Prova dos 9: Há mais trabalhadores com baixos salários?
Pedro Passos Coelho disse que o número de trabalhadores a receber salário mínimo está a aumentar desde 2014. E acusou o Governo de promover o crescimento dos baixos salários. Está certo?
Pedro Passos Coelho, presidente do PSD, acusou o Governo de “cinismo e hipocrisia” no que toca a política de rendimentos, bem como de promover os baixos salários. “Os baixos salários cresceram com o novo Governo e com as suas novas políticas”, garantiu o ex-primeiro-ministro. E frisou que no final de 2016 “quase um milhão” de pessoas recebiam o salário mínimo. É mesmo assim? O ECO faz a prova dos nove.
A frase
“De 2014 até agora cada vez são mais os trabalhadores a tempo completo que recebem o Salário Mínimo Nacional. (…) Na primavera de 2014 eram cerca de 400 mil (…). A nossa estimativa é que no fim de 2016 seja quase um milhão o número de trabalhadores que ganham o Salário Mínimo Nacional”, disse Pedro Passos Coelho, no domingo. E somou: “Os baixos salários cresceram com o novo Governo e com as suas novas políticas.”
Os factos
O número de trabalhadores a receber salário mínimo nacional no final de 2014 rondava, tal como diz Passos Coelho, os 400 mil. O valor consta do relatório trimestral de Acompanhamento do Acordo sobre a Retribuição Mínima Garantida, publicado em dezembro.
Por enquanto, não há dados para dezembro de 2016. Os números mais recentes são de setembro e apontam para 648 mil pessoas abrangidas pelo salário mínimo nacional. Este valor deverá ter aumentado até ao final do ano passado, já que o documento refere que, em média, nos primeiros nove meses do ano passado, 37% dos novos contratos recebiam 530 euros — o valor da retribuição mínima na altura. Também foram criados mais postos de trabalho do que em 2015, o que aumenta a possibilidade de criar empregos a pagar o salário mínimo.
Contudo, o relatório também demonstra o principal motivo do aumento do número de trabalhadores abrangidos por salário mínimo a partir de 2014: o aumento administrativo deste referencial.
Tanto de 2014 para 2015, como de 2015 para 2016, o número de pessoas abrangidas pela remuneração mínima saltou abruptamente em cerca de 100 mil, com a subida administrativa do valor. A incidência da remuneração mínima no total de trabalhadores regista precisamente a mesma evolução:
No documento explica-se este fenómeno: “O peso dos indivíduos com remunerações iguais à Retribuição Mínima Mensal Garantida no total de declarações de remuneração passou de aproximadamente 12,5%, em janeiro de 2010, para próximo dos 20,5%, em setembro de 2016, coincidindo os aumentos mais abruptos com as atualizações do valor do salário mínimo, especialmente na alteração dos 485 para os 505 euros e na alteração dos 505 para os 530 euros.”
A estes factos vale a pena somar a informação do Instituto Nacional de Estatística (INE) que permite verificar que, assumindo uma definição mais abrangente para “baixos salários”, o seu peso no total de empregados por conta de outrem não aumentou em 2016. Os dados do inquérito ao emprego referentes ao quarto trimestre apontam para 30,6% de trabalhadores com remunerações líquidas mensais abaixo dos 600 euros. Em 2015, este valor era de 32%.
Prova dos 9
É verdade que o número de trabalhadores a receber o salário mínimo tem vindo a aumentar — embora seja incerto que atinja perto de um milhão de pessoas no final do ano passado. Contudo, esta subida decorre em grande medida do aumento do valor administrativo do salário mínimo, que faz com que trabalhadores que recebiam até ao momento valores acima, mas próximos, deste referencial passem agora a ser considerados como trabalhadores com salário mínimo.
Não há dados que o comprovem, mas é provável que este movimento de subida se repita novamente de dezembro para janeiro de 2017, com o novo aumento do salário mínimo para 557 euros mensais.
Seja como for, estes dados não refletem o aumento do peso dos baixos salários no total de empregados, conforme sugere Pedro Passos Coelho. Os dados do INE demonstram que a percentagem de trabalhadores com salários mensais líquidos até aos 600 euros manteve-se praticamente inalterada, tendo até diminuído ligeiramente.
Quanto muito, o que o aumento da incidência do salário mínimo demonstra é que as empresas não têm conseguido acompanhar o ritmo do aumento do salário mínimo em toda a sua escala de remunerações — e por isso este referencial aproxima-se do salário mediano.
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