Banca tem dívida soberana a mais? Ativo-refúgio europeu pode ser solução

Mecanismo Europeu de Estabilidade defende criação de ativo-refúgio europeu. É uma solução para reduzir excesso de exposição da banca à dívida dos respetivos países, como acontece em Portugal.

A criação de um ativo-refúgio europeu, que está a ser estudado por Bruxelas, seria uma forma de diversificar os ativos nos balanços dos bancos. Esta é a convicção de Matjaz Susec, diretor do departamento de estratégia e relações institucionais do Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE), que aponta para a exposição da banca à dívida pública dos próprios países, que já foi alvo de alertas por parte de várias instituições.

“Um ativo-refúgio iria aumentar a pool de ativos com rating elevado, o que está agora limitado a poucos emitentes soberanos ou supranacionais. Como tal, iria de forma crescente implementar um benchmark que pudesse ser usado para atribuir preço à dívida de forma transfronteiriça”, defendeu Susec no seminário Mercados de dívida pública – Desafios num quadro de aprofundamento da UEM, esta segunda-feira em Lisboa.

Substituir parte das obrigações soberanas detidas pelos bancos por investimento em ativos-refúgio poderia ajudar a diversificar afastando o risco soberano. O ativo-refúgio pode também mitigar a fuga para dinâmicas de segurança e facilitar a transmissão da política monetária”, sublinhou.

Os argumentos de Susec, cujas funções incluem ser chefe de missão do MEE na supervisão pós-programa em Portugal, surgem numa altura em que a exposição da banca portuguesa à dívida pública nacional tem sido alvo de alertas. No final de agosto, eram 34.608 milhões de euros nas carteiras dos bancos, sendo que Fundo Monetário Internacional (FMI), Comissão Europeia, BCE e Banco de Portugal já alertaram que o forte aumento na exposição — de 1% em 2008 para cerca de 9% dez anos depois — torna o sistema financeiro mais vulnerável a contágio em caso de crise.

Ceticismo em torno do projeto

Segundo Susec, a concretização do projeto do ativo comunitário seria uma forma de reforçar a união monetária e poderia “interagir com outras iniciativas políticas, como uma possível capacidade orçamental centralizada e a União dos Mercados de Capitais”. Acrescentou que “de forma geral, a criação de um ativo-refúgio da Zona Euro iria reforçar o papel internacional do euro“.

No entanto, a possibilidade não é vista com otimismo por todos. Pablo de Ramón-Laca, diretor do departamento de mercados do Tesouro Espanhol considera necessário que assegurar que as características de refúgio são cumpridas e que, para isso, é preciso ser tecnicamente cuidadoso. “Tem de haver um selloff quando o stress aumentar” e “tem de competir com as Tresuries dos EUA”. Por outro lado, “não pode ser usado para salvar países“.

Anthony Linehan, diretor do departamento de mercados e gestão do Tesouro da Irlanda acredita que não é possível haver um ativo-refúgio europeu sem uma união orçamental. “Partilho esta perspetiva de que não poderá haver ativos-refúgio sem união orçamental”, concordou Vítor Bento, ex-administrador do Banco de Portugal e atual presidente da SIBS.

O problema é que “os países não estão dispostos a abandonar as suas políticas orçamentais” em detrimento de um Tesouro Europeu, considera Cláudia Braz, do Banco de Portugal e coordenadora do Public Finance Group no BCE.

“Apesar dos desenvolvimentos até aqui, sou cética porque não vejo capacidades para partilha de risco”, Nazaré Costa Cabral, presidente do Conselho das Finanças Públicas. Apesar de ver a recente criação de um produto individual de reforma pan-europeu como um primeiro passo de reforço das ligações, “para já não estou muito otimista“, acrescentou Cabral.

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