mesmo documento que realizou o maior investimento de sempre, com 203 milhões de euros, 68% acima de 2022 e equivalente a 13% da faturação. “Num ano com menor volume de vendas foi desafiante manter os planos de investimento, mas os nossos compromissos ambientais e para a digitalização das operações prevaleceram”, refere. Destaque para o novo forno na fábrica da Roménia e para a requalificação de outro na Bulgária, e ainda para o início da construção de um armazém em Bucareste para otimizar a logística e apoiar as operações locais.

Reportagem na Fábrica da BA Glass em Avintes - 17JAN24
Forno da fábrica da BA Glass em Avintes, Vila Nova de GaiaRicardo Castelo/ECO

Apesar dos “desafios operacionais”, o grupo industrial disse ter introduzido 56 novos produtos no mercado. 20% dos quais abrangidos já pelo programa interno que visa reduzir a quantidade de vidro usado nas garrafas e nos frascos, com o qual contabiliza ter evitado só em 2023 a emissão de 1.000 toneladas de CO2. No entanto, salienta que a taxa de sucesso dos novos projetos (27%) foi “afetada por um time-to-market mais extenso e pelo abrandamento da procura”.

Paulo Azevedo justifica “sucessão interna”

No relatório anual, o chairman Paulo Azevedo dirige uma mensagem a Sandra Santos, gestora que liderou a BA Glass nos últimos dez anos. “A medida final do sucesso de um CEO é sempre o estado em que deixa a empresa e as condições para o sucesso futuro. A este respeito, gostaria de destacar as aquisições recentes que constituem uma base muito importante para o crescimento geográfico futuro [México], reforçam uma das nossas principais regiões [Polónia] e fortalecem a nossa liderança na sustentabilidade [reciclagem no Reino Unido]. Igualmente importante foi o trabalho que fez no desenvolvimento e promoção da sua equipa e, com ela, das equipas que lhes reportam”, resume.

Aquisições recentes constituem uma base muito importante para o crescimento geográfico futuro, reforçam uma das nossas principais regiões e fortalecem a nossa liderança na sustentabilidade.

Paulo Azevedo

Chairman da BA Glass

Em consequência, os órgãos de administração “não tiveram dúvidas” de que o sucessor devia ser escolhido entre potenciais candidatos internos, tendo “trabalhado em conjunto” para selecionar o engenheiro mecânico Tiago Moreira da Silva, um dos três filhos de Carlos Moreira da Silva — o 16º mais rico em Portugal, listado pela Forbes —, que ingressou na BA em 2008 e comandou as operações na ibéria e na Europa Central (Alemanha e Polónia), entrando na comissão executiva como Chief Marketing Officer (CMO).

Sandra Santos e Tiago Moreira da SilvaDR

Em declarações ao ECO em janeiro, quando foi anunciada a substituição, Sandra Santos salientou que o sucessor estava “super preparado” para exercer o cargo e assegurou que “não [havia] a mínima hipótese de haver qualquer tipo de problema” na passagem de testemunho na histórica produtora de embalagens de vidro. Paulo Azevedo, que desde 2020 ocupa o papel de chairman, acredita que o novo CEO irá “conduzir a empresa a uma nova e inovadora etapa de crescimento e transformação”, mostrando-se confiante de que Tiago Moreira da Silva se “destacará na sua nova função com o forte apoio” do comité executivo.

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