55%, 65% ou 100%. Afinal, quanto vou receber se ficar a trabalhar em casa?

Portugal está em estado de alerta, com escolas fechadas e milhares de trabalhadores em casa. Quanto recebem em teletrabalho, isolamento, baixa ou assistência a filhos? De 55% a 100% do seu salário.

O Governo decidiu encerrar todos os estabelecimentos de ensino, a partir desta segunda-feira, deixando milhares de crianças em casa e, consequentemente, milhares de pais sem poderem ir trabalhar. A estes, juntam-se os trabalhadores que estão em casa em teletrabalho ou em isolamento profilático sem prestação de serviços e somam-se ainda aqueles que estão doentes. Mas afinal que percentagem do salário é devida em cada caso?

Foi a 2 de março que os dois primeiros casos do infeção do novo coronavírus em Portugal foram registados. No mesmo dia, o ministro de Estado e da Economia, Pedro Siza Vieira, reuniu-se com as confederações patronais e com as associações setoriais para definir um plano para mitigar os efeitos desta pandemia no tecido empresarial nacional.

Desse encontro saiu também um despacho, que esclareceu as dúvidas sobre a globalidade dos trabalhadores. Há diferenças entre os trabalhadores do público e do privado, entre os trabalhadores por conta de outrem e independentes que têm de ser mantidas debaixo de olho.

Estou em casa e a trabalhar. Quanto vou receber?

Esta é, talvez, a situação cujas regras são mais simples. O Código do Trabalho define o teletrabalho como a “prestação laboral realizada com subordinação jurídica, habitualmente fora da empresa e através do recurso a tecnologias de informação e comunicação”. Ou seja, é o trabalho à distância, o que geralmente é facilitado pelo recurso à tecnologia. Tal dever ser permitido, diz a lei, sempre que a atividade desempenhada seja compatível com este regime.

Para os trabalhadores que, por prevenção, escolham não se deslocar aos seus locais de trabalho, esta solução permite manter a prestação de serviços e, consequentemente, a remuneração por inteiro, incluindo o subsídio de refeição (o pagamento desse subsídio não tem, por enquanto, legislação específica, pelo há opiniões diferentes sobre o assunto). No universo de opções laborais disponíveis nesta pandemia, esta é, de resto, aquela que garante maiores rendimentos aos trabalhadores.

Nesta situação, continua a ser o empregador — quer público, quer privado — a pagar o salário a 100% do trabalhador em questão.

No caso da Função Pública, o Ministério de Alexandra Leitão já confirmou que os trabalhadores poderão, a partir da próxima semana, ficar em casa em regime de teletrabalho sempre que as suas funções o permitam.

Estou em casa, mas não consigo trabalhar. E agora?

O despacho que saiu da reunião do ministro da Economia com os patrões estabeleceu a equiparação do isolamento profilático à doença com internamento hospitalar, garantindo aos trabalhadores que fiquem em casa por prevenção — e que não consigam continuar a prestar serviços — o acesso imediato ao subsídio de doença, cujo valor equivale a 100% da remuneração de referência (sem subsídio de refeição). Isto tanto para os funcionários públicos como para os trabalhadores do privado, quer sejam trabalhadores por conta de outrem ou trabalhadores independentes.

Neste caso, é a Segurança Social a responsável pelo seu pagamento. Isto nos 14 dias iniciais de ausência, correspondentes ao período de isolamento recomendado.

Para ter acesso a este subsídio de doença, o trabalhador tem de ter uma certificação da sua situação clínica, que substituiu o documento justificativo da ausência ao trabalho. A certificação em causa deve ser remetida pelos serviços de saúde competentes aos serviços de Segurança Social, no prazo máximo de cinco dias após a sua emissão.

Estou infetado com coronavírus. Que salário vou ganhar?

Ao contrário do que acontece no caso dos trabalhadores em teletrabalho ou em isolamento, em situação de doença efetiva o salário não continua a ser pago por inteiro. O subsídio de doença passa a equivaler a 55% da remuneração de referência e começa a ser pago a partir do primeiro dia, segundo o decreto-lei publicado face ao pandemia.

A percentagem da remuneração sobe consoante a duração do período de incapacidade. Se ultrapassar os 30 dias, mas for inferior a 90 dias, a fatia sobe para 60%; Se ultrapassar os 90 dias, mas for inferior a um ano, a fatia sobe para 70%; Se ultrapassar um ano, sobe para 75%.

O subsídio pode, além disso, ser majorado em 5% (nos primeiros 90 dias), quando o trabalhador tiver uma remuneração de referência igual ou inferior a 500 euros ou um agregado familiar que integre três ou mais filhos até 16 anos ou integre descendentes que beneficiem da bonificação por deficiência do Abono de Família para Crianças e Jovens.

Estas regras aplicam-se aos trabalhadores do privado e aos funcionários públicos inscritos na Segurança Social. No caso dos trabalhadores do Estado subscritores da Caixa Geral de Aposentações (CGA), as regras são diferentes. Nestes casos, de acordo com a Lei nº35 de 2014, o subsídio de doença é pago entre o quarto e o 30º dia de incapacidade temporária a 90%, perdendo o subsídio de refeição (tal como acontece na Segurança Social).

Filhos de quarentena ou doentes? É este o subsídio

O despacho publicado no início do mês indicava que aos trabalhadores que faltarem ao trabalho não por isolamento ou doença própria, mas para acompanharem os seus filhos que estejam em isolamento profilático ou doentes seria atribuído o subsídio para assistência a filho.

Em causa está um apoio pago pela Segurança Social que assegura 65% da remuneração do trabalhador, por um período máximo de 30 dias (em cada ano civil) para menores de 12 anos ou por um período máximo de 15 dias (em cada ano civil) para maiores de 12 anos.

Com a entrada em vigor do Orçamento do Estado para 2020 — que António Costa já disse esperar que aconteça em abril –, esse subsídio passará a equivaler a 100% da remuneração (sem subsídio de refeição).

Para ter acesso a este apoio, os pais devem obter junto dos serviços de saúde uma certificação da situação clínica dos seus dependentes, que deve ser remetida eletronicamente aos serviços da Segurança Social no prazo máximo de cinco dias após a sua emissão e na qual deverá estar indicado o requerimento do subsídio para assistência a filho.

De notar que, segundo a Segurança Social, apenas um dos progenitores pode pedir este subsídio pelo motivo em causa, de cada vez.

Escolas encerradas. Que direitos têm os trabalhadores?

Ao contrário do que tinha recomendado o Conselho Nacional de Saúde Pública (CNSP), António Costa decidiu avançar com o encerramento de todas as atividades letivas, em todos os graus de ensino. A decisão foi anunciada na quinta-feira e abrange o período entre esta segunda-feira, dia 16 de março, e 13 de abril.

Diferente do que acontece nos casos de isolamento ou doenças dos filhos, a lei não prevê qualquer apoio social para os pais que tenham de faltar ao trabalho para acompanharem os filhos cujas escolas tenham sido fechadas. Na reunião da Concertação Social desta quarta-feira, os sindicatos tinham apelado à criação de mecanismo que assegurasse o pagamento dos salários por inteiro, nestas situações, tendo o ministro da Economia respondido com a promessa de que estava a ser preparada uma resposta “adequada e proporcional”.

Esta quinta-feira, António Costa desfez o mistério e, logo depois de anunciar o fecho das escolas, adiantou que seria criado “um mecanismo especial” que assegurará o pagamento parcial dessas remunerações. Os detalhes chegaram umas horas depois, no final da reunião do Conselho de Ministros, tendo a ministra do Trabalho explicado que os pais com crianças até aos 12 anos, que precisarem de ficar em causa com esses dependentes face ao encerramento dos estabelecimentos de ensino, vão receber dois terços da remuneração base, isto é, excluindo complementos e subsídios como o de refeição.

Esse apoio será pago em 33% pelo empregador e em 33% pela Segurança Social, sendo o valor mais baixo possível o do salário mínimo nacional. Ou seja, os pais que ficarem em casa com os filhos receberão, no mínimo, 635 euros. Isto se não conseguirem continuar a prestar serviços à distância. Se o conseguirem fazer, as regras do teletrabalho são aplicadas: a remuneração é paga a 100% (incluindo subsídios) pelo próprio empregador. Já o teto máximo do apoio para os pais que fiquem em casa é de 1.095 euros.

Mas como podem ter acesso os pais a esta proteção social? De acordo com o diploma entretanto publicado, é a entidade empregadora que o deve solicitar, sendo deferido de forma automática assim que o patrão o faça. Isto desde que “não existam outras formas de prestação da atividade, nomeadamente por teletrabalho”. Uma vez deferido o apoio, a Segurança Social transfere os tais 33% do apoio a pagar ao patrão, que procede ele próprio ao pagamento da totalidade do apoio ao trabalhador.

O diploma esclarece ainda que ambos os progenitores podem usufruir deste apoio, desde que não em simultâneo, e que esta ausência será tida como falta justificada, não contando para os limites de um eventual despedimento.

De notar que, durante o período das férias da Páscoa (de 30 de março a 13 de abril), as faltas ao trabalho não merecem este tipo de apoio, estipulou o Executivo. Neste caso, os pais que faltem não vão receber qualquer proteção da Segurança Social.

Sou trabalhador independente. As regras são as mesmas?

Para os trabalhadores independentes que fiquem em regime de teletrabalho, nada muda na sua remuneração; E no caso de ficar em isolamento profilático sem prestação de serviços, têm também acesso ao apoio equivalente a 100% do seu salário, a ser pago pela Segurança Social.

O caso muda de figura nas situações em que o trabalhador independente esteja efetivamente doente: só tem acesso ao subsídio de doença se contar com, pelo menos, seis meses — seguidos ou interpolados — de descontos para a Segurança Social, começando o apoio a ser pago no primeiro de incapacidade para o trabalho.

Isto de acordo com o decreto-lei que foi entretanto publicado. Em circunstâncias normais (sem pandemia), durante os primeiros 10 dias, o trabalhador não recebe absolutamente nada da Segurança Social. Para os trabalhadores por conta de outrem, o subsídio começa a ser pago a partir do quarto dia de doença, nessa situação.

Outra diferença é que os primeiros têm um período máximo de subsídio de 365 dias, enquanto os segundos têm até 1.095 dias. Igual tanto para os trabalhadores independentes como os trabalhadores por conta de outrem são as percentagens de remuneração concedidas durante o período de doença: até aos 30 dias a Segurança Social paga 55% da remuneração de referência; dos 31 aos 90 dias paga 60%; dos 91 aos 365 dias paga 75%.

Trabalhador independente com filhos em casa

O “mecanismo especial” para os pais que precisem de ficar em casa com os filhos até aos 12 anos, que não estejam doentes ou em isolamento profilático, também é diferente para os trabalhadores independentes. Neste caso, o trabalhador não recebe 66% do salário (como os trabalhadores dependentes), mas um terço da remuneração média.

E como se calcula essa média? É o valor correspondente a um terço da base de incidência contributiva (70% do rendimento médio do último trimestre de 2019) relativamente à qual foram calculadas as contribuições para a Segurança Social, de janeiro a março de 2020.

Além disso, o apoio para os recibos verdes que fiquem com os filhos tem como valor mínimo o montante do Indexante dos Apoios Sociais (IAS), isto é, cerca de 438,81 euros (no caso dos trabalhadores por conta de outrem, esse patamar está nos 635 euros). O teto máximo está fixado nos 1.097 euros (2,5 vezes o IAS).

Este apoio tem de ser pedido pelo próprio trabalhador independente à Segurança Social, sendo o seu deferimento automático. Também nestes casos, durante o período das férias da Páscoa (de 30 de março a 13 de abril), a interrupção da prestação de serviços não resulta na aplicação deste tipo de apoio. Os pais não recebem qualquer proteção da Segurança Social, nos dias referidos.

Por outro lado, no caso dos filhos estarem em isolamento profilático ou doentes, os trabalhadores independentes têm acesso ao subsídio para assistência a filhos nas condições já referidas: 65% do salário, no período de 30 dias para menores de 12 anos; e 15 dias para maiores de 12 anos.

Recibos verdes têm apoio extra. Como funciona?

Os trabalhadores independentes que não sejam pensionistas e que tenham feito descontos para a Segurança Social em, pelo menos, três meses consecutivos dos últimos 12 vão receber um apoio extraordinário. Isto se estiverem em “situação comprovada de paragem total da sua atividade ou da atividade do respetivo setor”, em consequência do surto de coronavírus. Tal deve ser atestado “mediante declaração do próprio, sob compromisso de honra, ou do contabilista certificado no caso de trabalhadores independentes no regime de contabilidade organizada”.

Este apoio financeiro tem a duração de um mês — renovável mensalmente até um máximo de seis meses — e equivale ao valor da remuneração registada como base de incidência contributiva: 70% do rendimento médio do último trimestre, no caso dos prestadores de serviço sem contabilidade organizada e 70% do rendimento médio do último ano, no caso dos prestadores de serviços com contabilidade organizada).

O limite deste apoio é o valor do Indexante dos Apoios Sociais (IAS), isto é, 438,81 euros e a prestação começa a ser paga, de resto, a partir do mês seguinte ao da apresentação do requerimento.

Apesar de continuarem obrigados a apresentar as declarações trimestrais de rendimentos, as contribuições ficam diferidas durante o período em que os trabalhadores estiverem a receber este apoio. Os descontos devem ser, depois, pagos à Segurança Social “a partir do segundo mês posterior ao da cessação do apoio”, podendo o acerto “ser efetuado num prazo máximo de 12 meses, em prestações mensais e iguais”.

O decreto-lei nota, além disso, que este apoio não é cumulável com a tal proteção social prevista para os pais que tenham de ficar em casa para acompanhar os filhos, cujas escolas tenham sido encerradas.

O patrão suspendeu-me o contrato. Quanto recebo?

Uma das medidas apresentadas pelo Governo aos parceiros sociais face à propagação do novo coronavírus em Portugal tem efeitos diretos no salário dos trabalhadores. Em causa está o novo regime simplificado de lay-off, destinado às empresas, que registem quebras de, pelo menos, 40% nas vendas por causa da pandemia.

Nesta situação, os trabalhadores “terão a garantia de retribuições ilíquidas equivalentes a dois terços do salário, até 1.905 euros, sendo 30% suportado pelo empregador e 70% pela Segurança Social até um máximo de seis meses”.

Outra opção que será disponibilizada às empresas e aos trabalhadores é o regime de lay-off com formação. Neste caso, os trabalhadores poderão beneficiar de ações de formação com uma bolsa — suportada pelo IEFP — equivalente a 30% do Indexante dos Apoios Sociais (cerca de 131 euros) e que é repartida em iguais partes pelo empregador e pelo emprego.

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