Dos avisos para este Governo aos alertas para o próximo. CFP dispara recados a um mês do último OE
Risco político, necessidade de fazer mais do que baixar o défice nominal e economia a crescer apoiada no consumo. O CFP deixa alertas para este Governo e para o que sair das eleições de 2019.
O relatório “Finanças Públicas: Situação e Condicionantes 2018-2022” não se refere diretamente nenhuma vez ao Orçamento do Estado para 2019, mas é como se o fizesse. A um mês da entrega do último Orçamento da legislatura, o documento do Conselho das Finanças Públicas (CFP) identifica riscos para a economia e para as contas públicas e está cheio de recados para a equipa de Mário Centeno. E não só. Quem vencer as legislativas de 2019 fica já de sobreaviso.
A economia cresce mas com a ajuda do consumo
Primeiro, a parte boa. Apesar de alguns sinais de arrefecimento económico já este ano, o CFP manteve a previsão de crescimento económico em 2,2%, igual à que tinha feito em março, e apenas uma décima abaixo do número do Governo. No entanto, a instituição diz que a “composição” do crescimento mudou. A procura interna contribui com 2,6 pontos percentuais (p.p.) e a procura externa líquida com -0,4 p.p.. Face a março esta tendência agravou-se em 0,2 p.p. em cada um dos contributos. O consumo privado e o consumo público ganham destaque face às exportações e ao investimento.
“As exigências de aumento da produtividade e da competitividade da economia, assim como a sua reconhecida vulnerabilidade externa, apontam para a importância de inverter esta tendência”, avisa a instituição presidida pela economista Teodora Cardoso, lembrando de seguida que “estímulos dirigidos ao consumo têm efeitos positivos no imediato, mas, ao não induzirem ganhos de competitividade, tornam-se insustentáveis”. Avisos que surgem na reta final de um Governo cuja política assentou na recuperação de rendimentos.
Não basta cumprir metas quanto ao défice orçamental
O “défice mais baixo da história da democracia”. O Governo já reclamou para si esta conquista e prepara-se para apresentar objetivos ainda mais ambiciosos. O CFP valida os números do Governo e para 2018 até pensa que o Executivo pode alcançar um resultado melhor com um défice de 0,5% (o Governo fixou 0,7%). No entanto, estes poderão ser ganhos de curto prazo. Para conseguir um controlo eficiente das despesas públicas – para onde o CFP pede que os governos olhem – “não basta cumprir metas quanto ao défice orçamental, que beneficia de conjunturas favoráveis, mas é altamente vulnerável à sua reversão“. O CFP admite a complexidade técnica e “a instabilidade nas avaliações estruturais” de indicadores de caráter estrutural usados pela União Europeia, mas pede que estes não sejam descurados.
Próximo Governo vai ter de fazer mais para cumprir metas de Centeno
Ninguém sabe quem será o sucessor de Mário Centeno no Terreiro do Paço (ou se será ele mesmo), mas quem estiver à frente das Finanças nos próximos anos vai ter a adotar mais medidas para atingir as metas que Portugal assumiu em abril. No Programa de Estabilidade, o Executivo acreditava passar a ter um excedente orçamental já em 2020, ano em que considerava que atingiria o Objetivo de Médio Prazo (OMP) que corresponde a um saldo estrutural positivo de 0,25% do PIB potencial. No entanto, o CFP projeta que até 2022 isso não será possível. Além disso, Portugal não cumprirá a regra de correção do saldo estrutural em 0,6 pontos de ano para ano.
“A melhoria anual projetada agora para saldo estrutural no período 2018-2022 é, em termos cumulativos, inferior em 0,6 p.p. do PIB ao apresentado no exercício de março”, estimam os economistas do CFP, que nos seus cálculos têm em conta as medidas já adotadas, as que ainda não foram adotadas mas estão detalhadas, as que são renovadas anualmente nos Orçamentos (como, por exemplo, as contribuições extraordinárias sobre a banca, a energia e outros) e não têm em consideração receitas ou despesas elencadas pelo Executivo mas que não estão concretizadas.
Com as medidas atuais, o consumo público vai voltar a subir
Um dos pontos que o relatório analisa é a evolução do consumo público. Depois de uma quebra de 0,2% em 2017, esta rubrica cresceu 0,4% no primeiro semestre, acima dos 0,2% verificados no período homólogo. Aliás, o CFP antecipa uma “forte recuperação” este ano, para uma taxa de variação de 1,2%, mais 1,4 pontos percentuais do que no ano passado. Em março, a instituição apontava para um recuo de 0,1%. Um dos fatores que levou a esta forte revisão em alta resulta da evolução das despesas com pessoal.
Depois do primeiro relatório de março, o CFP já identificou novas medidas do lado da despesa, como outros efeitos remuneratórios no Estado (subsídios de enfermeiros especialistas, horas extra e horas qualidade, reposicionamento nas tabelas dos assistentes operacionais, outros) e o aumento do número de efetivos (35 horas para os contratos individuais de trabalho no SNS e reforço de contratações nas administrações públicas). O conjunto de novas medidas tem um peso no défice deste ano avaliado em 0,16% do PIB. Aliás, o total de medidas já tomadas vale 0,9% do PIB até 2022.
Riscos internos são políticos
Com três eleições à porta (europeias, Madeira e legislativas) – e numa altura em que o próprio Presidente da República admite que Portugal já está em clima de pré-campanha -, o CFP identifica que “no plano interno, os riscos são essencialmente políticos e decorrem da capacidade para manter a política económica focada no aumento do espaço orçamental e no desenvolvimento de políticas coordenadas de transformação da economia e incentivo ao investimento para aumentar o produto potencial da economia”. O aviso para futuro fica feito: “Uma degradação do desempenho orçamental poderia ter consequências negativas nas condições de financiamento da economia, enquanto o diferimento de reformas pode refrear o ritmo de investimento, em particular em setores orientados para a exportação”.
Protecionismo, abrandamento do turismo e BCE
O CFP quer a economia a crescer apoiada nas exportações e no investimento. Mas avisa quais são os riscos que incidem sobre estes fatores de crescimento. “O incremento das políticas protecionistas, nomeadamente por iniciativa dos EUA, com consequências negativas para o comércio internacional”, “o abrandamento da economia no setor do turismo, traduzindo a maior maturidade desse mercado” e “o eventual impacto da normalização da política monetária do BCE, atendendo aos níveis de endividamento elevados existentes na economia portuguesa” são as sombras que podem chegar a Portugal vindas de fora.
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