Venda da Comporta em risco. Gestora e potenciais compradores em conflito
A sociedade gestora da Comporta só lançará um novo processo de venda se os concorrentes do último processo abdicarem do direito de contestação. Há pelo menos um candidato que rejeita esta condição.
A venda da Herdade da Comporta está em risco. A Gesfimo, a sociedade que gere os ativos imobiliários que estão a ser negociados, decidiu que só lançará um novo processo de venda se os três concorrentes que participaram no último processo, que ficou fechado sem sucesso, renunciarem ao direito de contestar a decisão que vier a ser tomada. Mas esta é uma imposição que é rejeitada por, pelo menos, um dos concorrentes: o consórcio Amorim Luxury / Vanguard Properties, que considera que o que a Gesfimo está a fazer é “ilegal”. Se não for vendida, a herdade corre o risco de entrar em insolvência.
“Por razões de certeza e segurança jurídicas, e considerando neste particular a premência de um desfecho rápido e certo do processo [de venda], atenta nomeadamente a situação de falta de liquidez do Fundo [de investimento imobiliário] (…), a Sociedade Gestora só procederá à abertura do processo com a confirmação prévia de que os três consórcios que antes apresentaram propostas de compra dos ativos do Fundo renunciarão a qualquer contestação, reclamação ou impugnação do mesmo, seja a que título for, ainda que por factos ocorridos até ao presente”, pode ler-se na carta, datada de 1 de agosto, que foi enviada pela Gesfimo aos participantes do Herdade da Comporta — Fundo Especial de Investimento Imobiliário Fechado (FEIIF).
A Sociedade Gestora só procederá à abertura do processo com a confirmação prévia de que os três consórcios que antes apresentaram propostas de compra dos ativos do Fundo renunciarão a qualquer contestação, reclamação ou impugnação do mesmo.
São os ativos desse fundo de investimento imobiliário, detido em 74,55% pelo Novo Banco e pela Rioforte, que estão à venda desde o colapso do Grupo Espírito Santo (GES). Contudo, todas as tentativas de venda têm sido fechadas sem sucesso. Primeiro, ainda no ano passado, chegou a ficar acordada a venda da Comporta ao empresário Pedro Almeida, mas o Ministério Público travou o negócio, ao não levantar o arresto da Herdade da Comporta, por considerar que o processo não reunia condições de “isenção, transparência e objetividade”.
Já em maio deste ano, a Gesfimo acabou por pré-selecionar a oferta proposta pelo consórcio da Oakvest, a Portugália e a Sabina Estates. Mas o Novo Banco pediu que os participantes da Comporta pudessem avaliar as restantes propostas, que foram apresentadas pelo francês Louis-Albert de Broglie e pelo consórcio composto pela Amorim Luxury, de Paula Amorim, e a Vanguard Properties, do francês Claude Berda.
A proposta selecionada pela Gesfimo acabou por ser rejeitada na última assembleia de participantes da Herdade da Comporta, uma decisão que a Gesfimo justifica com o baixo preço oferecido, que ficou “significativamente aquém dos valores de avaliação” dos ativos que estão a ser vendidos. Essa não é, contudo, a explicação dada pelos acionistas, que dizem que a proposta foi rejeitada porque não dispunham de “elementos de informação inequívocos para valorar e hierarquizar as propostas recebidas, sendo certo que as propostas terão sido sucessivamente revistas em datas diferentes e aparentemente com variações relativamente ao perímetro dos ativos objeto dessas propostas e criérios para a sua valorização relativa, o que condiciona a sua comparabilidade”.
Os projetos turísticos à venda estão avaliados em 200 milhões de euros. As duas propostas com os valores mais elevados, do consórcio Vanguard Properties/Amorim Luxury e do consórcio liderado pela Oakvest, ofereciam ambas em torno de 156 milhões de euros. Em ambos os casos, o montante oferecido é repartido entre um pagamento em dinheiro e a assunção da dívida de 119,4 milhões da Comporta à Caixa Geral de Depósitos (CGD).
Após esta rejeição, a larga maioria dos participantes da Herdade da Comporta fez uma série de recomendações à Gesfimo, para conseguir a “maximização do produto da alienação dos ativos“. Na prática, os donos querem que os interessados ofereçam mais dinheiro pela Comporta.
Para que isso seja possível, o novo processo de venda será aberto a mais candidatos. “Para alcançar plenamente esse objetivo, entende a sociedade gestora que um novo processo de alienação dos ativos do fundo deve ser aberto não apenas aos três consórcios que antes apresentaram propostas de compra dos ativos do fundo, mas também a outros investidores que entendam apresentar propostas para o mesmo efeito, desde que se submetam às regras que forem definidas para todos”, refere a carta enviada aos participantes. Isto porque, como também nota a Gesfimo, “aqueles três consórcios, no passado recente, já sinalizaram pelo menos nessa fase as suas intenções relativamente aos valores e termos do investimento que estavam dispostos a fazer“.
Todos os candidatos à compra da Comporta terão acesso à informação apresentada à Gesfimo e terão “garantidas condições equivalentes”, não sendo “atribuída exclusividade” a nenhum dos candidatos.
Se não houver mais um adiamento, a nova assembleia de participantes deverá realizar-se no dia 28 de setembro. Os interessados terão de apresentar a due dillegence até ao dia 15 de setembro. Já as propostas vinculativas terão de ser apresentadas até ao dia 20 de setembro.
Amorim/Vanguard recusa abdicar de contestação
Contactado pelo ECO, José Cardoso Botelho, diretor-geral da Vanguard Properties, que concorre à compra da Comporta em consórcio com a Amorim Luxury, afirma: “A sociedade gestora [Gesfimo] disse que não lançaria novo processo sem obter dos três concorrentes uma declaração a desresponsabilizar a sociedade gestora de qualquer responsabilidade. Esta pretensão não é legítima“, sublinha.
Até porque, salienta o mesmo responsável, essa condição só é imposta aos três concorrentes já existentes, e não a novos candidatos que venham a manifestar interesse. “É ilegal a Gesfimo condicionar o cumprimento dos seus deveres legais e contratuais ao ser previamente libertada de qualquer responsabilidade pelos proponentes compradores, condição só aplicável aos três concorrentes que já se apresentaram”, argumenta.
É ilegal a Gesfimo condicionar o cumprimento dos seus deveres legais e contratuais ao ser previamente libertada de qualquer responsabilidade pelos proponentes compradores, condição só aplicável aos três concorrentes que já se apresentaram.
José Cardoso Botelho acusa ainda a Gesfimo de não ter acatado as recomendações apresentadas, na assembleia de participantes realizada a 27 de julho, pela Rioforte e pelo Novo Banco, que foram apoiadas pela maioria dos participantes. “Se a Gesfimo optar por não acatar as recomendações dos acionistas, será responsável pelos seus atos e pelos prejuízos causados aos proponentes e, certamente, ao fundo e seus credores. Certo é que a Amorim Luxury / Vanguard Properties tudo irá fazer para que o concurso tenha lugar nos moldes recomendados pelos donos do fundo. Acreditamos que, perante a factualidade descrita, a Gesfimo deveria ter o bom senso de acatar as recomendações, abdicar do waiver ilegal e avançar para o envio da process-letter aos três candidatos que antes apresentaram propostas”, conclui.
Louis Albert de Broglie também confirmou ao ECO que mantém o interesse em comprar a Comporta, mas não responde quando questionado se vai aceitar renunciar ao direito de contestar o processo de venda.
O investidor francês admite, contudo, que não está disponível para rever o preço já oferecido. “É pouco provável que alteremos o preço, uma vez que a nossa responsabilidade é assegurar um projeto de baixa densidade, comprometido com o território e a população do Alentejo, e não um projeto especulativo para o benefício dos players estrangeiros do mercado imobiliário”, afirma.
Se a venda da Comporta não se concretizar, a herdade corre o risco de entrar em insolvência, tal como já alertaram os curadores dos processos de insolvência das empresas do GES que tinham sede no Luxemburgo (no caso, a Rioforte, que controla a Comporta). “O risco de insolvência é real, uma vez que os sócios não responderam a um pedido de aumento de capital”, diziam os curadores num relatório publicado em junho deste ano.
Notícia atualizada no dia 10 de agosto, com resposta de Louis Albert de Broglie.
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